Descubra as ações preferidas de Florian Bartunek, sócio do Lemann
Em entrevista, CEO da Costellation diz que a bolsa brasileira não está cara, mas que prefere investir em empresas que inovam e têm 'o vento a favor por trás'
Com R$ 10 bilhões nas mãos para administrar e um sócio do calibre de Jorge Paulo Lemann, Florian Bartunek, CEO da gestora Constellation, avalia que a bolsa brasileira ainda não está cara, apesar da recuperação recente.
Antes da pandemia do novo coronavírus, o Ibovespa superava os 113 mil pontos – com perspectiva de atingir patamares ainda mais altos. A chegada do vírus fez com que o índice regredisse para quase 60 mil pontos ao final de março. Agora, quase três meses depois, retomou parte do fôlego e está perto dos 95 mil pontos.
Florian se não arrisca a traçar um cenário para o índice, mas garante que existe um grupo de empresas listadas que vão apresentar bons resultados nos próximos meses – e mais ainda daqui a cinco anos. E, é claro, é nelas que se deve apostar.
Quais são? Justamente as que estão performando bem apesar da pandemia.
“[Por causa da incerteza] eu continuaria investindo nas empresas que têm tendências estruturais positivas, como nos setores inovação financeira, pagamentos, comércio eletrônico, saúde, empresas de tecnologia na nuvem. Porque a crise acabou acelerando a transformação digital”, disse em entrevista ao CNN Brasil Business.
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Na conversa, Bartunek disse também que o investidor inteligente não toma decisão com base em preferências políticas. E ainda avaliou o cenário macroeconômico e o espaço para ajuste da política monetária.
Leia os melhores trechos abaixo:
CNN Brasil Business – O atual patamar da bolsa brasileira, perto dos 95 mil pontos, é condizente com a realidade econômica do país, ou é uma ‘bolha’?
Florian Bartunek – Tem dois fatores a serem considerados. Um é o desaquecimento econômico e o grande impacto que a crise terá. Alguns negócios irão fechar e isso terá influência no desemprego, que impactará o consumo. Esse é o lado negativo, porque pesa no resultado das empresas.
Por outro lado, temos uma força positiva que é a taxa de juros muito baixa. Com os juros a 2,25%, após o imposto sobre ganho de capitais, o retorno dos investimentos em renda fixa é quase negativo. A inflação pessoal, quando se considera gastos escolares, viagens, por exemplo, tudo isso está subindo mais do que 2%.
Então, eu digo que o investidor sai da frigideira e cai no fogo. A renda fixa está com rendimento negativo, mas por outro lado existe o desejo de ficar nela e o medo de ir para a bolsa por causa da incerteza.
O sr. acredita que a bolsa vai retornar aos 100 mil pontos em breve?
O Ibovespa é um índice muito heterogêneo. Ali tem Vale, Ambev, empresas de varejo, que vão ter comportamentos muito distintos nos próximos meses. Isso aumenta muito a dispersão de resultados das companhias. Tem algumas que estão se beneficiando nesta crise, por exemplo no setor de comércio eletrônico, varejo essencial, farmácias. E outras que foram muito prejudicadas, como as de turismo. Acho que ainda há muita incerteza em relação à economia e à pandemia, se vem um segunda onda, ou não. Então, o investidor tem que ser mais seletivo, porque se ele escolhe errado o setor e a companhia, pode ter uma perda grande.
Em vez de dizer para onde vai a bolsa, eu prefiro dizer que há um grupo de companhias que eu tenho certeza que vai apresentar resultados próximos bons e, daqui a cinco anos, muito melhores.
Eu fugiria das que podem se prejudicar muito se o desempenho da economia for pior do que o esperado. Nesse cenário a gente pode ter, por exemplo, aéreas e bancos caindo [por conta do risco de aumento da inadimplência] e as de comércio eletrônico subindo. E eu continuaria investindo nas empresas que têm tendências estruturais positivas, como nos setores inovação financeira, pagamentos, comércio eletrônico, saúde, empresas de tecnologia na nuvem. Porque a crise acabou acelerando a transformação digital.
Pode citar alguns nomes dentro desses nichos nos quais apostar?
XP, Stone, MercadoLivre, Magazine Luiza, Lojas Americanas, BTG, Totvs, PagSeguro. Empresas que estão inovando e têm o vento a favor mesmo na pandemia.
Desde o início da crise, a bolsa já teve uma recuperação importante. O que estava barato que já ficou caro, principalmente entre as mais líquidas e visadas?
Não sei o que está caro e o que está barato, isso depende muito do comportamento do investidor. Mas é melhor ficar no que está dando certo agora. Nenhuma delas [as blue chips] está cara. Petrobras, Vale, bancos, não estão caros se você olhar para os padrões históricos. E cada uma depende de uma coisa para ter bons resultados. A Vale, do preço do minério; a Petrobras, do petróleo; os bancos, do desemprego e da inadimplência. Mas no caso das ações de bancos, por exemplo, o dividendo anual é duas vezes o que você ganha no CDI.
