Em meio à crise no mercado de trabalho, China bate recorde em inscrições de vestibular
Campo lotado de quase 13 milhões de candidatos e o crescente desemprego juvenil aumentaram a pressão para o bom desempenho na prova
Um número recorde de estudantes do ensino médio em toda a China entrou nas salas de vestibular nesta quarta-feira (7) para fazer um teste que pode decidir seu futuro — mesmo que essa perspectiva pareça cada vez mais terrível sob a sombra do desemprego generalizado entre os jovens.
Uma pontuação alta no vestibular de dois dias, chamado de gaokao, é a única maneira de entrar nas melhores universidades do país, e a maioria dos estudantes chineses tem apenas uma chance no teste cansativo, ao contrário dos estudantes brasileiros que podem prestá-los várias vezes.
Um campo lotado de quase 13 milhões de candidatos registrados ao gaokao e o espectro do crescente desemprego juvenil aumentaram a pressão para o bom desempenho.
As fotos desta semana mostraram muitos estudantes visitando templos para acender incenso e rezar por bons resultados, com alguns professores distribuindo bolinhos de arroz para dar sorte. A mídia social chinesa estava repleta de mensagens de boa sorte e encorajamento.
As autoridades deram um passo adiante, impondo várias medidas para reduzir o ruído e minimizar a interrupção dos candidatos — incluindo proibir carros de buzinar perto de alguns locais de exame e suspender operações em restaurantes próximos, informou a mídia estatal.
Eles também aumentaram a segurança contra trapaça, com algumas cidades instalando tecnologia de reconhecimento facial para detectar “substitutos” contratados para fazer o exame por outra pessoa, e reduzindo a potência de transmissão de sinal perto de locais de exame para bloquear métodos eletrônicos de irregularidades, segundo o Global Times.
O aumento de candidatos — de 980 mil para 12,91 milhões — despertou a preocupação de estudantes que já enfrentam uma economia incerta e oportunidades cada vez menores, com alguns argumentando que a alta competição diminuirá gradualmente o valor de um diploma universitário.
Muitos nas mídias sociais apontaram que o número de candidatos ao gaokao supera em muito a queda na taxa de natalidade do país — apenas 9,56 milhões de bebês nasceram em 2022, a taxa mais baixa já registrada, apesar dos melhores esforços do governo para encorajar jovens casais desiludidos a terem mais filhos.
Mas os efeitos do encolhimento da população levarão anos para se manifestar no sistema educacional e no mercado de trabalho da China. Alguns usuários na internet lamentaram que o número de candidatos a testes e candidatos a empregos rivais após a formatura provavelmente continuará aumentando no futuro próximo.
Um usuário do Douyin, a versão chinesa do TikTok, lembrou-se de ter feito o gaokao em 2000, quando havia apenas cerca de 3,75 milhões de outros participantes do teste.
“Em se tratando da geração dos meus filhos, são 12,91 milhões (candidatos), quase quatro vezes mais. É muito difícil”, escreveram.
A juventude da China é a mais educada em décadas, com um número recorde de graduados em faculdades e escolas profissionalizantes.
Mas eles também enfrentam um descompasso crescente entre suas expectativas e oportunidades, com o aumento do desemprego urbano após três anos de restrições pandêmicas que atingiram duramente as pequenas empresas.
Uma repressão regulatória às empresas de internet, imóveis e educação também prejudicou o setor privado, que fornece mais de 80% dos empregos na China.
A taxa de desemprego urbano para jovens de 16 a 24 anos atingiu um recorde de 20,4% em abril, segundo dados divulgados pelo Departamento Nacional de Estatísticas (NBS, na sigla em inglês).
E a taxa pode aumentar ainda mais, já que um recorde de 11,6 milhões de estudantes universitários deve se formar este ano.
“Os problemas estruturais no emprego são proeminentes”, disse Fu Linghui, porta-voz do NBS, em entrevista coletiva em abril.
Alguns governos provinciais encorajaram os jovens desempregados a encontrar trabalho no campo, ecoando o apelo do líder chinês Xi Jinping em dezembro passado para que os jovens urbanos ajudem a “revitalizar a economia rural”.
Mas essa mensagem foi amplamente frustrada por jovens graduados, alguns dos quais brincam dizendo que foram presos por sua educação e estão indecisos entre seguir uma carreira de colarinho branco e arriscar o desemprego ou “tirar a beca de estudante” e trabalhar um trabalho de colarinho azul que eles esperavam evitar por meio de um diploma universitário.