Itamaraty diz que Argentina “contraria liberdade de navegação” ao cobrar pedágio e reter navio brasileiro
Argentina estabeleceu cobrança de US$ 1,47 por tonelada para embarcações de transporte internacional; com a medida, houve registro de retenção dos navio que recusasse o pagamento
O Ministério de Relações Exteriores vem criticando a Argentina por cobrar um novo pedágio na Hidrovia Paraguai-Paraná. Segundo a pasta, a medida contraria a liberdade de navegação prevista em acordo firmado pelos países que a utilizam (Brasil, Argentina, Uruguai, Bolívia e Paraguai).
Por meio de resolução, a Argentina estabeleceu que a partir de janeiro deste ano cobraria US$ 1,47 por tonelada para embarcações de transporte internacional no trecho entre Porto de Santa Fé e Confluência. Com a medida, houve registro de retenção de navio que recusasse o pagamento.
Segundo o Itamaraty, Bolívia, Paraguai e Uruguai também questionam a legalidade da resolução. Para os vizinhos, a Argentina não demonstrou que o pedágio constitui ressarcimento de serviços prestados na hidrovia — que é a condição prevista para qualquer cobrança, considerando que a simples navegação não pode ser taxada.
Navio retido acirra tensão
No início deste mês, um comboio da companhia Hidrovias do Brasil foi retido no trecho por recusar a taxação. Tratava-se de um navio empurrador e diversas barcaças com grãos oriundos do estado do Mato Grosso.
Embora o navio estivesse com bandeira paraguaia, a embarcação pertence à empresa brasileira. Anualmente, a companhia transporta 3,5 milhões de toneladas de minério de ferro e 1 milhão de toneladas de grãos. As cifras trazem exemplo sobre o impacto econômico que o pedágio traz aos que utilizam a hidrovia.
Em resposta à CNN, a Hidrovias do Brasil informou que, após o governo argentino reter uma das suas embarcações no Porto de San Lorenzo, em Santa Fé, a empresa pagou o valor sob protesto. A liberação para continuar a viagem ocorreu no último dia 4.
“A Hidrovias do Brasil ressalta que em seu entendimento a cobrança da taxa é indevida por ferir o acordo da hidrovia Paraguai-Paraná de livre circulação e tratará o assunto judicialmente”, diz em nota.
Para o Itamaraty, o caso é “preocupante”, contraria liberdade de navegação e ameaça a segurança jurídica, “imprescindível para garantir os investimentos associados ao desenvolvimento da hidrovia como opção central de escoamento de cargas na região da Bacia do Prata”.
“Do ponto de vista brasileiro, preocupa-nos, assim, o acirramento da situação com a retenção de embarcações em função de cobrança de dívida quando a discussão sobre o pedágio vem sendo legitimamente questionada pelos demais Estados-membros do Acordo da Hidrovia no marco daquele instrumento”.
Ações do Itamaraty
Na última semana, o deputado federal Alberto Fraga (PL-DF) apresentou requerimento para que o chanceler Mauro Vieira indique providências para resolver a questão. No documento, indica que o pedágio “compromete a isonomia entre os países e encarece o escoamento de grãos e outras mercadorias para exportação”.
Em nota, o Itamaraty indicou que o “espaço primordial para essa discussão são os órgãos do próprio acordo da hidrovia”.
“O tema já foi esgotado na Comissão do Acordo (CA), uma instância técnica, sem que se chegasse a um entendimento, e deverá, agora, ser tratado no Comitê Intergovernamental da Hidrovia (CIH), de natureza política”, aponta.
Ainda de acordo com a pasta, o Brasil vem buscando o diálogo sobre a questão há meses e “não considera aconselhável a escalada de ações em curso, que dificulta a perspectiva de que o tema seja tratado de modo ponderado nas instâncias do acordo”.
A representação de Fraga destaca que o Senado do Paraguai aprovou, semana passada, resolução que avaliza o governo paraguaio a adotar medidas para que a Argentina cesse imediatamente a cobrança do pedágio internacional.
A CNN procurou instâncias do governo argentino para que comentassem a questão. Até a publicação desta reportagem não houve resposta.