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    Caro ou barato? Analistas comentam rumo das ações durante a crise da Covid-19

    Especialistas dizem que conceitos não são absolutos e evitam respostas objetivas, mas apontam setores e empresas em que ainda há boas oportunidades

    Luísa Melo, , do CNN Brasil Business, em São Paulo

    A chegada do coronavírus e as incertezas sobre o tamanho de seu estrago na economia derreteram mercados em todo o mundo e fizeram com que ações de empresas sólidas fossem negociadas a verdadeiras pechinchas. Mas a bolsa brasileira já passou por uma recuperação importante desde então: o Ibovespa chegou a despencar 44% do início da crise até seu pior momento, recuperou terreno e, agora, acumula queda de 16%. Nesse cenário, que papéis já ficaram caros? O que ainda está barato? 

    No período mais crítico, em março, a volatilidade era tamanha que a B3 chegou a ter as negociações interrompidas pelo mecanismo de circuit breaker por seis vezes em oito pregões. Desde meados de maio, porém, ainda que com alguns percalços, a trajetória da bolsa tem sido ascendente.

    A ação preferencial da Petrobras, uma das queridinhas dos investidores e que valia mais de R$ 30 antes do feriado do carnaval, chegou a ser vendida por pouco mais de R$ 11 no fim de março, preço que não era visto desde junho de 2017. Agora, está em cerca de R$ 21.

    Operadores e analistas ouvidos pelo CNN Brasil Business hesitam em cravar respostas e alegam que caro e barato não são conceitos absolutos. Mas apontam setores (e empresas) onde ainda há boas oportunidades e segmentos dos quais fugir, tendo em vista os rumos que a economia pode tomar até o país vencer a pandemia e deixar para trás a paralisia causada por ela (confira abaixo).

    “Estar caro ou barato é algo muito relativo, depende do que se avalia, da premissa do investidor e do prazo da aplicação”, diz Matheus Soares, analista da Rico Investimentos. “É complicado dizer, cada pessoa enxerga de um jeito. Sempre que há uma negociação, tem alguém vendendo e alguém comprando, ou seja, um achando barato e outro, caro”, pondera Igor Cavaca, analista de renda variável da gestora Warren.

    É consenso que o movimento de alta da bolsa está descolado da economia real, visto que os indicadores da atividade apontam para um segundo trimestre desastroso em níveis históricos. Mas os especialistas afastam a hipótese de “bolha”

    Eles dizem que o desempenho está calcado na injeção de liquidez global feita por diversos bancos centrais (incluindo o brasileiro) e nos juros baixos, que empurram o dinheiro dos investidores para as ações na medida em que derrubam os ganhos da renda fixa. 

    “Quando o retorno da renda fixa está muito baixo, existe um fluxo financeiro para os ativos de renda variável”, observa Igor Cavaca. “A bolsa não está cara. E ela não está cara justamente porque há uma incerteza [quanto ao fim da pandemia e à velocidade da recuperação econômica]. A oportunidade na bolsa existe quando há medo e incerteza. Essa janela está aberta”, emenda Florian Bartunek, sócio de Jorge Paulo Lemann na gestora Constellation, da qual é CEO.

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    Em sua última reunião, o Comitê de Política Monetária (Copom) baixou a Selic em 0,75 ponto percentual, para 2,25% ao ano, renovando a mínima histórica. E deixou a porta aberta para novos cortes residuais.

    Nas estimativas de Jorge Junqueira, sócio da gestora Gauss Capital, cada 0,1 ponto percentual de corte na taxa tem potencial para gerar 2% de valorização para a bolsa. Para ele, no geral, o preço das empresas na B3 não está acima do que elas de fato valem, mas o espaço para que eles continuem subindo é pequeno. 

    “O investidor com olhar de mais longo prazo se beneficiou [desde o início da crise], porque o que foi perdido foi incorporado muito rápido. Nossa visão é de que muito do que tinha para acontecer [em termos de recuperação] já está lá.”

    Por conta da incerteza que ainda rege o mercado, Cavaca, da Warren, prega cautela até mesmo diante das ações que apresentaram retornos muito interessantes durante a pandemia.

    “Alguns ativos já estão chegando a níveis semelhantes aos das máximas, atingidas em janeiro. Isso pode ser resultado de uma boa passagem por esse momento de crise, mas só teremos certeza quando saírem os resultados do segundo trimestre.”

    Veja, abaixo, o que considerar antes de apostar em alguns setores e também em empresas que estão entre aquelas cujas ações mais caíram na crise do coronavírus – além das blue chips, que são as mais negociadas.

    Vale e Petrobras

    Com as perspectivas de aumento da demanda chinesa e os preços do minério de ferro em alta, as perspectivas são boas para a Vale. 

    No caso da Petrobras, o preço do petróleo nos patamares atuais é suficiente para que a companhia tenha geração de caixa positiva, avalia Junqueira, da Gauss.

    “Vale e Petrobras são ativos que devem ter um comportamento interessante”, diz. “Não houve uma recuperação expressiva nesses dois papéis a ponto de achar que estão bastante caros.”

