Ações da Eletrobras caem mais de 2% em estreia na bolsa após capitalização
Analista atribui desempenho a combinação de mercado desfavorável e fatores específicos atrelados à empresa
As ações da Eletrobras encerraram em baixa nesta segunda-feira (13), dia da estreia da empresa na bolsa após a conclusão do seu processo de capitalização, com a realização de ofertas primária e secundária tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos.
A ação ordinária da empresa (ELET3) fechou com queda de 2,2%, a R$ 41. Já o recibo de ações (ADR) negociado na bolsa de Nova York (EBRb) recuou 2,29%, a US$ 7,57.
Para Flavio Conde, analista de ações da Levante Investimentos, o desempenho nesta sessão esteve ligado a um cenário desfavorável como um todo para o mercado, com uma queda generalizada no Ibovespa em meio a um pessimismo maior entre os investidores, que intensificaram as projeções de uma recessão nos Estados Unidos.
Entretanto, ele avalia que essa não é a única causa. O primeiro motivo para o desempenho seria o fato de o papel ter subido 40% em 2022, bem mais do que o Ibovespa, indicando que “parte da privatização já tinha sido precificada”.
Outro motivo, afirma, é que ofertas de ações já costumam abastecer a demanda de investidores pelo papel, ou seja, é incomum que haja demanda de compradores no dia seguinte, facilitando quedas. Ele cita como casos semelhantes as ofertas públicas iniciais (IPOs) do Nubank e da Raízen.
Já Ilan Arbetman, analista de research da Ativa Investimentos, afirma que não vê catalisadores específico para a empresa, ligando a queda ao cenário ruim na bolsa como um todo.
“De fato, houve uma pulverização grande, a Eletrobras ainda não falou qual foi o resultado, a formação entre fundos grandes, institucionais, de fora e daqui, e pessoas físicas, e quando tiver essa informação vai ficar mais clara para ver uma possível formação de conselho”, avalia.
Por isso, ele acredita que essa pulverização indica que grandes fundos estrangeiros optaram por não fazer parte da oferta em um primeiro momento, o que pode explicar parte da queda, mas em especial na última sexta-feira (10), mas provavelmente não nesta segunda-feira. “Nada impede que mais para frente a gente tenha mais interessados nela”.
Segundo ele, a queda é normal após movimentações como as ofertas de ações, mas o trabalho pós-capitalização “só começou”, e há chances de outros fundos ainda adentrarem na empresa, ajudando na sua valorização.
Conde ressalta, porém, que as pessoas que usaram o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para comprar ações da Eletrobras não devem se preocupar. “Quem entrou, é para ver o dinheiro crescer em 10, 20 anos. Se cair durante 1 semana, 1 mês, 6 meses, não tem problema, tem que ver o preço daqui a 10, 20 anos, e vai ser outra empresa, muito melhor, e valendo mais do que vale hoje”.
Da origem à privatização: entenda a história da Eletrobras
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Apesar de a discussão ter reacendido recentemente, não é a primeira vez que a privatização da Eletrobras vira tópico de debate na política e sociedade. Conheça a história da companhia, da sua criação até a MP 1.031/2021 • REUTERS/Brendan McDermid/File Photo
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Em 1961, o presidente Jânio Quadros assinou a Lei 3.870-A, que autorizava a construção das Centrais Elétricas Brasileiras S.A. A instalação da empresa ocorreu oficialmente em 1962, pelo presidente João Goulart—nascia, então, a Eletrobras • Agência Brasil
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Após a posse do presidente Fernando Collor de Mello em 1990, foi anunciado o “Plano Brasil Novo”, que instituiu, entre outras medidas, a MP 155/90. Ela implementava o Programa Nacional de Desestatização (PND) que, como o nome já diz, visava transferir atividades exercidas pelo setor público ao setor privado • Foto: Wilson Dias/ Agência Brasil
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A Eletrobras foi incluída no plano, e as reformas institucionais e privatizações na década de 1990 acarretaram a perda de algumas funções da estatal e mudanças em seu perfil. Ela só foi removida do PND em 2004 --e adicionada novamente em 2021 • REUTERS/Mike Blake
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Em 2012, a MP579 mudou completamente o rumo da companhia. A medida provisória propunha a renovação antecipada de uma série de usinas hidrelétricas, com a condição do regime de cotas • George Becker/Pexels
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Isso significa que a empresa passa a ser obrigada a vender energia pelo preço que cobria basicamente o custo de operação e manutenção daquelas plantas. Quando não estão submetidas a ele, o preço de mercado da energia elétrica cobrados pelas usinas chega a R$180/MWh. Nas usinas que estão sob o regime, o valor fica em torno de R$60/MWh. Na Eletrobras, cerca de 40% da energia vendida acabava saindo por esse preço • REUTERS/Pascal Rossignol
