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    Bolsa Família está congelado há 3 anos e aumento de 20% anunciado só repõe inflação

    Com reajuste proposto pelo governo, ganho real no valor médio do benefício básico seria de R$ 4

    Juliana Eliasdo CNN Brasil Business , em São Paulo

    Entre os anúncios feitos pelo governo sobre o lançamento do Auxílio Brasil, programa concebido pelo presidente Jair Bolsonaro que deveria ser uma versão ampliada do atual Bolsa Família, está a promessa de um aumento de “cerca de 20%” no benefício hoje pago às famílias participantes.

    As informações foram divulgadas na quarta-feira (20) pelo ministro da Cidadania, João Roma, sem muitos detalhes tanto sobre os novos valores, quanto de onde sairão os recursos para financiá-los. Os novos pagamentos, com o programa já rebatizado para Auxílio Brasil, começariam em novembro.

    Os valores de base do Bolsa Família, porém, não são reajustados há pouco mais de três anos, desde que o atual governo assumiu, e o aumento de 20% prometido seria o suficiente apenas para recompor a inflação nesse período.

    Ou seja: na prática, o valor do programa ficou menor ao longo desses anos e voltaria apenas a ter o mesmo tamanho.

    Desde junho de 2018, data do último reajuste promovido, ainda na gestão do ex-presidente Michel Temer, a inflação acumulada pelo INPC, que mede os preços para a baixa renda, é de 20,8%. É o equivalente à perda de um quinto do poder de compra.

    Isso significa que o benefício médio recebido pelas famílias do programa naquele ano, que foi de R$ 182 mensais, deveria estar em R$ 220,84 hoje apenas para que elas continuassem comprando a mesma quantidade de coisas que compravam em 2018.

    Atualmente, o benefício médio do Bolsa Família está em R$ 187. Com o aumento prometido de 20%, ele subiria para cerca de R$ 224. Ou seja, será um ganho real de pouco menos de R$ 4 em relação à inflação.

    “O Bolsa Família vinha crescendo até 2012 e 2013, tanto em público quanto em valor de benefício, mas, desde a crise fiscal de 2014, os reajustes minguaram e o número de pessoas atendidas também não cresceu”, disse o pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Pedro Ferreira de Souza.

    “O resultado é que estamos em um momento em que a pobreza aumentou, o Bolsa Família ficou igual e com o valor do benefício caindo em termos reais.”

    R$ 400 temporários

    Além do reajuste prometido de 20%, o novo Auxílio Brasil também deve ter um valor adicional temporário, a ser pago apenas até o final de 2022 – ano da eleição presidencial –, de maneira que todos os participantes recebam pelo menos R$ 400 até lá. Os recursos para financiar esse extra também não estão ainda definidos.

    De 2023 em diante, as famílias cadastradas voltariam a receber apenas os R$ 224 do benefício-base – ou seja, praticamente o mesmo valor de 2018, apenas atualizado pela inflação.

    Procurado pelo CNN Brasil Business, o Ministério da Cidadania não detalhou os novos valores e como o reajuste de 20% dever ser aplicado, mas destacou os esforços do governo em ampliar o número de atendidos.

    “Desde abril de 2020, o número de famílias atendidas pelo Bolsa Família se mantém acima dos 14 milhões, a maior média da história”, afirmou o ministério, em nota. Em junho de 2018 eram 13,7 milhões de participantes; hoje são 14,6 milhões.

    “A proposta [do novo Auxílio Brasil] prevê a ampliação do número de famílias contempladas atualmente, passando para cerca de 17 milhões, além de reajuste nos valores dos benefícios pagos.”

    Congelado em R$ 89

    Hoje, o Bolsa Família paga um benefício de R$ 41 a R$ 48 por gestante, criança ou adolescente na família, para todas as famílias com renda mensal per capita, ou seja, por cada pessoa da casa, de até R$ 178 por mês.

    Elas podem acumular no máximo de cinco benefícios (R$ 205) para gestantes e os dependentes de até 15 anos, e dois (R$ 96) para os jovens de 16 e 17.

    As famílias que estão na extrema pobreza – aquelas com renda per capita menor do que R$ 89 – ainda recebem um benefício fixo de R$ 89.

    É a situação de uma casa, por exemplo, de cinco pessoas que vivem com um ganho total de até R$ 445 por mês.

    São estes valores que estão congelados desde junho de 2018. Se tivessem acompanhado a inflação do período, deveriam estar valendo, respectivamente, perto de R$ 49,50R$ 58 e R$ 107,50. Se forem reajustados pelos 20% anunciados pelo governo, irão para próximo disso.

    O recorte para ter direito ao Bolsa Família, de renda de R$ 178 per capita, também não é revisto há anos, o que também deixa a linha de pobreza desatualizada para a realidade de custos atual. “É preciso ser ainda mais pobre hoje para se tornar elegível ao programa”, disse Souza, do Ipea.

    Reajuste não é obrigatório

    Diferentemente de outros gastos, como o salário mínimo, que deve ter correções automáticas anuais, não há nada na legislação que obrigue o Bolsa Família a ser reajustado periodicamente.

    Os reajustes são feitos por decreto presidencial, no momento e na proporção que o governo da vez decidir.

    A criação de um mecanismo de indexação para o programa, de maneira que os benefícios passem a ser reajustados periodicamente, tem sido defendida pelo relator do projeto do Auxílio Brasil na Câmara, o deputado Marcelo Aro (PP-MG), que pode ainda incluí-la no texto final do programa.

    Programas sociais

    Em sua resposta ao CNN Business, o Ministério da Cidadania afirmou o compromisso do governo em reforçar as políticas às populações mais frágeis e mencionou outras iniciativas recentes de combate à pobreza, caso do Alimenta Brasil, de garantia de compra de alimentos da agricultura familiar, e do Brasil Fraterno, de distribuição de cestas básicas. Ambos são reformulações de programas anteriores já existentes.

    “O Ministério da Cidadania tem trabalhado sistematicamente para fortalecer os programas sociais e estabelecer uma rede de proteção para a população em situação de vulnerabilidade no país”, afirmou a pasta.

    “É compromisso desta gestão ampliar o alcance das políticas socioassistenciais e atingir, com maior eficácia, a missão de superar a pobreza e minimizar os efeitos da desigualdade socioeconômica.”

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