Endividamento e renda fixa mais atrativa explicam 3º ano seguido de queda na poupança, dizem especialistas
Caderneta registrou em 2023 saque de R$ 87,8 bilhões — terceiro ano seguido em que a poupança perdeu volume
Especialistas consultados pela CNN afirmaram que o crescente endividamento da população e a maior atratividade dos demais ativos de renda fixa — visto o patamar elevado das taxas de juros — explicam as queda consecutiva no saldo da caderneta de poupança do país.
Dados do Banco Central (BC) mostram que, no ano passado, a poupança teve saque líquido de R$ 87,8 bilhões. Foi o terceiro ano seguido em que a poupança perdeu volume: em 2021 o saque foi de R$ 35,4 bilhões, e em 2022, de R$ 103,2 bilhões.
Para Alexandre Ripamonti, professor de economia e finanças da ESPM, dados sobre endividamento ajudam a elucidar o movimento. Pesquisa divulgada em dezembro pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) em dezembro indica que o endividamento atinge 76,6% das famílias brasileiras.
“Se o brasileiro vai se endividando, ele tem de pagar essas contas. Com isso, tem de sacar sua poupança”.
Claudia Yoshinaga, coordenadora do Centro de Estudos em Finanças da FGV destaca que as condições econômicas desfavoráveis geradas, por exemplo, pela pandemia de Covid-19 estimularam este endividamento, através da queda na renda da população.
Renda fixa mais atraente
Por outro lado, a especialista indica que os saques da poupança podem estar relacionadas às taxas de juros elevadas — Selic está em 11,75% e ficou estacionada em 13,75% por meses — e baixa atratividade da poupança.
“A queda acontece porque, ao mesmo tempo em que a poupança paga pouco, há outras alternativas sem riscos para investir, que são os ativos de renda fixa”, disse
Economista-chefe MB Associados, Sérgio Vale destaca que “o investidor hoje é mais informado do que no passado e faz com que ele veja a poupança como o que ela é: algo seguro, mas de rentabilidade muito baixa”.
Os recorrentes saques na poupança no ano passado aconteceram em um cenário de juros ainda elevados, que reduzem a competitividade da poupança.
Embora o Banco Central tenha dado início a um ciclo de cortes que já reduziu a Selic em 2 pontos percentuais, a 11,75%, a taxa segue em patamar muito favorável a outros investimentos no mercado de renda fixa.
No ano passado, o SBPE registrou um saque líquido no valor de R$ 72,394 bilhões, enquanto a poupança rural acumulou uma retirada de R$ 15,425 bilhões.
Somente em dezembro, houve depósitos de R$ 10,524 bilhões no SBPE, enquanto a poupança rural registrou entrada de R$ 3,248 bilhões.
Impacto no financiamento imobiliário
Os especialistas divergem quanto aos impactos dos saques para o financiamento imobiliário, que tem no Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) sua principal fonte de recursos.
Para Vale, os saques acendem sinal de alerta, já que a poupança é um recurso “barato” para compor o fundo. “Será um desafio cada vez maior buscar outros caminhos para o financiamento”.
“Certamente o funding privado com títulos longos vai continuar evoluindo. Mas para isso funcionar as taxas curtas e longas de juros precisariam cair, mas isso depende de uma melhora significativa do cenário fiscal”, disse.
Ripamonti e Yoshinaga acreditam que, neste momento e com esta proporção, não há impacto representativo ao financiamento imobiliário.
“Falar em ameças para fonte de financiamento é muito drástico. A poupança permanece como o principal investimento que o brasileiro faz. Com relação ao mercado imobiliário, mesmo com a redução, não há ainda um problema”, diz Yoshinaga.
*Publicado por Danilo Moliterno.