Entenda como a crise na Americanas afeta outras empresas de varejo no Brasil
Com bancos como grandes credores, Americanas gerou clima de insegurança entre instituições financeiras, após reportar rombo não previsto em balanço
O varejo no Brasil acabou de sair de uma crise gerada pela pandemia, mas já entrou em outra.
Só neste ano, Americanas e Marisa, dois grandes grupos que vivem momentos conturbados na gestão, viram suas ações despencarem na Bolsa paulista. Mas elas não foram as únicas.
A Americanas tem as maiores perdas, tanto no acumulado do ano (-87,88%), quanto em 12 meses (-95,59%), após anunciar uma inconsistência contábil de mais de R$ 20 bilhões em seu balanço financeiro, e com uma dívida que já passa de R$ 45 bilhões.
A Marisa, que já vem apresentando problemas de endividamento nos últimos anos, anunciou na semana passada renúncias de executivos e uma reestruturação. Suas ações já tombaram mais de 36% neste ano, acumulando perda de mais de 76% em 12 meses.
A Westwing, de móveis, C&A, varejo de vestuário, Via, varejo de consumo, Renner, de vestuário, e outras vêm na sequência entre as principais companhias do setor com as maiores quedas na Bolsa.
Todas essas apresentam queda neste ano, com exceção da Arezzo. A Magazine Luiza tem alta de 33,58% no ano, mas acumula queda de quase 40% em 12 meses.
Esse último caso pode refletir a troca de investidores que querem continuar investindo no setor de varejo, mas saíram de Americanas.
Já a Arezzo tem alta de 2% este ano e quase 1,5% no acumulado em 12 meses. A companhia é considerada um varejo de alta renda, o que acabou ajudando seu desempenho.
Como crise de poucos afeta todo o setor
No caso da Americanas, ao divulgar uma dívida muito maior da que era esperada no balanço financeiro, a empresa, que tem os bancos como seus grandes credores, gera um clima de insegurança entre instituições financeiras, explica Gustavo Oliveira, analisa de renda variável da ASA Investments.
“Quando surge essa dívida muito maior e a empresa tem que entrar numa recuperação judicial, todo o setor financeiro, principalmente, os bancos, ficaram com bastante receio que pudesse ter algum tipo de problema nas outras empresas do setor. Sobretudo no que diz respeito a problemas de endividamento”, diz.
O que também dificulta a situação das companhias do setor, segundo Oliveira, é um aumento no custo da dívida, movimento que também vem como consequência do clima de cautela que se instaurou em meio a processos conturbados pelos quais passam duas empresas representativas do setor de varejo, Marisa e Americanas.
“As empresas mais alavancadas, ou com mais dívida, que tiveram que financiar a dívida no curto prazo estão tendo problemas, porque o custo dessa dívida aumentou”, diz o especialista.
“Quando uma empresa faz rolagem de dívida, aumenta seu custo, seus juros e tem dificuldade de gerar lucro. Quando os juros começam a cair, algumas dessas empresas têm uma maior facilidade de gerar lucro”.
Economia enfraquecida penaliza setor
A crise da Americanas tem ecoado no setor como um todo neste ano, mas vale lembrar que as empresas do meio já vinham de um período mais longo de dificuldades, alimentadas por uma queda na renda do consumidor, maior endividamento e escalada da inflação.
“Se voltarmos até antes dos últimos dois ou três anos, já tínhamos problemas. A renda do brasileiro não sobe há muitos anos e, mais especificamente nos últimos 18 meses, já pegando período pós-pandemia, apesar de o desemprego ter melhorado, a inflação aumentou muito, o que corrói o poder de compra dos consumidores”, diz Oliveira.
“Quando se tem aumento de inflação, os juros precisam aumentar para segurar um pouco esse processo e, consequentemente, a economia começa a desacelerar. Então, podemos dizer que a situação econômica é muito frágil e isso afeta bastante as empresas e a expectativa da geração de juros que os investidores tem nessas empresas e, logo, os ativos listados na Bolsa caem”.
*Publicado por Ligia Tuon / com informações de Thais Herédia, da CNN