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    Covid-19 abala setor de turismo e viagens em 2020; veja como será a retomada

    Setor representa cerca de 10% do PIB global e emprega um em cada 10 trabalhadores; recuperação começará por viagens domésticas e só depois as internacionais

    Hanna Ziady*, , do CNN Business, em Londres

    O empresário grego Sócrates Gavriel está se preparando para uma queda acentuada no número de hóspedes em seu hotel boutique em Atenas, neste verão do Hemisfério Norte. Localizado perto do centro comercial da capital da Grécia, o Pi Athens normalmente recebe multidões de turistas norte-americanos e australianos nesta época do ano.

    “A preocupação neste verão é que aqueles que virão (se e quando vierem) pularão as grandes cidades e seguirão diretamente para uma praia. O hotel é um imóvel alugado e há muitas contas a pagar. Eu investi muito nisso. Esperamos ter alguma receita no verão, mas não sabemos se isso vai acontecer”, lamentou o empresário.

    A história de Gavriel se repete em todo o mundo, já que as restrições dos diversos governos para conter a pandemia de coronavírus mantêm bilhões de pessoas em casa, paralisando as viagens internacionais. E essa paralisação está afetando tudo, de pequenas empresas como o hotel Pi Athens a gigantes do turismo como a rede de hotéis Marriott International (MAR) e a companhia de cruzeiros Carnival Corporation (CCL). 

    A TUI, maior operadora de turismo do mundo, disse no dia 13 de maio que pode fechar até oito mil vagas de trabalho. Até algumas das maiores companhias aéreas do mundo, como a alemã Lufthansa (DLAKF), estão buscando ajuda do governo para sobreviver.

    O turismo representa cerca de 10% do PIB global e emprega um em cada 10 trabalhadores, segundo o World Travel and Tourism Council (WTTC). De acordo com informe do conselho do WTTC divulgado em abril, cerca de um terço desses empregos, ou mais de 100 milhões de posições podem estar em risco como resultado da atual crise, que levará a uma queda de cerca de US$ 2,7 trilhões no PIB mundial.

    Os mais atingidos são países cuja economia depende diretamente dos dólares do turismo. Uma queda de 25% na renda do turismo reduzirá o PIB em cerca de 7% nos “pequenos estados insulares em desenvolvimento”, segundo a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e o Desenvolvimento (UNCTAD). Em alguns desses lugares, como as Maldivas e Seychelles, a contração pode chegar a 16%.

    A situação também é grave na Europa, que possui metade das chegadas internacionais de turistas no mundo. O Parlamento Europeu estima que a indústria do turismo do bloco esteja perdendo cerca de 1 bilhão de euros (US$ 1,1 bilhão) em receita por mês, um golpe devastador para os 27 milhões de trabalhadores da UE com empregos ligados ao setor.

    “A crise no setor de turismo é mais profunda do que poderíamos imaginar há dois meses”, admitiu Isabel Oliver, ministra do Turismo da Espanha. “O setor foi um dos primeiros a sofrer as consequências da crise e será um dos últimos a se recuperar“, acrescentou.

    É fato que donos de hotéis como Gavriel precisem desesperadamente de visitantes internacionais, mas a reabertura de fronteiras, em busca de um alívio econômico, pode aumentar o número de infecções por coronavírus. A Grécia espera começar a receber turistas até 1º de julho , mas o primeiro-ministro Kyriakos Mitsotakis admite que se trata de uma medida muito difícil. “Ninguém sabe ao certo como fazer isso”, disse Mitsotakis à CNN, em entrevista no início de maio.

    Embora seja crucial para a economia global, a volta das viagens será especialmente complexa. A reabertura de empresas e a retomada da produção industrial estão sendo processos bastante complexos – para o turismo, a flexibilização dos controles nas fronteiras, a cooperação internacional e, principalmente, dos próprios viajantes, tornam tudo mais complicado.

    Na quarta-feira, 13 de maio, a Comissão Europeia divulgou um pacote de diretrizes para ajudar os países da UE a revitalizar o turismo, mas reconheceu que as viagens não estarão isentas de riscos enquanto o vírus continuar circulando.

    O documento propõe a suspensão de restrições de viagens entre países onde os surtos estão contidos, incentiva o uso de aplicativos de rastreamento de contatos e recomenda um novo sistema de vouchers para proteger as operadoras de viagens dos cancelamentos generalizados.

    “A questão crítica é aumentar a confiança entre os países de que é seguro reabrir as fronteiras sem risco de reinfecção, e a do público em geral de que é seguro voar”, afirmou John Holland-Kaye, CEO do aeroporto Heathrow, em Londres, o mais movimentado na Europa.

    Os aeroportos têm a chave

    No entanto, as companhias aéreas já estão cortando, reduzindo  frotas e eliminando milhares de empregos, na expectativa de que as pessoas voem menos. A controladora da British Airways, a IAG (ICAGY), disse na semana passada que não espera que a demanda de passageiros se recupere para os níveis de 2019 antes de 2023. A Princess Cruises, uma divisão da Carnival Corporation, cancelou praticamente todas as suas viagens neste verão do Hemisfério Norte, citando a disponibilidade limitada de voos e o fechamento de muitos portos de cruzeiros populares. Já a rival Norwegian teve que arrecadar mais de US$ 2 bilhões no mercado de capitais para não afundar.

    Aeroportos e hotéis estão tentando atrair os viajantes de volta com exames de saúde e protocolos de limpeza aprimorados, que adicionam camadas de custos no momento em que as finanças do setor estão em frangalhos devido ao colapso das viagens.

