Dólar contabilizado de forma equivocada na conta de luz gera custo extra de R$ 5,6 bi, diz estudo
Consumidor brasileiro tem pagado pela energia em dólar por causa de uma interpretação regulatória equivocada da autarquia, dizem pesquisadores
O preço mínimo da energia elétrica tem sido calculado de forma “inadequada” pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), segundo aponta um estudo dos economistas Gesner Oliveira, da GO Associados e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), e Hamilton Guerra, especialista no setor energético.
A pesquisa, obtida com exclusividade pela CNN nesta segunda-feira (6), mostra que o consumidor brasileiro tem pagado pela energia em dólar por causa de uma interpretação regulatória equivocada da autarquia.
No cálculo dos especialistas, o impacto da dolarização da energia no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medidor oficial da inflação brasileira, na conta de energia residencial é de 0,03 ponto percentual e, nos custos da indústria, de 0,29 ponto percentual.
Juntos, eles somam 0,32 ponto percentual, — mais da metade do aferido pela volta dos impostos federais aos combustíveis e cerca de 10% da meta da inflação para 2023, de 3,25%.
Isso representa R$ 5,6 bilhões por ano de custo adicional para a sociedade.
“A Aneel fixou um preço de liquidez de diferença, que é o resultado do excedente de compra e venda de energia no mercado livre, em R$ 69 por MWh, muito elevado considerando a situação que estamos vivendo com os níveis altos nos reservatórios e o regime de chuvas favorável à reservação de energia neste ano”, disse Gesner Oliveira em entrevista.
“O esperado seria um preço de piso bem mais baixo. O piso é fixado pela Aneel com influência da Usina Itaipu Binacional, cujo preço da energia é dolarizado e indexado pela inflação dos Estados Unidos. O resultado é que variações do preço do dólar acabam na conta de energia.”
O economista explica que o preço mínimo da energia deveria ter como base a média das usinas hidrelétricas brasileiras, que não pagam pela água, apenas pelos custos de operação. Nessa conta, também entraria a Usina Itaipu, dividida com o Paraguai.
Em vez disso, o cálculo atual — determinado pela Aneel na Resolução Normativa 1.032/2022 — considera apenas o preço de Itaipu, em contradição ao parágrafo 2º do artigo 57 do Decreto 5163/2004 (em vigor e hierarquicamente superior à Resolução da Aneel), que determina que o cálculo seja feito com base em todas as usinas hidrelétricas do país (atualmente em R$ 15 por MWh).
“Nós propomos algo que reflita o mercado doméstico de energia, e não uma referência que não tem nada a ver. A energia é um bem não-comerciável, usado pelo comércio, indústria e cidadãos.”
Procurada, a Aneel explicou que a decisão que calculou o preço do PLD mínimo (preço utilizado como referência para liquidação no mercado de curto prazo), seguiu regras vigentes desde 2009, “em cumprimento estrito aos procedimentos tarifários da Aneel e premissas definidas no Anexo C do tratado de Itaipu vigentes há 50 anos”.
“Portanto, a Resolução Normativa ANEEL nº 1.032/2022 não alterou metodologia de cálculo, apenas consolidou algumas normas sobre critérios e procedimentos para o cálculo dos limites máximo e mínimo do PLD e do valor da tarifa de energia de otimização referente à Usina Hidroelétrica Itaipu – TEOItaipu, e, que de acordo com o art. 24 da norma, o valor mínimo do PLD (PLDmin) deverá ser o maior valor entre a TEOItaipu e a TEO das demais usinas hidrelétricas”, diz a nota da Agência enviada à CNN.
Segundo a Agência, a consideração do valor do dólar e inflação americana no cálculo da TEOItaipu estão previstas no Tratado entre os dois países e visam representar os custos de operação e manutenção da usina que é binacional. “Outro aspecto importante a considerar e retificar é que o PLD mínimo não trata, em regra, de preços fixados pela Aneel para serem utilizados em todas as transações e negociações do setor, que são definidas livremente entre as partes (comprador e vendedor), mas tão somente são utilizados para liquidar as diferenças entre a energia medida e a contratada.”
A Aneel destacou que o estudo citado não foi apresentado para a Agência que, portanto, “desconhece suas premissas, o que impossibilita a avaliação da consistência das informações. Informamos que o tema foi levado à justiça que confirmou a higidez e legalidade do processo conduzido pela Aneel e indeferiu o pedido de suspensão da Resolução aprovada pela Agência.”, finaliza a nota.
*Com informações de Thais Herédia, da CNN. Publicado por Tamara Nassif.