Governo renegociará concessões para destravar obras bilionárias em rodovias
Avaliação do ministério é que 15 das 22 concessionárias de rodovias possam aderir às renegociações de contratos
O governo abrirá negociações com operadoras privadas de rodovias federais para repactuar contratos, acertar um novo cronograma para obras em atraso e incluir investimentos adicionais nas concessões existentes. A intenção é destravar projetos de R$ 40 bilhões até 2026.
O Ministério dos Transportes deverá publicar, nesta semana, uma portaria pedindo manifestação formal de interesse das empresas dispostas a discutir uma eventual repactuação.
A avaliação do ministério é que 15 das 22 concessionárias de rodovias possam aderir às renegociações de contratos, segundo o secretário-executivo da pasta, George Santoro. “Algumas já nos sinalizaram que estão interessadas”, disse à CNN.
Um exemplo dado por Santoro é o da BR-163, entre Sinop (MT) e Itaituba (PA), em trecho administrado pela Via Brasil. De acordo com ele, o tráfego de caminhões — graças à safra de grãos cada vez maior – está 40% acima do fluxo projetado nos estudos feitos em 2019, que balizaram a concessão da rodovia.
O secretário afirma que, para dar conta da demanda, o governo pretende negociar com a concessionária a construção de uma terceira faixa ao longo da estrada.
“Hoje essa concessão tem nível E de qualidade de serviço [pior numa escala de A a E]. É como se o usuário estivesse dirigindo na Marginal Tietê por mil quilômetros”, compara Santoro, citando a extensão aproximada do trecho operado pela Via Brasil entre o Mato Grosso e o Pará, considerado nevrálgico para escoar a produção agrícola pelos portos do Norte do país.
Como o contrato original tem apenas dez anos de vigência, a expectativa é de que possa haver uma extensão do prazo, sem aumento das tarifas de pedágio atualmente pagas pelos usuários da BR-163 para compensar a empresa responsável pela estrada.
Além de intervenções adicionais, o governo deverá “perdoar” obras que estão com o cronograma atrasado, mas estabelecendo compromissos mais rígidos e uma espécie de “via expressa” para punições em caso de descumprimento dos novos acordos.
Hoje, diz Santoro, os processos de caducidade das concessões são lentos demais e muito dificilmente acabam em cessação dos contratos. Com as repactuações, segundo ele, esses processos ficam mais simples e ágeis.
“Descumpriu [o cronograma], é pau no contrato. Iremos para a caducidade direto”, afirma o secretário-executivo.
Uma das inovações na renegociação é que o acompanhamento das obras não será mais feita apenas pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que tem limitação de quadros.
A Infra S.A. – estatal ligada ao ministério – contratará empresas verificadoras independentes para monitorar a execução das obras. Isso dará mais agilidade à fiscalização e à eventual autuação por descumprimentos.
Visão do setor privado
Sem comentar a situação de empresas individualmente, o presidente da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), Marco Aurélio Barcelos, diz que o setor “vê com bons olhos” a iniciativa do Ministério dos Transportes e tem interesse em discutir repactuações contratuais.
“Precisamos encontrar uma equação financeiramente sustentável para não prejudicar o fluxo de caixa das concessionárias, mas reconhecemos a importância da iniciativa e há grande interesse em explorar alternativas”, afirma Barcelos.
Consulta ao TCU
Nos próximos dias, segundo George Santoro, o governo pretende enviar ao Tribunal de Contas da União (TCU) as primeiras quatro propostas de repactuação contratual.
Essas quatro ofertas se baseiam em consulta já realizada ao órgão de controle pelo Ministério dos Transportes e que abrange as seguintes concessões de rodovias.
• MSVia: BR-163, no Mato Grosso do Sul, administrada pelo grupo CCR.
• Eco101: BR-101, no Espírito Santo, operada pela Ecorodovias.
• Autopista Fluminense: BR-101, no Rio de Janeiro, sob gestão da Arteris.
• Via Bahia: BR-116 e BR-324, na Bahia, controlada pela Roadis.
Somente essas quatro renegociações podem destravar investimentos de R$ 11 bilhões até 2026, afirma o secretário-executivo.
Algumas das concessionárias haviam manifestado formalmente a intenção de desistir dos contratos atuais e devolver amigavelmente seus ativos ao poder concedente (União) para posterior relicitação.
Mediante o cumprimento de determinadas condições e a concordância do governo, o TCU autorizou as concessionárias a “desistir da desistência”, abrindo caminho para uma repactuação dos compromissos contratuais.
Para que isso seja viável e as empresas possam continuar à frente das rodovias, será preciso colocar em dia obras em atraso e antecipar investimentos. Haverá, ainda, a necessidade de demonstrar que um novo leilão resultaria em tarifas de pedágio mais caras para os usuários do que aquelas hoje praticadas.
Diante da constatação de que essas quatro rodovias já têm repactuações mais avançadas, o governo decidiu abrir a mesma possibilidade para os demais grupos que administram estradas federais.
“Queremos isonomia de tratamento e de oportunidades. Não vamos escolher um em detrimento de outro”, conclui o secretário-executivo do Ministério dos Transportes.
“Pretendemos otimizar contratos e ter o mesmo padrão regulatório em todas as concessões, com obras andando efetivamente no país. Se esses contratos forem arrumados, inclusive, teremos grupos privados mais fortes e maior competição nos futuros leilões”.