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    Alta na Selic chega à população antes de ter efeitos sobre inflação; entenda

    Tempo para que todos os efeitos de mudanças nos juros cheguem à economia varia, mas os mais imediatos atingem o crédito

    João Pedro Malardo CNN Brasil Business , em São Paulo

    O impacto entre o Banco Central anunciar uma mudança na taxa Selic, e os efeitos serem realmente percebidos  na economia não é imediato. Os resultados pretendidos com a alta dos juros para 10,75%, anunciada no início deste mês em mais uma tentativa de conter a inflação, por exemplo, só devem ser sentidos daqui a alguns meses. Mas esse descompasso não livra a população a perceber o impacto no curto prazo, no dia a dia.

    Segundo especialistas consultados pelo CNN Brasil Business, é na população que os primeiros efeitos de ajustes na Selic aparecem, mesmo antes de refletir em variáveis como inflação e Produto Interno Bruto (PIB).

     

    Impactos imediatos

    O efeito mais imediato quando a taxa básica de juros varia é exatamente sobre os juros praticados por instituições financeiras em empréstimos ou financiamentos.

    Claudia Yoshinaga, professora da FGV, diz que essa elevação costuma ocorrer já nas horas seguintes à decisão do Comitê de Política Monetária (Copom). Outro efeito mais imediato ocorre nos investimentos.

    “Se foram investimentos em renda fixa pós-fixados, o efeito ocorre logo em seguida e há a baixa ou alta do juro. Nos pré-fixados a taxa é estabelecida antes, e não muda. Se uma pessoa investiu em um título com taxa de 9% há dois anos, quando a Selic estava baixa, hoje já está perdendo dinheiro”, diz Yoshinaga.

    Empresas também não passam ilesas, segundo a professora Margarida Gutierrez, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). “Quando o custo do crédito sobe, os setores imediatamente afetados são os que têm bens financiados e de maior valor, e para as empresas o custo do crédito sobe”, afirma Gutierrez.

    A professora do Insper, Juliana Inhasz, fala ainda em um impacto indireto da alteração nos juros. “De forma geral, quem não precisa de crédito sente esse efeito, meio que indiretamente, quando as empresas demoram mais para modernizar, aumentar produção. São projetos e empresas que não saem do papel, não tem produtos novos”, afirma.

    Nesses casos, o movimento reflete um efeito da taxa Selic a mais longo prazo, com efeitos mais fortes para a economia em geral.

    Efeitos posteriores

    O processo de alta da Selic resulta no que a professora da UFRJ chama de “cadeia de efeitos”. Mas a plenitude desses efeitos na demanda —que ao diminuir levaria a uma baixa nos preços— leva alguns meses para ocorrer.

    O tempo varia de país em país, mas o Banco Central estima que no Brasil é entre sete e oito meses. “A subida leva até 8 meses para reduzir o nível de atividade, e 20 ou 18 para bater na redução da taxa de inflação”, diz.

    O processo está ligado não apenas ao custo maior de crédito, limitando a capacidade de investimento das empresas e compra da população, mas também por um “canal de expectativas”. Ou seja, se as pessoas e as empresas já esperam a alta de juros, “apertam os cintos” mesmo antes disso se concretizar.

    “Todos atuam no sentido de reduzir a inflação, pela queda na demanda agregada, mas são efeitos que levam tempo para se processarem plenamente”, afirma.

    Inhasz diz, ainda, que esse processo leva tempo porque a decisão de juros do Copom não leva a uma imediata alta da Selic, apenas indica que ela será feita.

    O tempo, prazo para sentir o efeito depende do BC efetivar as políticas monetárias que levam a taxa de juros para onde quer, influenciar a economia, o que ele divulga é mais uma meta, intenção, e tem um tempo para isso

    Juliana Inhasz, professora do Insper

    Com isso, o ambiente é formado pelo “tempo para a política ser feita, o tempo de reação dos agentes, de mudança de atitude, e quando os agentes tomam a decisão [de investir], primeiro esperam a efetivação da política e aí começam a fazer o processo, de empréstimo, compra, produção e venda, tem todo um passo a passo para chegar a isso”, diz.

    A falta de investimento leva, segundo Yoshinaga, a uma falta de geração de empregos, ou então a altas menores de salários, o que novamente impacta o consumo da população, já limitado pelo crédito mais caro.

    Conforme esses fatores se acumulam, surgem os efeitos para a chamada macroeconomia, pensando em queda de inflação, de PIB e alta do desemprego.

    Por outro lado, quando o cenário inflacionário permite a redução de juros todo esse processo de inverte, mas também leva um tempo para se concretizar, ou seja, a economia não aquece de um dia para o outro quando a Selic cai.

    Variação de tempo

    O tempo para todo esse processo ocorrer não é o mesmo em todos os países e economias, no que Inhasz chama de “tempo de maturação”.

    “Quando tem muita disponibilidade de capital, uma capacidade instalada boa, facilidade de acesso a tecnologia, as economias reagem mais rápido do que a brasileira, que tem mais burocracia, acesso a tecnologia não imediato, capacidade produtiva já prejudicada” afirma.

    Gutierrez cita, também, a rigidez dos preços naquele país, ou seja, a capacidade que eles têm de variar mais rapidamente ou lentamente, o que está ligado a elementos como os componentes do preço e os salários das população, com seus ritmos de reajuste.

    “Quanto mais rigidez de preços, mais demora para responder a altas. A expectativa de inflação também atua nisso, na resposta dos setores às altas. Em geral, quanto mais eficaz é a política monetária, menor o tempo, mas a resposta da economia a todos esses fenômenos é mais demorada”.

    No caso brasileiro, Yoshinaga diz que as causas da inflação no Brasil não estão concentradas hoje na demanda interna, mas sim em problemas como alta de preços de commodities e desvalorização cambial.

    “Isso também tem um tempo de resposta maior, não é subir a taxa que as pessoas param de consumir e a inflação é segurada. O tempo depende muito da motivação para o aumento e para a queda. Por trás da alta atual o objetivo é controlar inflação que não é puramente por demanda”, afirma.

    No Brasil, um diretor do Banco Central já afirmou que o Copom só poderá interferir na inflação de 2022 até a reunião de março, já que a partir das próximas os efeitos seriam voltados para o dado de 2023.

    “Do ponto de vista econômico faz sentido reduzir o ritmo porque ele acelerou anteriormente, e aí tem essa ancoragem de expectativa. O choque veio pelas pressões externas e internas, agora o sinal já foi dado, e as pressões devem começar a ceder, primeiro por resoluções internas, como na crise hídrica, e também no cenário externo”, diz Inhasz.

    Para ela, “o Banco Central vai continuar subindo [os juros], mas a alta foi forte, então tem um impacto de fato e busca colocar a inflação em uma trajetória desejada”.

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