    Além disso, o dólar alto tende a favorecer as empresas exportadoras, como as duas blue chips, destaca Igor Cavaca, da Warren.

    “Petrobras, Vale e bancos, não estão caros se você olhar para os padrões históricos”, frisa Bartunek. 

    Bancos e serviços financeiros

    O setor bancário é visto com atenção pelos analistas, já que o provável aumento do desemprego tende a elevar o percentual de calotes. “Além disso, o juro baixo pode fazer com que os bancos tenham maior apetite ao risco em suas operações, o que também pode fazer a inadimplência subir”, avalia Junqueira, da Gauss.

    Por outro lado, os bancos são bons pagadores de dividendos (parte do lucro que é repartida com os acionistas), o que pode tornar os papéis atrativos para quem investe com foco nessa remuneração, e não na valorização do ativo. “O dividendo anual é duas vezes o que você ganha no CDI”, diz Bartunek, da Constellation.

    Ele também destaca XP, Stone, BTG Pactual e PagSeguro como ações que têm potencial de valorização.

    Companhias aéreas

    As ações das companhias aéreas estão entre as que mais sofreram com a pandemia. Com os aviões em solo, a queda de receita foi brutal para essas empresas e há dúvidas de que elas consigam sobreviver sem ajuda do governo.

    “Se você acha que essa questão da pandemia termina rápido e a economia volta, Azul e Gol estão baratas, por exemplo, porque as viagens vão voltar. Mas se a economia demorar para voltar, elas também vão sofrer”, afirma Bartunek, reforçando que há muita incerteza sobre o comportamento do vírus e da economia nos próximos meses.

    Serviços básicos 

    O provável aumento da inadimplência também acende um alerta sobre as ações do setor de utilidade pública, que reúne as prestadoras de serviços básicos como energia, gás e água. “Temos uma visão mais conservadora para o segmento”, diz Junqueira, da Gauss.

    Varejo eletrônico

    A venda online se tornou, em muitos casos, a única opção para negócios gerarem receita durante a pandemia. E, por já dominarem esse canal, empresas como Magazine Luiza, B2W, Lojas Americanas e MercadoLivre (neste caso, listada nos EUA) valem hoje mais do que antes da crise.

    Junqueira, da Gauss, diz que o setor passa por consolidação e que ganhará mais espaço no mercado a empresa que melhor conseguir desenvolver a “logística de última milha”, ou seja, a parte final do processo de entregas, para que os produtos cheguem mais rápido ao cliente.

    “A gente fica impressionado com a performance do setor e não sabe se vai ter apenas um campeão. Mas B2W é o grande destaque deste ano.”

    Bartunek, da Constellation, diz que prefere investir em empresas que “estão com o vento a favor por trás” e conseguem gerar resultados mesmo durante a pandemia. Entre elas, cita MercadoLivre, Magazine Luiza e Lojas Americanas. 

    Varejo de vestuário

    Junqueira, da Gauss, vê com “atenção e preocupação” o setor de vestuário, que teve uma rápida recomposição desde o início da crise, na medida em que as medidas de isolamento começaram a ser flexibilizadas. “Apesar de essas empresas se beneficiarem de alguma forma do fator da venda online, temos desconfiança do que vem a seguir.”

    Supermercados

    Apesar de estarem em um setor considerado essencial e com certa resiliência à pandemia, o que fez com que as ações tivessem “uma performance boa, mas não melhor do que a da bolsa”, os supermercados são observados com cautela por Junqueira.

    “Teve um movimento bastante forte, os investidores estão precificando que o futuro vai ser tão bom quanto tem sido hoje. E a gente acha que em algum momento as coisas se normalizam”, afirmou.

    Concessionárias de rodovias

    Investir no segmento de concessões de rodovias também exige cuidado, segundo Jorge Junqueira. Ele destaca que o tráfego nas estradas caiu significamente com a pandemia  – e as receitas dessas empresas vêm dos pedágios. “Além disso, é ano eleitoral e a gente olha com preocupação as renovações de contrato, se os preços serão reajustados”, afirma.

    IRB

    Entre as ações que mais caem em 2020, com queda de quase 70% no ano e de mais de 60% desde o início da crise, as da resseguradora IRB não foram derrubadas apenas pela pandemia. A empresa enfrenta sérios problemas de gestão e tem suas contas contestadas pelo mercado.

    Para os analistas, só depois de apresentados os números do primeiro trimestre (que estão atrasados) é que será possível saber com exatidão o tamanho da encrenca enfrentada pela companhia – e se ela conseguirá se reerguer.

    “Ela está envolvida em uma série de crises que ela mesma criou. E sempre foi tida como uma empresa cara, olhando seu valuation [antes da derrocada]”, pondera Matheus Soares, da Rico.

    Mas contam a favor da companhia o fato de ela ter domínio de seu mercado e de ter trocado seu comando recentemente. “Gostamos muito das pessoas que foram colocadas na diretoria, pois elas têm um bom histórico no setor. Nos níveis atuais, não me parece que o papel está caro. Ela pode ter necessidade de ajustar seu balanço, mas não acho que, operacionalmente, deixará de existir”, diz Junqueira.

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