BC está mais cauteloso, mas ainda tem gordura de juros para cortar, dizem economistas
Para especialistas, sinalização de novos cortes da mesma magnitude para as próximas reuniões foi o grande destaque do comunicado do Copom
O corte de 0,50 ponto percentual na taxa básica de juros da economia, anunciado nesta quarta-feira (1º) pelo Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC), veio em linha com o esperado pelo mercado. Com a decisão, a taxa Selic passa a 12,25%.
O destaque, segundo especialistas ouvidos pela CNN, foi a sinalização de novos cortes da mesma magnitude para as próximas reuniões. Por outro lado, a incerteza fiscal poderia ter impacto na inflação.
A economista-chefe do Inter, Rafaela Vitória, avalia que há espaço para novos cortes, que devem se perpetuar até o primeiro trimestre de 2024, apesar das incertezas no cenário externo.
A especialista cita o posicionamento do BC sobre a importância em se perseguir as metas para as contas públicas como um dos principais riscos no cenário doméstico.
“A gente tem o risco externo, mas aqui, internamente, essa incerteza fiscal pode, sim, impactar a inflação à frente. E isso de duas maneiras: uma via câmbio, em que a gente pode uma desvalorização cambial se o mercado perder a confiança na trajetória da dívida, e outra é via estimulo da demanda. Um aumento de gastos sem fontes traz um estímulo, e isso pode manter a inflação persas e também desancorar a inflação à frente”, afirma.
Na análise de Rafaela, caso a discussão sobre o Orçamento de 2024 resulte em revisão da meta fiscal, é possível que haja desancoragem de inflação, o que poderia levar o BC a rever a inclusão do balanço de riscos no comunicado.
O Comitê reajustou para cima a projeção de inflação para 2024, que agora passa a ser de 3,6% — alta de 0,10 ponto percentual — e reforçou a existência de fatores de risco no cenário global.
“De fato, a inflação de serviços cai de maneira mais lenta, a atividade acabou ficando mais aquecida este ano, então o BC está correto em ter essa preocupação com a persistência inflacionária e as projeções para 2024 não estão caindo na mesma velocidade da projeção para 2023”, destaca.
Para o economista-chefe do banco BV, Roberto Padovani, o tom do comunicado divulgado pelo Copom logo após a decisão aponta maior cautela.
“A justificativa dessa postura mais cautelosa tem a ver com a preocupação com o ritmo de desaceleração da inflação mais lento do que o esperado no Brasil e no mundo, com a reancoragem apenas parcial das expectativas de inflação e, por último, o aumento dos riscos globais”, afirmou.
“O BC está mais cauteloso, mas o nível elevado de juros no Brasil não impede que ele continua com a redução gradual.”
Padovani manteve suas projeções para a Selic em 11,75% neste ano – com mais um corte de 0,5 ponto na última reunião do Copom neste ano, em dezembro – e de 9% em 2024.
Marco Caruso, economista-chefe do PicPay, avalia que o tom do comunicado deixa abertura para uma possível mudança no “ponto final” da taxa de juros.
“Ele [BC] está falando: ‘isso tudo que está acontecendo não muda ainda meu ritmo de cortes, mas pode atrapalhar o ponto final da Selic. Então, você tinha um certo orçamento na cabeça de corte total, mas, dado esse cenário, é preciso ser mais cauteloso. Então, talvez eles possam estar discutindo internamente”, afirma.
Para Caruso, caso haja “piora adicional” da inflação projetada para 2025, o orçamento total de cortes da Selic poderia ser menor.
Lucas Farina, analista econômico da Genial Investimentos, destaca que o comunicado não celebrou a queda da expectativa de inflação para 4,6%, abaixo do teto da meta, de 4,75%.
“Isso vai evitar com que o Banco Central tenha que escrever pelo terceiro ano consecutivo a carta endereçado ao Ministério da Fazenda explicando os motivos do descumprimento da meta”, analisa.
Ele também comenta a ausência de reconhecimento, por parte do BC, da melhora da composição da inflação nas últimas leituras, “principalmente dos serviços subjacentes e das métricas de núcleo”.
“A interrupção do movimento de reancoragem das expectativas de inflação também parece estar incomodando bastante o Banco Central, principalmente para os anos de 2025 e 2026”, afirma Farina.