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    Economistas e investidores alertam sobre riscos de governança em mudanças na Lei das Estatais

    Lei das Estatais aprovada pela Câmara dos Deputados na última terça (13); repercussão negativa faz Senado reavaliar votação hoje

    Da CNN

    São Paulo

    Economistas e associações que representam investidores criticam a alteração da Lei das Estatais, aprovada pela Câmara dos Deputados na última terça (13). O texto seguiu para avaliação do Senado, mas a Casa não deve colocar o texto em votação nesta quinta (15).

    Em entrevista à CNN nesta quinta-feira (15), Valéria Café, diretora do Instituto de Governança Corporativa, criticou redução o prazo da quarentena — de 36 meses para 30 dias — e apontou “viés político” na modificação da lei das Estatais.

    “As interferências político-partidárias prejudicam os cofres públicos, prejudicam a qualidade dos serviços e produtos oferecidos à sociedade, prejudica o ambiente de negócios brasileiro, compromete o desenvolvimento do país”, afirma Valéria Café.

    Para ela, a mudança na legislação pode ainda aumentar a desigualdade porque abre brecha para a corrupção.

    Para Café, ao discutirmos uma mudança que facilitaria indicações políticas para cargos de alto escalão nas estatais, “estamos voltando cinco ou seis anos atrás em um tema que já estava decidido no Brasil”.

    A Lei das Estatais como conhecemos hoje é de 2016, e garante que pessoas com capacitação técnica e competência assumam os cargos. Ela disse que, desde então, essas empresas já haviam passado por um processo de qualificação de governança que trouxe mudanças efetivas, com ótimos resultados.

    Já Alexandre Albuquerque, analista sênior da Moody’s para o setor de bancos no Brasil, apontou impactos negativos para o setor bancário público.

    “O anúncio da mudança na Lei das Estatais é negativa para os bancos públicos porque pode elevar os riscos de governança dessas instituições uma vez que a intervenção política pode impactar suas estratégias de negócios e geração de resultados”, afirmou Alexandre Albuquerque à CNN.

    E continuou: “Apesar de haver uma indicação clara de que o novo governo aumentará a concessão de crédito por meio dos bancos públicos no Brasil, essas instituições têm forte capitalização no momento para apoiar essa estratégia. No entanto, o risco de conceder crédito com taxas mais baixas que os preços do mercado poderia resultar em pressões de rentabilidade em meio a um cenário de aumento do risco de crédito de 2023”.

    Possíveis intervenções nas estatais

    O Goldman Sachs vê a lei das estatais como “uma das camadas de proteção contra possíveis intervenções na empresa (estatal)”. Ainda segundo o Goldman Sachs, a lei oferece “algum nível de proteção contra intervenções na PBR (ações ordinárias), no longo prazo continuamos a ter pouca visibilidade sobre a abordagem da nova administração no médio/longo praz”.

    O banco diz ainda esperar “uma reação negativa do mercado após a notícia” de aprovação pela Câmara e a expectativa de aprovação da Lei pelo Senado, o que já ocorre. Na manhã desta quinta (15), a Bolsa de São Paulo abriu em queda.

    Principal termômetro da expectativa do mercado para a evolução da Selic, taxa básica da economia, os juros futuros de DI (Depósito Interfinanceiro) vêm registrando altas diárias seguidas em meio a temores sobre os planos do governo eleito e às mudanças na Lei das Estatais.

    Assim como o Goldman Sachs, a agência de classificação de risco de crédito Moody’s também afirmou que as mudanças na legislação são negativas para os bancos controlados pelo governo, citando maiores riscos de governança, “uma vez que a intervenção política pode impactar suas estratégias de negócios e geração de resultados”.

    “O risco de conceder crédito com taxas mais baixas que os preços do mercado poderia resultar em pressões de rentabilidade em meio a um cenário de aumento do risco de crédito de 2023”, concluiu a agência.

    Na quarta (14), associações que representam investidores, aliadas ao IBGC, entidade de defesa à governança corporativa, e ao Instituto Ethos, publicaram uma nota de repúdio sobre a alteração da Lei das Estatais.

    A nota destaca que a Lei das Estatais blinda as companhias controladas pelo governo contra o “risco de sua captura por interesses político-partidários”.

    De maneira informal, participantes das entidades que assinam a nota afirmam que a alteração na Lei pode levar as estatais a um retrocesso, fazendo com que essas empresas voltem a se tornar “cabides de empregos”. Outra crítica feita diz respeito ao prazo de aprovação da mudança da Lei pelos parlamentares, à toque de caixa, em uma noite.

    A leitura feita é de que políticos estão revogando em poucas horas a construção de uma lei que foi elaborada a partir de anos de discussão, com base em parâmetros internacionais.

    A Lei das Estatais foi criada em 2016, no governo do ex-presidente Michel Temer, como resposta aos desvios de dinheiro público identificados pela Operação Lava Jato.

    A norma proíbe a indicação para conselhos de estatais ou agências de pessoas que atuaram em campanhas eleitorais ou participaram ativamente na estrutura decisória dos partidos nos três anos anteriores.

    O texto da Câmara reduziu de 36 meses para 30 dias o período que uma pessoa que tenha atuado em campanha eleitoral ou estrutura partidária precisa passar em quarentena para tomar posse em cargo de direção em empresa pública ou sociedade de economia mista. Também vale para estatais e agências reguladoras.

    “Retrocesso”

    O senador senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) criticou o afrouxamento na Lei das Estatais. O tucano, que relatou o texto que originou a lei que dificulta o loteamento político das empresas públicas, classificou como “burrice” o fato de o PT ter apoiado a iniciativa.

    Para Tasso, em entrevista ao Estadão, a mudança deixa a “porta aberta para todo tipo de coisas não republicanas”.

    A mudança foi aprovada na Câmara dos Deputados poucas horas depois de o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ter confirmado o ex-ministro Aloizio Mercadante na presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

    “É um retrocesso histórico na vida das estatais brasileiras rumo à República das Bananas. Do outro lado, é uma burrice porque o Aloizio Mercadante, no caso, se foi feito para beneficiá-lo, acho que prejudicou. Como o Aloizio é doutor em economia, tem toda a credencial, não tinha mandato, não fazia parte do diretório do PT, não participava de eleições há muito tempo, ele tinha toda uma narrativa para o conselho do banco apreciar. Foi um tiro no pé dele.”

    Votação no Senado

    A repercussão negativa da aprovação a toque de caixa da Lei das Estatais na Câmara fez a cúpula do Senado reavaliar a ideia de aprovar ainda nesta semana o texto.

    A ideia do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, é debater o texto com líderes da Casa, sem pressa, e construir uma solução de consenso.

    Seus interlocutores disseram à CNN que ele não deve pautar o texto hoje (15).

    (Publicado por Ingrid Alfaya. Com informações de Caio Junqueira, Luciana Amaral, Priscila Yazbek e do Estadão Conteúdo)