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    Governo quer liquidar Ceitec, empresa do ‘chip de boi’, antes de privatizações

    Empregados da estatal se organizam para evitar fim da operação

    O presidente Jair Bolsonaro e sua equipe terão de correr contra o tempo para cumprir a meta de arrecadar um R$ 1 trilhão em ativos, conforme a promessa feita ainda durante a campanha. Em um ano e meio de governo, a gestão não concluiu nenhuma privatização ou liquidação de empresas públicas de controle direto da União.

    O maior desejo do governo ainda é privatizar a Eletrobrás, mas, para isso, será preciso convencer o Congresso a aprovar um projeto de lei que autorize capitalizar a companhia e reduzir a participação da União, hoje em 60%, para algo próximo de 40%. Com a ambição de vender uma das maiores empresas de energia do País, o governo pode ter de se contentar, neste ano, em liquidar a Ceitec, conhecida pelo apelido pejorativo de “chip do boi”.

    O Ministério da Economia contabiliza seus feitos nessa área de forma diferente. Segundo a pasta, no início de 2019, a União detinha 698 ativos entre estatais de controle direto, subsidiárias, coligadas e simples participações em empresas. Desde então, 84 ativos deixaram essa lista – entre subsidiárias, coligadas e participações. Com isso, o rol de ativos caiu para 614.

    O balanço da pasta não inclui nenhuma estatal federal de controle direto que foi privatizada ou liquidada. Pelo contrário: o governo ainda criou a NAV, a ser responsável pela navegação aérea, que antes cabia à Infraero.

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    Entre as realizações que o governo menciona está a venda da TAG e da BR Distribuidora, subsidiárias da Petrobrás. Esse tipo de processo, no entanto, não é considerado uma privatização, mas um desinvestimento – venda de subsidiária pela matriz, que coordena todo o processo. As leis que regem o processo também são diferentes.

    O início do processo da venda da TAG se deu em 2017, ainda no governo anterior, quando a companhia anunciou seu plano de desinvestimentos. A conclusão da venda, no entanto, só se deu em 2019, por causa de uma liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) dada em 2018 e derrubada no ano passado.

    No caso da BR Distribuidora, a abertura de capital ocorreu em 2017, mas a transformação da empresa numa corporation – sem controle definido – ocorreu, de fato em 2019.

    Economista e diretora da área de privatizações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) durante o governo Fernando Henrique Cardoso, Elena Landau avalia que o programa de desestatização do governo não anda porque, na verdade, o presidente e a maioria de seus ministros são contra a venda e liquidação de estatais.

    “Todos sabiam que não existia tanta empresa para vender e que havia um enorme desconhecimento sobre esse valor de R$ 1 trilhão das empresas”, afirmou Elena. “Não estou preocupada com a pressa porque o processo é lento mesmo. A questão é a falta de decisão.”

    A economista diz ainda que usar o aumento de gastos públicos em saúde e programas de apoio à população com a pandemia como motivo para privatizar empresas é um erro. “A pior justificativa política para privatização é usar a questão fiscal. Primeiro, porque esse dinheiro não vai para o Tesouro. Segundo, porque quem é contra vai dizer que estão vendendo a prata da casa a preço de banana no meio da crise”, disse.

    Empregados tentam evitar fim

    Estatal produtora de semicondutores com sede em Porto Alegre (RS), a Ceitec recebeu recomendação para ser liquidada. A decisão foi do Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), órgão que reúne diversos ministros do governo e presidentes de bancos públicos. A resolução que formaliza essa medida, porém, ainda precisa ser publicada no Diário Oficial da União, e, depois ser ratificada por decreto presidencial. Até lá, empregados da empresa e políticos locais e da oposição lutam para evitar seu fim.

    O senador Paulo Paim (PT-RS) e os deputados federais Henrique Fontana (PT-RS) e Elvino Bohn Gass (PT-RS) enviaram ofício ao ministro da Casa Civil, Walter Braga Netto. Para eles, a decisão “representa um grave erro estratégico, pois anuncia a renúncia do governo federal em apoiar a indústria de microeletrônica do País”, afirma o ofício.

    A Ceitec foi criada em 2008, durante o governo Lula, mas os empregados afirmam que a ideia de uma estatal na área de semicondutores já era cogitada ainda durante o regime militar. Em abril, ela tinha 183 empregados, concursados sob regime de CLT, a maioria com mestrado, doutorado ou pós-doutorado.

    A empresa é uma das 19 estatais dependentes do Tesouro Nacional, ou seja, precisa de recursos do Orçamento para bancar despesas de custeio e com pessoal. É vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI). O patrimônio líquido da empresa era de R$ 130 milhões em 2018 e o prejuízo, naquele ano, foi de R$ 7,6 milhões.

    A estatal fabrica oito tipos de chips e mais de uma dezena de diferentes aplicações, nos segmentos de identificação logística e de patrimônio, identificação pessoal (chip do passaporte), identificação veicular e identificação de animais. A Ceitec desenvolve também projetos de pesquisa de ponta na área de saúde para detecção precoce de câncer e de exames mais rápidos e baratos.

    Porta-voz da Associação de Colaboradores da Ceitec (ACCeitec), Julio Leão afirma que há uma mobilização de políticos e empresários locais para tentar chegar a uma alternativa diferente da liquidação – seja privatização, seja parceria. Os empregados, porém, continuam a defender a manutenção do status da Ceitec como empresa pública.

    No dia em que informou a decisão de liquidar a empresa, o PPI disse que a opção pela liquidação ocorreu porque não havia interesse do mercado em comprar a companhia. Para manter parte das atividades hoje executadas pela Ceitec, a ideia seria transformá-la em uma entidade privada, sem fins lucrativos, a ser qualificada como organização social, que herdaria as 42 patentes depositadas pela companhia.

    Antes da decisão, em nota técnica em defesa da Ceitec, o MCTI ressaltou a importância da empresa para o desenvolvimento de tecnologias como “internet das coisas, inteligência artificial 5G e suas demandas por componentes”, bem como para políticas como cidades inteligentes e a indústria 4.0. A pasta, explicou que a pandemia evidenciou a “dependência quase que total de tecnologias, know-how, insumos, peças e componentes elétricos, mecânicos, eletrônicos, plásticos, da Ásia”.

    Em nota, o Ministério da Economia informou que o processo de liquidação é regido por leis e decretos que “não estabeleceram a audiência pública como fase do processo de liquidação” e tampouco exigem debate público ou aval do Tribunal de Contas da União (TCU).

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