Alta em tarifas de energia impacta debate sobre privatização da Eletrobras
Relator disse que há "uma pressão muito grande" de bancadas para direcionar até a totalidade dos recursos da privatização para abater custos dos consumidores
O relator da medida provisória (MP) de privatização da Eletrobras na Câmara, deputado Elmar Nascimento (DEM-BA), disse a investidores nesta quarta-feira (7) que há “pressão” de parlamentares por mudanças no texto que permitam direcionar mais recursos gerados pela operação para aliviar tarifas de energia.
Os comentários foram feitos em evento online do Bradesco BBI, disseram à Reuters duas fontes, sob a condição de anonimato, uma vez que a transmissão era restrita a convidados.
A fala sobre possíveis alterações na MP, enviada pelo presidente Bolsonaro ao Congresso em fevereiro, vem em momento em que há projeções de forte alta das contas de luz em 2021.
O relator disse que há “uma pressão muito grande” de bancadas para direcionar até a totalidade dos recursos da privatização para abater custos dos consumidores, segundo uma das fontes que acompanhou o evento.
O deputado também comentou que analisa emendas apresentadas ao texto com propostas nesse sentido, disse a segunda fonte.
Procurado, o deputado Elmar Nascimento não respondeu pedidos de comentário. O Bradesco BBI também não retornou de imediato.
Pela proposta do governo, a privatização geraria 25 bilhões de reais para o Tesouro, além de fluxo de recursos na mesma proporção que seriam usados para abater encargos nas tarifas de energia nos próximos anos.
Isso ocorreria por meio do aporte dos valores na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), um fundo setorial que cobre diversos subsídios no setor.
Uma emenda do deputado Kim Kataguiri (DEM-SP) propôs que todo o valor gerado pela desestatização seja direcionado aos consumidores, ao invés da divisão 50%-50% entre Tesouro e alívios tarifários prevista pelo governo. Já a deputada Tabata Amaral (PDT-SP) sugeriu uso de 66,7% dos recursos com esse fim.
As discussões sobre a MP no Congresso ocorrem enquanto a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) tem expressado preocupações com os aumentos na conta de luz.
O regulador decidiu na terça-feira adiar decisões sobre reajustes para distribuidoras enquanto avalia formas de aliviar em parte os aumentos previstos.
A consultoria Thymos Energia estima que as tarifas devem subir quase 9% em 2021, mesmo com proposta da Aneel de devolver a consumidores nos próximos cinco anos valores pagos no passado por tributos depois considerados ilegais por decisões judiciais.
A perspectiva de alta colocou o tema no radar até do presidente Bolsonaro, que disse a apoiadores em fevereiro que o governo pode “meter o dedo na energia elétrica”.
O secretário especial de Desestatização do Ministério da Economia, Diogo Mac Cord, disse à Reuters que o alto custo da energia está no radar do governo, mas defendeu não haver espaço para as alterações sugeridas por políticos na MP da Eletrobras.
“É evidente que a tarifa está cara, mas a lição aprendida do passado é que não é injetando dinheiro que você vai diminuir a tarifa (de uma forma sustentável)”, afirmou.
O secretário, que participou do evento online com o relator da MP da Eletrobras nesta quarta-feira, não quis detalhar os comentários do parlamentar, mas sinalizou ser contra mudanças.
“Ele (Elmar Nascimento) trouxe essa ideia e minha resposta, ali, foi muito objetiva, no sentido de dizer que infelizmente não existe espaço para isso.”
De outro lado, o governo tem tentado convencer o relator a desistir de mudanças na MP que envolveriam um fatiamento da Eletrobras antes da desestatização. “Parece que isso foi superado”, disse Mac Cord.
“Sem impacto”
Críticos da proposta de privatização da Eletrobras afirmam que ela aumentará tarifas, uma vez que prevê uma renovação de contratos da empresa em condições mais favoráveis.
A estatal hoje entrega a produção de suas hidrelétricas antigas por uma tarifa regulada pela Aneel que praticamente só cobre custos, mas os novos contratos permitiriam a ela vender a energia a preços de mercado.
O secretário de Desestatização, no entanto, defendeu que a proposta do governo “foi calibrada desde o início” para evitar impactos aos consumidores.
Segundo ele, a privatização e um projeto de modernização da regulação do setor elétrico apoiado pelo governo se complementam e devem permitir no final até redução de custos se aprovados.
“Colocando no simulador, a gente vê que em uma conta simples já ficamos no zero a zero. Não vai ter aumento de tarifa. Ninguém reinventa o setor para ter aumento de tarifa”, afirmou.
Ele argumentou também que os consumidores ainda serão beneficiados no médio e longo prazo por outras contrapartidas da desestatização, como a obrigação de que a Eletrobras invista 8,7 bilhões de reais na próxima década na revitalização de recursos hídricos e infraestrutura de energia na região Norte.
“Acho que tem um potencial importante de redução (de custos)”, disse o secretário, ao apontar que esses movimentos permitiriam aumentar a geração hidrelétrica e reduzir custos com geração térmica em áreas isoladas do Norte do país.