    Tais medidas, no entanto, são necessárias para restaurar a confiança antes que a vacina da Covid-19 esteja amplamente disponível, como explicou Gloria Guevara, CEO do WTTC. “A peça mais crítica são os aeroportos”, destacou.

    O WTTC está trabalhando com governos e organizações de viagens para chegar a um acordo sobre exames de saúde padronizados e protocolos de limpeza – espera emitir diretrizes para o setor de hospitalidade ainda nesta semana, com orientações para os aeroportos seguirem.

    A Ryanair (RYAAY), que transporta milhões de turistas pela Europa anualmente, anunciou nesta semana novas medidas de saúde a ser implementadas a bordo de aeronaves, como parte dos planos de restaurar 40% dos voos a partir de 1º de julho. As medidas ilustram a difícil tarefa que as companhias aéreas enfrentam ao tentar retomar os céus.

    “Um reinício rápido e eficaz das viagens só acontecerá se os governos de todo o mundo concordarem com um conjunto comum de protocolos de saúde desenvolvidos pelo setor privado”, escreveu Guevara em comunicado.

    Mesmo que isso aconteça, a previsão de chegada de turistas internacionais é praticamente inexistente este ano.

    A Organização Mundial de Turismo das Nações Unidas (UNWTO) estima um declínio de até 80% no setor em relação a 2019, dependendo de quanto tempo persistam as restrições de viagem. Uma queda brutal quando comparada à retração de 0,4% durante a epidemia de SARS em 2003 e de 4% em 2009 após a crise financeira global.

    Um comunicado do UNWTO divulgado nesta semana afirmou: “Esta é, de longe, a pior crise que o turismo internacional enfrenta desde que os registros começaram a ser feitos [em 1950]. O impacto será sentido em graus variados nas diferentes regiões globais, com a expectativa de que a Ásia e o Pacífico se recuperem primeiro”.

    Viagens nacionais dão esperança

    Há alguns sinais precoces de que as viagens domésticas estão voltando a aumentar gradualmente em certos países, embora seja muito cedo para chamar isso de recuperação.

    A China começou a aliviar as restrições de viagens em março, após o fechamento quase completo do país no final de janeiro. Com isso, as companhias aéreas chinesas recuperaram mais de 30% da capacidade desde 1º de março, segundo a empresa de análise de aviação Cirium.

    “Sinais de recuperação no mercado doméstico chinês são um sinal positivo”, afirmou a empresa em nota de pesquisa. “Está claro que, como algumas restrições de viagem diminuem, será o mercado doméstico que começará a retornar primeiro.”

    Mas os cancelamentos de voos permanecem elevados e a recuperação se achatou, sugerindo que a confiança do consumidor ainda não foi totalmente restaurada, acrescentou Cirium.

    A Marriott disse no início desta semana que a ocupação em seus hotéis na Grande China atingiu 25% em abril, ante menos de 10% em meados de fevereiro. O Meituan Dianping, um aplicativo que permite aos consumidores comprar, pedir comida e reservar viagens, registrou um aumento nos gastos com atrações turísticas locais e nas reservas de hotéis e pousadas em abril.

    No entanto, algumas atrações turísticas na China foram forçadas a fechar logo após a reabertura, devido ao grande fluxo de visitantes. O país agora está renovando as restrições em algumas áreas, depois que novos casos do vírus foram relatados em duas cidades, incluindo o epicentro da pandemia, Wuhan.

    O Airbnb também registrou um aumento nas reservas domésticas na Dinamarca e na Holanda, como relatou recentemente o CEO Brian Chesky ao jornal Financial Times. “As pessoas querem opções mais próximas de casa, mais seguras e mais acessíveis”, escreveu Chesky em carta à equipe, postada no site da empresa.

    Isso não significa, porém, que uma recuperação completa será alcançada em breve – e a experiência da China poderá fazer com que outros países reabram com cautela ainda maior. A Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA) disse em 13 de maio que não espera que as viagens de distâncias médias se recuperem para os níveis de 2019 nos próximos cinco anos.

    Com a expectativa de que as esticadas para locais próximos de casa (as “staycations”) encabecem o eventual reavivamento do setor, os países que mais dependem de visitantes nacionais e regionais se sairão melhor.

    No topo desta lista estão os Estados Unidos, México, Brasil, China, Japão, Índia, Filipinas, Alemanha e Reino Unido, onde o turismo doméstico é responsável por mais de 80% do total de gastos com viagens e turismo, segundo o WTTC.

    Já a região da Ásia-Pacífico possui o maior mercado regional de viagens, um bom presságio para algumas ilhas, como Maldivas e Fiji, se os turistas confirmarem a tendência de escolher destinos mais próximos de casa. Países como Tailândia e Camboja, que obtêm mais de 20% de seu PIB com viagens e turismo, também poderiam se beneficiar. Os visitantes da Ásia foram responsáveis por quase 70% de todas as chegadas de turistas na Tailândia em 2018, segundo o Bangkok Bank.

    Os turistas chineses são os que mais gastam em viagens pelo mundo, representando um quinto dos gastos internacionais em turismo em 2018, ou US$ 277 bilhões, segundo a Organização Mundial de Turismo. Em segundo lugar estão os turistas dos Estados Unidos, com US$ 144 bilhões.

    Com a expectativa de recuperação das viagens para destinos internacionais, proprietários de pequenas empresas como Gavriel, cujos clientes viajam longas distâncias para vir para a Grécia, enfrentam um futuro incerto.

    *Elinda Labropoulou, Nic Robertson, Laura Perez Maestro e Sherisse Pham contribuíram com esta reportagem.

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