A bolsa não está cara. E ela não está cara justamente por isso, porque há uma incerteza. A oportunidade na bolsa existe quando há medo e incerteza. Essa janela está aberta. Se você acha que essa questão da pandemia termina rápido e a economia volta, Azul e Gol estão baratas, por exemplo, porque as viagens vão voltar. Mas se a economia demorar para voltar, elas também vão sofrer.
Não tem nada absurdamente caro. Existe muita incerteza do que vai acontecer com a economia e com as empresas, mas se eu ficar na renda fixa não vou ganhar nada, então pelo menos vou olhar para as empresas que estão com o vento a favor por trás.
Você disse recentemente em uma entrevista que não tem mais vento a favor da retomada da economia. O quanto a turbulência política pesa no vento contra?
A turbulência política é muito curiosa, porque é uma coisa com que o investidor brasileiro já se acostumou. Desde muito tempo, desde o governo Fernando Henrique Cardoso, ela é permanente.
E o grande segredo do investidor é não deixar o ruído político afetar o seu humor e o seu investimento. O investidor não entende política muito bem. Política é o jogo da negociação e, para ele é muito difícil, entender isso. Muitas vezes, diz-se que não vai aprovar algo para negociar e, depois, aprovar. É muito perigoso se deixar levar pela preferência política. O investidor experiente evita tomar decisões com base na política.
Quando vazou a conversa entre [então presidente Michel] Temer e o Joesley Batista, em 2017, a bolsa despencou. Havia a especulação de que ele sairia e o [presidente da Câmara, Rodrigo] Maia fosse assumir. Nada disso aconteceu. E quem vendeu no “Joesley Day” perdeu muito dinheiro.
Mas no caso da própria atividade econômica, o quanto isso influencia? Antes da crise do coronavírus, já vínhamos com dificuldade de atrair investimento para fazer a engrenagem girar…
O empresário está tão focado em assumir a empresa dele, que se for focar no que o presidente falar… E acho que o investidor estrangeiro está, por incrível que pareça, acostumado com essa turbulência. Ele investe na Rússia, na China.
O que é importante é entender como isso afeta a economia. No Brasil, a agenda econômica está relativamente mantida.
Por falar em agenda econômica, nesta semana tivemos o anúncio da saída do Mansueto Almeida da secretaria do Tesouro Nacional. O mercado não gostou, porque ele é uma espécie de fiador do ajuste fiscal, mas se acalmou depois de conhecer o nome do sucessor. Como você avalia esse movimento?
O Mansueto tem o dom de ser muito conciliador e muito habilidoso no trato político. Ele é especial por isso. Tem habilidade no trato com os governadores e com o Congresso e conhece, sabe como tratar essa questão do orçamento público, que é uma arte, não é para qualquer um.
O mercado se acalmou porque viu que vai ser uma transição tranquila e porque, de certa forma, o Bruno Funchal [ex-secretário da Fazenda do Espírito Santo] já fez isso [ajustar contas públicas]. O ES é um caso de sucesso fiscal. E, ao mesmo tempo, a bolsa americana performou bem, o que também ajuda o mercado aqui.
Um dos motivos para alta das bolsas nos EUA na segunda e na terça-feira foi o anúncio de um pacote de compra de títulos pelo Federal Reserve (Fed, o banco central do país). Por aqui, qual o tamanho do espaço para o estímulo monetário? Tivemos mais um corte na Selic, para 2,25% ao ano.
A gente tem um potencial de queda do emprego e da demanda. Mas as reduções [na taxa básica] devem ser mais marginais porque ainda existe o risco de valorização do dólar. Por isso, vejo menos espaço na política monetária. É mais uma questão de como a gente conseguirá fazer a reabertura da economia. Não adianta o BC baixar o juro de curto prazo se houver uma sinalização de que a pauta econômica mudou, porque aí o juro longo sobe. A gente está acostumado a toda semana ter uma confusão aqui e ali. O que importa é: a economia está bem? É isso que é importante.
Acho que a redução desta quarta [de 3% para 2,25% ao ano] está de acordo com o script. A gente já esperava que o banco central fosse reduzir os juros, dado que hoje em dia ele prefere errar pelo excesso e ter mais liquidez, ser mais flexível, e depois voltar atrás do que fazer o contrário, ser comedido e errar. Porque ainda há muita incerteza sobre os efeitos da pandemia na economia e sobre quanto tempo ela vai durar. Então, com a incerteza sobre efeito no desemprego e na economia, os bancos centrais do mundo inteiro estão preferindo errar para mais do que para menos. E se errar para mais, depois volta.
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