Dólar bate recorde e fecha acima de R$ 5,40 com expectativa de corte da Selic
Durante as negociações, a cotação chegou a superar os R$ 5,41
O dólar ampliou a alta em relação ao real e bateu novo recorde nesta quarta-feira (22), volta de feriado. A valorização reflete a escalada das apostas de um novo corte de juros no Brasil, o que faz minguar ainda mais a expectativa de entrada de recurso estrangeiro no país. A subida também embute ajuste ao movimento do câmbio global na véspera, quando os mercados estiveram fechados no Brasil.
A moeda dos Estados Unidos encerrou o dia em alta de 1,89%, vendida a R$ 5,4094, novo recorde nominal (sem considerar a inflação) para um fechamento. Durante as negociações, a cotação chegou a R$ 5,4160, também uma marca histórica.
Na segunda-feira, o dólar fechou em alta de 1,40%, a R$ 5,3092 na venda. Em apenas dois pregões na semana, acumula ganhos de 3,31% contra o real.
“Essa puxada do dólar vem com o aumento da expectativa sobre um corte do BC”, disse à Reuters Jefferson Laatus, sócio fundador do grupo Laatus. “Campos Neto mudou de discurso, deixando a entender que o BC pode vir a voltar a cortar os juros.”
As expectativas de um novo corte de juros cresceram após o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, dizer na segunda-feira que o cenário analisado pelo Comitê de Política Monetária (Copom) em sua última reunião mudou.
Na ocasião, o colegiado cortou a Selic em 0,50 ponto percentual, a 3,75% ao ano, e avaliou que tanto uma redução maior no juro quanto afrouxamentos monetários adicionais poderiam se tornar “contraproducentes”.
“O que falamos é que entendemos que as condições que tínhamos no Copom mudaram muito de lá para cá, inclusive as expectativas de inflação”, disse Campos Neto.
A fala foi suficiente para o mercado turbinar apostas em corte de juros. Na curva de DI, operadores embutiam 100% de chance de corte de 0,75 ponto percentual da Selic em maio e 12% de probabilidade de uma redução ainda maior, de 1 ponto. Os contratos futuros da B3 apontavam Selic nominal média de 2,6% em dezembro, 1,15 ponto percentual abaixo da meta da Selic atual (3,75% ao ano).
Os sucessivos cortes da taxa básica de juros a mínimas recordes têm sido fator de pressão sobre o real, uma vez que reduz rendimentos locais atrelados à Selic, tornando o mercado brasileiro menos atraente do que outros emergentes para o investidor estrangeiro.
Esse desestímulo fica mais evidente uma vez que o Brasil há tempos deixou de ter grau de investimento pelas principais agências de classificação de risco, diferentemente do México, por exemplo, um dos principais “concorrentes” do Brasil por capital externo.
O contexto é ainda agravado pela pandemia de coronavírus e conflitos políticos recentes entre Executivo e Legislativo.
Fluxo negativo
Em 2020, o fluxo cambial ao Brasil está negativo em US$ 12,878 bilhões. No mesmo período de 2019, havia superávit de US$ 1,295 bilhão.
“O mercado está antecipando uma saída de dólar ainda mais profunda”, disse Helena Veronese, economista-chefe na Azimut Brasil Wealth Management.
Para ela, o movimento que poderia levar o BC a ser mais agressivo nas intervenções cambiais “já aconteceu” (citando a barreira dos R$ 5,40). Diante disso, Veronese entende que o comportamento do real, passado o pico da pandemia do coronavírus — num quadro já de economias reabertas –, deve ser mais informativo sobre o debate a respeito do grau de atuação do BC.
“Se ainda assim a gente observar um dólar pressionado, com fatores domésticos no radar e a política (local) pesando, aí sim vejo um BC mais ativo.”
O BC anunciou nesta quarta-feira oferta líquida de 10 mil contratos de swap cambial (US$ 500 milhões), dos quais vendeu 6.600 (US$ 330 milhões).
O cenário segue instável. O Credit Suisse, por exemplo, vê o dólar renovando máximas históricas no curto prazo e mantém avaliação “bearish” (negativa) para a moeda brasileira, enxergando um patamar de R$ 5,50.
Para o economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez, o patamar atual do câmbio “não está fora do razoável”, dado que a incerteza de curto prazo é tamanha que justifica a busca por proteção na moeda dos Estados Unidos. Ele acredita, porém, que no fim do ano o dólar deva ficar na casa de R$ 4,80.
Alguns analistas, entretanto, fazem alertas sobre o pós-crise. “A questão definitivamente não é o nível do câmbio, mas a sensibilidade do risco estrutural a que estaremos expostos após a passagem deste choque. Tratar as reservas como proteção suficiente me parece pouco prudente”, disse Adeodato Volpi Netto, estrategista-chefe da Eleven Financial Research.
*Com Reuters