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    Confiança em queda livre: por que isso é preocupante e como afeta você

    Coronavírus aumentou incerteza de empresários de todos os setores, e também dos consumidores; entenda os efeitos potenciais ao seu bolso

    Mesas vazias em restaurante do Rio (20/03/2020). Comércio teve queda brusca da confiança
    Mesas vazias em restaurante do Rio (20/03/2020). Comércio teve queda brusca da confiança Foto: REUTERS/Pilar Olivares

    Luís Lima

    do CNN Brasil Business, em São Paulo

    Empresários dos setores da indústria, comércio, serviços e construção reagiram de forma instantânea à piora da pandemia do novo coronavírus no Brasil. A partir da segunda quinzena de março, depois que a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou pandemia global, o sentimento do setor privado azedou. É possível ver isso na queda brusca e generalizada dos índices de confiança calculados pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).

    Os indicadores refletem um sentimento abstrato, mas com consequências potenciais concretas, como menos investimento, renda e emprego, em um horizonte repleto de incertezas. Com menos confiança, os empresários não colocam a mão no bolso para investir. Do lado dos consumidores, não há estímulo em fazer compras maiores, como imóveis e automóveis, ou para tomar crédito para fazer qualquer tipo de planejamento. O essencial passa a ser a única opção. Isso impacta diretamente as expectativas de crescimento tanto no curto quanto médio prazo.

    “A queda da confiança sugere um recuo da atividade econômica, com menos faturamento e custos para as empresas, e uma menor necessidade de pessoal ocupado”, diz Rodolpho Tobler, economista do Ibre. Os recuos no mês passado refletem um empresariado mais receoso, que não consegue fazer investimentos ou contratações, para depois se desfazer facilmente, explica o pesquisador. 

    O Indicador Antecedente de Emprego (IAEmp), que busca antecipar uma tendência no mercado de trabalho, reforça essa análise: caiu para 82,6 pontos em março, ao menor nível desde junho de 2016, segundo dados da do Ibre/FGV, divulgados nesta terça-feira (7). 

    Segundo Tobler, a incerteza, catalisador da queda da confiança, também respinga em outras variáveis econômicas, com pressões adicionais no mercado de câmbio e inflação. “Isso tudo vira uma bola de neve. Há uma crise global e que não impacta só o Brasil”, reforça. 

    No mês passado, o Índice de Confiança Empresarial (ICE), que consolida os resultados de indústria, serviços, comércio e construção, caiu para 89,5 pontos, menor nível desde setembro de 2017. O indicador, que é um termômetro da disposição de investir do empresariado, é dividido em dois sub-índices: um que retrata a situação corrente dos negócios, o chamado Índice de Situação Atual (ISA), e o que reflete o futuro, o Índice de Expectativas (IE). 

    O resultado de março é sintomático: foi puxado pela piora das expectativas sobretudo de comércio e serviços, dois dos setores mais afetados pelo COVID-19, principalmente depois da quarentena imposta em grandes cidades do país, como Rio e São Paulo.

    Dentro do índice consolidado, o sub-índice de expectativas cedeu quase 15 pontos, o maior tombo desde a crise de 2008-09, enquanto o índice da situação atual teve baixa de apenas 0,8 ponto. 

    As quedas registradas pelos setores produtivos tiveram magnitudes diferentes. De forma individualizada, os afetados de forma mais imediata também foram os mais impactados. Comércio e serviços tiveram, portanto, recuos de mais de 10 pontos, e retornaram aos mesmos patamares de 2017 e 2018, respectivamente. Já indústria e construção tiveram perdas inferiores a cinco pontos. 

     

    “É um baque estrondoso”, avalia Aloisio Campelo Júnior, coordenador das sondagens de confiança do Ibre, ao citar os impactos no setor serviços. Dentre os segmentos mais prejudicados, cita turismo, hotelaria, aviões e salões de beleza, que praticamente interromperam suas operações. 

    No comércio, Campelo Júnior menciona a compensação de segmentos considerados essenciais, como supermercados e farmácia, e de outros que conseguem transformar a venda presencial em online. Apesar disso, pondera, é insuficiente para sobrepor o recuo repentino da renda dos brasileiros e seu impacto sobre o setor como um todo. 

    A aparente resiliência da construção é justificada pelo ciclo de produção, mais longo. Ainda que o mercado imobiliário tenha esfriado, com menos pessoas comprando imóveis, muitas obras mantêm seus calendários de entrega. 

    Já na linha de frente indústria de transformação, a confiança foi mais afetada entre os empresários que trabalham com comércio exterior e de bens duráveis, nos setores automotivo e de móveis, por exemplo. 

    Com o setor produtivo com mais dúvidas que certezas, a demanda também reagiu de forma negativa. O índice de confiança do consumidor caiu 7,6 pontos em março, para 80,2 pontos, o menor valor desde janeiro de 2017. Para os pesquisadores do Ibre, a baixa reflete as incertezas sobre manutenção da renda e emprego, que pode impactar decisões de compra, e que retroalimenta, por sua vez, o pessimismo dos empresários. 

    Expectativa nebulosa 

    A confiança deve continuar em queda tanto nos setores produtivos, como para o consumidor, conforme o cenário segue incerto, pela falta de perspectiva de um recrudescimento da COVID-19 no mundo.

    Setores considerados essenciais, como alimentos e medicamentos, estão menos expostos, mas a economia em geral seguirá mais frágil, com o setor produtivo cauteloso, tendo que operar de forma improvisada, e à espera de uma retomada gradual.

    Os pesquisadores ainda reforçam que a crise atual é muito diferente das últimas enfrentadas de grande magnitude, como a de 2008-09, de natureza financeira, ou do governo Dilma Rousseff, de natureza política.

    “Temos um fenômeno natural — uma ameaça à saúde do mundo todo, que força uma parada dos setores produtivos”, diz Campelo Júnior. “Não será um ano simples. A incerteza está em níveis estratosféricos. Não sabemos se nem quando a economia reagirá”, diz o economista.