Como a alta do dólar influencia o dia a dia dos brasileiros
Valor da moeda americana tem crescido a patamares históricos no país. Os impactos da oscilação, porém, vão além do setor do turismo
Essa importância da moeda americana foi conquistada durante e, principalmente, após a vitória na Segunda Guerra Mundial. A ideia de economistas da época era deixar de ser tão dependentes do ouro como referência, que estava em baixa por causa dos conflitos travados entre os países dos grupos dos Aliados e do Eixo. A opção foi criar uma taxa de câmbio fixa baseada em uma moeda forte. Os Estados Unidos foram vistos como o país que melhor demonstrava essa credibilidade à época.
Desde então, o dólar foi adotado como moeda para países comporem as suas reservas e transações. Até os dias de hoje, o dólar segue com essa força por ser uma moeda regulada pelo próprio mercado – a independência do Federal Reserve, o Banco Central dos Estados Unidos, ajuda na consolidação dessa confiança.
Mas por que o dólar está subindo tanto em 2020, especialmente frente ao real? Por aqui, as incertezas externas e internas estão pressionando o valor da moeda brasileira. As crises políticas, a lentidão na tramitação das reformas econômicas no Congresso e o consequente baixo crescimento da economia estão criando um ambiente de insegurança, que resulta em uma desvalorização no real.
Além disso, há também os ventos positivos que sopravam nos Estados Unidos até janeiro. Quer dizer, antes do avanço da crise do coronavírus. Antes do avanço da pandemia, a economia americana apresentava dados como a menor taxa de desemprego dos últimos 50 anos, cerca de 3,5%. Logo, com dados como esse e com o PIB dos EUA avançando acima ou em linha com as expectativas, o dólar consequentemente se fortalece.
“No início de 2020, a maioria das moedas estrangeiras perderam valor em relação ao dólar. Então, mais do que dizer que o real está fraco, é preciso entender que o dólar está forte”, diz André Perfeito, economista-chefe da corretora Necton.
O relatório Focus do dia 6 de março, divulgado pelo Banco Central com a média das estimativas de analistas e especialistas, prevê que a moeda americana volte aos patamares de R$ 4,20. Diante do atual cenário, pode até ser uma boa notícia para aqueles que querem viajar e, por agora, só veem os preços subindo nas casas de câmbio. Mas é importante saber que a valorização do dólar afeta a vida do brasileiro de muitas outras formas.
A seguir, conheça alguns efeitos da valorização da moeda americana no seu dia a dia.
Viagens
Uma consequência direta e instantânea. Quando se escolhe viajar e o câmbio do real está desvalorizado, é preciso desembolsar mais dinheiro para realizar o passeio. Joelson Sampaio, coordenador do curso de economia da FGV/EESP (Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas), afirma que o processo prejudica ainda mais quem escolhe estudar fora.
“Muitas vezes alguém decide fazer um curso ou intercâmbio e precisa ficar longos períodos de tempo vivendo em dólar. Isso pode se tornar um impeditivo”, explica. Por outro lado, o real mais barato pode atrair uma maior presença de turistas estrangeiros, porque aumenta a capacidade de compra de quem vem de fora.
Matérias-primas
Um dos exemplos mais icônicos quando o assunto é alta do dólar, o aumento do preço do pão francês, é afetado diretamente pelo aumento do preço das matérias-primas. Isso se dá por conta de um efeito cascata. O trigo, importado, fica mais caro quando o real está em baixa.
Para piorar, o petróleo, essencial no transporte dos insumos, é negociado em barris negociados em dólar. Toda a logística é afetada pela mudança de preços e vai acrescentando indiretamente no preço final estipulado pelo comerciante e pago pelo consumidor.
Produtos importados
Produtos importados como chocolates, bebidas e queijos também “acusam” rapidamente a valorização do dólar, já que são vendidos ou pelo menos possuem referência na moeda americana. Fica, portanto, mais caro trazer estes produtos para o país.
No entanto, a economista-chefe da consultoria Rosemberg Associados, Thais Zara, afirma que nem sempre o preço é repassado ao consumidor. “Quando a economia não está totalmente aquecida e o poder de compra se encontra baixo, a tendência é que os empresários absorvam uma parte deste reajuste”, afirma.
Entrada de investimento
Com um Brasil “mais barato”, também se cria espaço para a entrada de capital estrangeiro no país. Uma empresa multinacional pode se sentir mais compelida a realizar um investimento por aqui se os custos forem menores. Mas só isso não basta. É preciso que o país esteja atraente, com bons resultados econômicos e perspectivas de crescimento. Ou seja, as expectativas precisam ser positivas.
Eletrônicos e softwares
Dentro da ala de importados, há um grupo específico de produtos extremamente afetado pelo processo. No ramo de tecnologia, com sucessivos e cada vez mais rápidos avanços, são requeridas atualizações constantes.
Os eletrônicos, celulares e produtos de linha branca, por exemplo, precisam de insumos que não são produzidos por aqui. Já os softwares, programas instalados nos produtos acima, dificilmente são desenvolvidos aqui. E se são comprados do exterior, o preço é em dólar.
Exportações
No campo das exportações, o real menos valorizado pode ser benéfico para quem vende seus produtos. Isso porque as mercadorias ficam mais baratas e podem encontrar mais compradores lá fora.
Apesar disso, quando um grande parceiro comercial do Brasil como a China não está agindo muito no mercado (como no início de 2020 por conta do coronavírus), essa oportunidade pode se tornar irrelevante.