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    Como a inflação alta impacta o emprego, a renda e a economia

    Em 12 meses, aumento médio de preços já passou dos 10%

    Juliana Eliasdo CNN Brasil Business em São Paulo

    Que a inflação está alta o brasileiro já sabe, e os números comprovam. A prévia do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) dos últimos 12 meses já chegou aos 10,25% e é um dos maiores em anos.

    E não é só para o bolso que a inflação alta traz impactos. Subidas de preços muito fortes e persistentes geram uma série de distorções – de imprevisibilidade nos negócios a piora do bem-estar das pessoas – e que, em última instância, travam a economia e derrubam o crescimento do país. Menos crescimento significa também menos emprego e menos renda.

    “É bom ter alguma inflação. Inflação zero é ruim, significa que os preços não estão subindo, mas a renda das pessoas também não”, disse o economista Heron do Carmo, professor sênior da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP) e especialista em inflação.

    “O ideal é ter a inflação controlada em um nível baixo. Para o Brasil, uma taxa na casa de 3% está ótimo. Mas, quando ela chega perto dos 10%, já começam a haver distorções.”

    O Brasil, como boa parte dos países, possui um sistema de metas para a inflação e, para 2021, essa meta é de 3,75% – ou seja, bem para trás de onde está o IPCA atualmente.

    Veja as principais consequências de uma inflação muito fora dessa meta e por muito tempo:

    Mais juros. Menos crédito, consumo e PIB

    A principal consequência da inflação alta é que, quando ela sobe, o jeito conhecido ainda mais eficaz de fazê-la baixar é subir os juros – e é o que o Banco Central faz quando vê que ela não está dando sinais de que voltará para a meta sozinha.

    No Brasil, o BC faz isso por meio da Selic, a taxa básica de juros que serve de piso para todos os empréstimos e investimentos em renda fixa do país.

    O problema é que juros subindo têm o efeito de esfriar o crescimento da economia. E a ideia é justamente essa: fazer as pessoas e empresas comprarem e investirem menos para que os preços parem de subir.

    Economia mais fraca, por sua vez, enfraquece a geração de empregos e pode levar até a demissões.

    “O objetivo do aumento de juros é impactar o crédito, e quanto mais caro o crédito fica, menos atividade o país terá”, diz o economista André Braz, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) da Fundação Getulio Vargas (FGV).

    É por conta do aumento atual de juros que os economistas não param de revisar para baixo as expectativas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do país no ano que vem, em alguns casos até para menos de 1%.

    Renda fica menor

    Há o efeito mais imediato e perceptível de uma inflação muito alta: o dinheiro vai sendo capaz de comprar cada vez menos coisas. O salário mínimo, por exemplo, hoje de R$ 1.100, terminou agosto comprando R$ 62 menos hoje do que em janeiro.

    Preços salgados acabam fazendo também com que as pessoas consumam menos e atrapalham o crescimento econômico e a geração de emprego.

    “A inflação é como um cupim que come o dinheiro ao longo do tempo”, disse Braz, da FGV.

    “As pessoas vão tendo que colocar menos coisas no carrinho e, dessa forma, o seu bem-estar vai diminuindo. E, quando a fila de desempregados está muito grande, o trabalhador perde o poder de barganha e não consegue ter aumento.”

    Imprevisibilidade e menos investimentos

    Preços altos e a falta de perspectiva de que eles voltem a baixar também acabam atrapalhando os negócios das empresas e travando decisões de investimentos e compras.

    “Gera muita imprevisibilidade e dificulta o cálculo econômico. A empresa não consegue prever sua rentabilidade e se planejar”, diz Carmo, da FEA.

    “Uma pessoa que, por exemplo, planeja investir em uma casa nova também terá dificuldade, porque ela não sabe qual será a sua disponibilidade de recursos, de fato.”

    Reajustes geram mais reajustes

    Outro problema de preços descontrolados é chamada indexação – os reajustes automáticos de contratos e salários pela inflação, uma herança que o Brasil carrega desde os tempos de hiperinflação.

    Se a inflação fica mantida todo ano dentro da meta – em 3,75%, por exemplo – os reajustes do ano seguinte serão também de 3,75%, e a variação não sai muito de onde está.

    Mas se o aumento começa a ficar muito forte – em 10%, por exemplo –, ele carrega esses 10% para os reajustes futuros e retroalimenta mais inflação.

    Inflação alta por muito tempo também faz desandar o que os economistas e o Banco Central chamam de expectativas: mais importante do que quanto está a inflação agora, é o que as pessoas e empresas esperam para ela nos próximos meses.

    Expectativas de inflação alta também tendem a fomentar mais inflação. “A inflação só vai para a meta se as pessoas acreditarem que ela vai para a meta”, disse André Braz.

    “Se o empresário vê todos os seus custos aumentando, a energia subindo, a comida 10% mais cara, uma hora ele vai desistir de segurar os preços e vai repassar.”

    Mais desigualdade

    Um efeito colateral adicional da inflação alta e do subsequente aumento de juros a que ela leva está em um ligeiro aumento da desigualdade, de acordo com os economistas.

    Isto porque, se inflação mais alta é ruim para a renda de qualquer um, os juros mais altos, por outro lado, são um porto seguro de rendimentos garantidos na renda fixa para quem tem dinheiro para investir.

    Boa parte dessas aplicações acompanha e sobe com a Selic e, em alguns casos, até mesmo com a inflação – caso de uma parte dos títulos públicos e também de debêntures que pagam o IPCA e mais um adicional como remuneração.

    “A maior parte das pessoas da classe média para baixo não tem poupança, vive da mão para a boca”, disse Carmo. “Quem tem mais renda, tem mais condições de se defender. Como, quando a inflação está alta, a tendência é que os juros subam, isso acaba favorecendo esse segmento.”

    E por que não deixar os juros onde estão?

    Se o aumento dos juros tem tantos efeitos deletérios para a economia, por que então aumentá-los? Por que não deixá-los onde estão ou, pelo menos, não aumentá-los tanto?

    Em muitos países, inclusive, os bancos centrais tem um mandato duplo, o que não é o caso do Brasil: a autoridade monetária tem a obrigação de manter tanto a inflação quanto o desemprego em equilíbrio ao decidir o que fará com os juros do país.

    No ano passado, no auge da pandemia, o banco central dos Estados Unidos, o Federal Reserve (Fed), até anunciou uma inversão histórica de seus objetivos, passando a tolerar uma inflação eventualmente mais alta do que a meta de 2% para poder manter os juros baixos e o estímulo à economia por mais tempo.

    No Brasil, como em muitos países, a tarefa única do Banco Central continua sendo apenas colocar a inflação na meta, enquanto PIB e emprego são problemas do Ministério da Economia e do resto do governo.

    Ainda assim, economistas concordam que, em um cenário de inflação escapando do controle, a saída por subir juros e domá-la é melhor do que a de deixá-la livre.

    “[Manter os juros baixos] É jogar lenha na fogueira da inflação”, de acordo com Heron de Carmo. “Isso deixa o crédito artificialmente mais barato, fica mais difícil os preços baixarem, depois a inflação chega aos 15% e fica muito mais difícil derrubá-la”, disse.

    “Se não conter o avanço, a inflação ganha cada vez mais impulso, como um cartão de crédito que você não paga e a fatura só cresce”, diz André Braz.

    “Ela se retroalimenta e vai ganhando cada vez mais velocidade. Aí voltamos para aquela realidade do passado, quando a pessoa ganhava o salário e tinha que gastar na mesma semana porque na seguinte já não comprava mais nada.”

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