Lula tem oportunidade de atrair investimentos com encontros bilaterais no G7, dizem especialistas
Petista terá encontros bilaterais com os primeiros-ministros do Japão e da Índia e com o presidente da Indonésia, que também foram convidados para a cúpula
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) participa em Hiroshima, no Japão, entre os dias 19 e 21 de maio da cúpula do G7. Especialistas consultados pela CNN destacam a viagem como uma “janela de oportunidade” para atração de investimentos ao Brasil.
Segundo o Itamaraty, Lula terá encontros bilaterais com os primeiros-ministros de Austrália, Japão, Alemanha e Vietnã, com os presidentes de França e Indonésia, além de reunião com o Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres.
“Para o Brasil o principal foco na cúpula do G7 são os encontros bilaterais, que têm potencial para atrair investimento”, indica Vinicius Rodrigues Vieira, professor do curso de Relações Internacionais do Centro Universitário FAAP.
“O Japão, por exemplo, é adversário da China [no mercado]. Talvez Lula consiga, em função da proximidade com a China, extrair elementos favoráveis do Japão, em termos de investimentos”, completa.
Professor titular do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (IRI-USP), Amâncio Jorge de Oliveira indica que a participação do Brasil no encontro é uma “via de mão dupla”. Para o especialista, a presença de uma liderança latino-americana no encontro traz ainda mais “legitimidade” às decisões da cúpula.
“Ao sinalizar o convite ao Brasil, a cúpula mostra que procura ouvir uma liderança da América do Sul. Há uma abertura do G7 para ouvir outras perspectivas, aumentando a legitimidade do próprio encontro”, explica.
Convite é de interesse mútuo, mas há descompassos
Apesar de a presença de Lula trazer oportunidades tanto ao Brasil quanto aos demais participantes, há um descompasso de entendimento naquele que deve ser o principal tópico da cúpula: a invasão da Ucrânia e penalização da Rússia.
O informativo que aponta as questões a serem abordadas na cúpula indica que a guerra “abalou os alicerces da ordem internacional”. Ainda segundo o documento, o G7 respondeu unidamente à invasão e “continuará a promover fortemente sanções contra a Rússia e apoio à Ucrânia”.
“Demonstramos a forte determinação do G7 em defender a ordem internacional baseada no estado de direito, rejeitando firmemente qualquer tentativa unilateral de mudar o status quo pela força ou ameaça de uso de armas nucleares, como a Rússia tem feito, ou o mesmo uso de armas nucleares”, indica.
Para Roberto Georg Uebel, professor de relações internacionais da ESPM, a prioridade ao tema mostra que o G7 procura maneiras de “auxiliar a Ucrânia sem de fato entrar na guerra”, mas também sinaliza uma tentativa de “isolar cada vez mais a Rússia no sistema internacional”.
O embaixador Maurício Carvalho Lyrio, secretário de assuntos econômicos e financeiros do Itamaraty, explica que o Brasil deve assinar uma declaração sobre segurança alimentar na cúpula, que mencionará os efeitos da guerra para as cadeias de suprimento.
“Como é uma declaração sobre segurança alimentar e há efeitos da Ucrânia no acesso a alimentos, uma referência ao conflito deve ser feita no documento. Naturalmente, o governo brasileiro está negociando a linguagem. Há outros países que não fazem parte do G7 e têm posições não coincidentes com as visões do grupo”, disse.
Vinicius Rodrigues Vieira, professor do curso de Relações Internacionais do Centro Universitário FAAP, indica que Brasil, Índia e Indonésia, diferentemente dos membros do G7, não devem assinar declarações “muito duras” em relação à Rússia — já que tendem a se manterem neutro em relação ao conflito no Leste Europeu.
O convite ao Brasil
Lula fará em 2023 a sua sétima participação em cúpulas do G7. O presidente do Brasil volta a ser convidado para as reuniões do grupo após 14 anos.
Para Roberto Georg Uebel, o convite a Lula “reforça a retomada do prestígio do Brasil a nível mundial e a importância que o país tem para a economia e relações internacionais como um todo”.
O especialista destaca, contudo, que o Brasil terá status de “convidado”. “Ou seja, qualquer decisão, deliberação, votada no G7 não terá o voto do país”, explica.
Vinicius Rodrigues Vieira afirma que o convite é também uma tentativa do Norte Global em frear a aproximação do Brasil com a China.
“O G7 quer conversar com o Brasil não apenas pelas qualidades do país, mas também pela volatilidade do cenário internacional. O Brasil é um dos países que, em função da questão econômica, mais tem se aproximado da China. As falas de Lula sobre a desdolarização da economia, por exemplo, foram mal recebidas por essas nações.”
Haddad
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, esteve no Japão entre os dias 10 e 13 de maio para participar da cúpula do G7 que reuniu ministros de finanças e presidentes de bancos centrais. O ministro chegou a passar por um terremoto no país.
No evento, Haddad encontrou com a secretária do Tesouro dos Estados Unidos, Janet Yellen, quando pediu ajuda no socorro à Argentina e destacou que a união entre Brasil e Estados Unidos nesse tema seria um facilitador para as negociações.
Yellen ressaltou a luta contra a mudança climática e outros objetivos compartilhados entre EUA e Brasil.
O que é o G7?
O G7 é a abreviação de Grupo dos Sete, uma organização de líderes de algumas das maiores economias do mundo: Canadá, França, Alemanha, Itália, Japão, Reino Unido e Estados Unidos.
Apesar de o grupo ser restrito às sete nações, comumente outras são convidadas para as cúpulas. Para Hiroshima foram convidados representantes de Austrália, Brasil, Vietnã, Coreia do Sul, Índia, Indonésia, Comores e Ilhas Cook.
Os membros do G7 se reúnem anualmente em uma cúpula para discutir questões urgentes no cenário global e coordenar políticas. A segurança internacional e a economia global são frequentemente tópicos de discussão.
As reuniões começaram como o “Grupo da Bibliotecas”, fundado na década de 1970 pelo então Secretário do Tesouro dos Estados Unidos, George Shultz. Ministros das finanças dos Estados Unidos, França, Alemanha e Reino Unido se reuniam para “conversas informais” para tentar estabilizar a turbulência cambial.
O Japão aderiu logo depois, e em 1975, com dois dos participantes originais — França e Alemanha — enviando seus presidentes, os encontros tornaram-se reuniões de chefes de estado e de governo. Canadá e Itália logo se juntaram e a cúpula ficou conhecida como o Grupo dos Sete.