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    Título público mais seguro, Tesouro Selic tem queda inédita em setembro

    Quem tem dinheiro investido na aplicação perdeu 0,46%; desconfiança de investidores com aumento de gastos do governo tem causado choques no mercado de títulos

    Juliana Elias, , do CNN Brasil Business, em São Paulo

    Consideradas a mais seguras e estáveis dos títulos públicos, as Letras Financeiras do Tesouro (LFT) – ou apenas Tesouro Selic, como são conhecidas no Tesouro Direto – romperam com a fama em setembro: fecharam o mês em queda, algo que é bastante raro de acontecer. 

    Isto quer dizer que o investidor que tivesse alguns desses papéis na carteira saiu com menos dinheiro no fim do mês do que o que tinha no começo. A queda foi de 0,46%, de acordo com o Tesouro. Como eles são um dos títulos mais recomendados como primeira alternativa à poupança, para reserva de emergência, e são também um dos preferidos dos fundos de investimento de renda fixa, é uma oscilação que atinge bastante gente. 

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    Notas de real
    Notas de real
    Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

    Por trás da desvalorização completamente inusitada, está uma mistura dos juros mais baixos da história com as incertezas crescentes do mercado em relação às políticas de gastos do governo. 

    O temor é que o governo comece a expandir demais as despesas, com programas como o Renda Cidadã, sem explicar de onde vai tirar o dinheiro. Isso poderia furar o teto de gastos, fazer a dívida crescer muito e obrigar os juros a subirem mais cedo e com mais força do que o inicialmente esperado.

    Com resultado, os investidores estão cobrando do Tesouro juros mais altos para aplicar em seus títulos, como uma contrapartida pelo risco maior, e isso começou a desequilibrar todo o mercado de títulos e da dívida pública nos últimos meses

    “É uma queda significativa? É. É comum que isso aconteça? Não. Pelo contrário, é uma coisa muito atípica”, disse o gestor dos fundos de renda fixa da Western Asset no Brasil, Sérgio Evangelista. “Eu nem lembro a última vez que aconteceu, porque faz muito tempo.”

    As boas notícias são que, primeiro, pode ter sido só um tranco passageiro, em um movimento de ajuste pelo crescente das turbulências políticas e econômicas dos últimos meses. 

    A outra é que, para os pequenos investidores, é ainda uma oscilação pequena dado tamanho do problema: quem tivesse, por exemplo, R$ 10.000 aplicados no Tesouro Selic no começo de setembro, teria R$ 9.954 agora. Na bolsa de valores a queda do mês foi de quase 5%.

    Outros títulos menos conservadores do próprio Tesouro chegaram a cair mais de 12% (caso do Tesouro IPCA+ com vencimento em 2045), também resultado da desconfiança crescente dos investidores com o futuro da dívida do governo e dos juros.

    Por que caiu?

    O Tesouro Selic é conhecido como o título mais seguro e conservador do Tesouro, por ser o único pós-fixado. Ele paga (quase) exatamente a taxa Selic, o que significa que, faça chuva ou faça sol, essa remuneração está garantida e pode ser resgatada a qualquer momento sem perdas. É essa garantia de remuneração, porém, que foi chacoalhada nesse mês.

    O problema começou em um pedacinho muito pequeno desses títulos: na prática, sua remuneração é a Selic mais uma margem quase simbólica, que sempre girou em torno de 0,02% a 0,03% ao ano. Se a taxa básica de juros, por exemplo, varia 2% em um ano, o investidor recebe 2,02% ou 2,03%. Foi esse pedacinho que nunca mudava e para o qual ninguém nem olhava que começou a se mexer e a alterar tudo.

    Ele saiu de 0,03% no começo de setembro para inéditos 0,17%. É esse aumento nesta parte dos juros que fez o preço do título cair o 0,46% visto em setembro. É uma conta que é chamada de “marcação a mercado”. É como se os títulos antigos, com a margem de 0,03%, perdessem valor: quem tem um deles na mão fica sem comprador, porque os novos, que pagam mais, ficam mais interessantes.

    Nas outras opções de títulos públicos, que têm juros prefixados em parte ou a totalidade da remuneração, é bem mais comum haver oscilações desse tipo, tanto para cima quanto para baixo. É o caso dos títulos prefixados (ou LTN) e dos atrelados à inflação (NTN-F e NTN-B).

    O valor aplicado neles varia conforme os juros do país sobem ou descem, e quem resgata o título antes do vencimento tem que aceitar o preço do dia e pode, sim, perder dinheiro. Quem carrega os títulos até a data final, porém, sempre recebe exatamente o que contratou, sem perdas.

    Essa esticada de juros já vinha acontecendo desde julho nesses outros títulos do Tesouro, em especial os prefixados e com vencimentos mais longos, de 2026 até 2050, que são um dos mais usados por fundos de investimentos. Foi só uma questão de tempo para respingar nos outros também. 

    De um lado, com a Selic tão baixa, menos gente foi tendo interesse em comprar o Tesouro Selic ou a LFT, que remuneram a Selic, e o Tesouro começou a vender mais títulos prefixados, que por tradição têm remunerações um pouco maiores. 

    De outro lado, a pandemia fez o governo ter que gastar bilhões de reais a mais e pegar muito mais dinheiro emprestado de uma vez – ou seja, teve que emitir um monte de títulos públicos novos, que nada mais são do que pedaços dessa dívida que ele pega emprestada para pagar as contas.

    “O Tesouro aumentou muito seu endividamento e emitiu muito mais títulos prefixados do que o que o mercado poderia absorver”, diz Evangelista, da Western. “O mercado, então, começou a pedir um prêmio maior para comprá-los.”

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