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Além disso, a MP cortou cerca de 70% das receitas da companhia em transmissão. Isso provocou uma queda de R$10 bilhões no faturamento da Eletrobras, que somadas à crise econômica e ambiental, quase levaram a empresa à falência. • Pixabay
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Em 2016, Wilson Ferreira Júnior, CEO escolhido pelo então presidente Michel Temer, melhorou o cenário da empresa com um projeto de "turnaround" • Marcelo Camargo/Agência Brasil
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Ele demitiu cerca de 53% dos funcionários da companhia, reduziu para menos da metade o número de subsidiárias e ordenou a venda das distribuidoras de energia da empresa --a medida mais polêmica do projeto. Isso fez com que o PMSO— ou seja, as despesas gerenciáveis da empresa com pessoas materiais, serviços e outros— fosse de RS$ 12 bilhões em 2016 para RS$ 9 bilhões em 2020 • Marcelo Camargo/Agência Brasil
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Em 2018, a empresa volta a ser tópico de discussão em todo o país: Temer deu o primeiro passo legal para a privatização da empresa, enviando ao Congresso o PL 9463/2018. Ele argumentava que a Eletrobras estava perdendo espaço para a iniciativa privada e, diante do acúmulo de dívidas, tornava-se custosa para a sociedade. O projeto ficou parado e nem sequer chegou à fase de votação • Isac Nóbrega/PR
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O presidente Jair Bolsonaro (PL) reacendeu a discussão em 2019, com o PL 5877/2019. Esse projeto buscava demonstrar, assim como o anterior, o decaimento da estatal, sua perda de espaço no mercado e seus custos ao contribuinte. Mas ele também ficou parado no Poder Legislativo • 16/1/2021REUTERS/Adriano Machado
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Em 2021, em um cenário que o governo julgou de relevância e urgência, a MP 1.031/2021 foi editada. Na foto, vemos o presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco, o presidente Jair Bolsonaro, o líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes e o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, durante declaração após entrega da MP • Marcelo Camargo/Agência Brasil
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A ideia é a seguinte: a Eletrobras é uma empresa de capital misto. Como o governo detém 60% de seus papéis, ela é considerada uma empresa estatal. A MP propõe reduzir a participação da União para menos de 50%, por meio da venda de novas ações no mercado • Alan Santos
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A capitalização da Eletrobras foi aprovada pela Câmara dos Deputados, pelo Senado Federal, e pelo Tribunal de Contas da União (TCU). O processo foi finalizado em junho de 2022, em uma operação que movimentou mais de R$ 30 bilhões • 3/01/2019REUTERS/Pilar Olivares
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Hoje, a Eletrobras é responsável por 1/3 da energia elétrica do Brasil. Ela detém 43% das linhas de transmissão, e cerca de 29% da geração de energia do país –fazendo dela a maior companhia do setor elétrico da América Latina • Reuters
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Precificação
As ofertas de ações da Eletrobras foram feitas pelo governo federal e pelo BNDESpar, com preço de R$ 42. O preço mínimo estabelecido pelo governo federal para as ações foi mantido em sigilo, mas segundo o fato relevante divulgado pela Eletrobras, a precificação atingiu um valor igual ou superior ao mínimo determinado.
Segundo o documento, o preço por ação fixado envolve um montante total de R$ 29,29 bilhões, acima dos R$ 22,05 bilhões caso o preço mínimo tivesse sido seguido. Considerando o lote suplementar que será ofertado pelo BNDESPar, o total chega a R$ 34 bilhões.
O valor é próximo da expectativa do governo, de R$ 30,69 bilhões, calculado a partir do fechamento de 26 de maio, quando a ação ordinária (ELET3), tinha a cotação de R$ 44.
Com o processo, o governo abre mão de ser o acionista controlador da Eletrobras e passará a ter 45% do capital acionário ante os 72,2% atuais. Entretanto, terá o chamado “golden share”, um mecanismo que permite que ele vete decisões que possam ir contra o interesse nacional.
O processo de capitalização da Eletrobras foi iniciado em 2021, e passou alguns meses parado enquanto aguardava a aprovação pelo Tribunal de Contas da União (TCU). O órgão aprovou tanto o modelo da capitalização quanto as estimativas de movimentação total com a operação, na casa dos R$ 67 bilhões.
Desse total, R$ 25,3 bilhões são em outorgas pagas ao Tesouro Nacional pelo direito do uso das usinas hidrelétricas da Eletrobras. Outros R$ 32 bilhões serão para a Conta de Desenvolvimento Energética (CDE), com o objetivo de aliviar as contas de luz a partir de 2023.