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    Tesla retira radar da condução autônoma, e especialistas questionam segurança

    Os sistemas de assistência de direção dos veículos mais vendidos da Tesla, o Model 3 e Model Y, contarão apenas com câmeras, assim como na rival Subaru

    Matt McFarland, do CNN Business

     

    Há muito tempo, a Tesla lidera a indústria automotiva — às vezes de forma controversa — com seu sistema de assistência de direção, o Autopilot. De repente, a empresa se encontra agora seguindo o exemplo de um concorrente pouco provável: a Subaru.

    As montadoras não poderiam ser mais diferentes. A Subaru faz carros de família para os que gostam de atividades ao ar livre, enquanto a Tesla se tornou um símbolo de status na cultura pop.

    A Tesla anunciou no mês passado que não vai mais incluir um radar para sistemas de assistência de direção em seus veículos mais vendidos, o Model 3 e Model Y. Em vez disso, vai usar câmeras para o Autopilot nesses novos modelos, uma quebra da tendência predominante no setor de tecnologia de auxílio ao motorista. A mudança pode ter implicações de segurança, disseram especialistas e analistas ao CNN Business.

    A maioria das montadoras prefere que os sistemas de assistência de direção de seus veículos incluam um radar para recursos como o controle de cruzeiro adaptativo, que diminui a velocidade ou acelera dependendo dos carros à frente. O radar é excelente para medir a velocidade de movimento dos outros carros e pode ver facilmente em condições de mau tempo, como chuva ou neve.

    Assim, Tesla e Subaru de repente têm algo em comum, sendo as únicas montadoras a confiar exclusivamente em câmeras para a tecnologia de assistência de direção. Alguns especialistas em direção autônoma dizem que a mudança do Autopilot sem uso de radar é um retrocesso preocupante em termos de qualidade. Outros dizem que o Autopilot está a um passo de ser bom o suficiente, dado o histórico de prêmios recebidos pela Subaru ao usar um sistema baseado em câmeras por quase uma década. Há ainda quem diga que testes no mundo real são necessários para se ter certeza de como a qualidade do Autopilot mudou.

    Sam Abuelsamid, diretor associado do grupo de consultoria Guidehouse Insights, acredita que a remoção do radar pela Tesla torna seus carros menos seguros. Para ele, o fato de a Tesla ter colocado alguns limites na nova versão apenas com câmeras do Autopilot é prova de que a tecnologia de assistência de direção não é tão boa quanto quando usava câmeras e radar.

    A maioria dos carros da Tesla, incluindo os veículos entregues antes de maio, não serão afetados por essas limitações, pois continuarão a ter o Autopilot com radar, por enquanto. A Tesla não anunciou se ou quando fará a transição do antigo Autopilot com radar para a versão somente com câmeras. A montadora afirmou ainda que os limites para os veículos sem radar serão por um “curto período”, mas não revelou quanto tempo. O Autosteer, um recurso da Tesla que mantém o carro na faixa de rodagem, será limitado a 120 km/h e terá uma distância mínima maior dos carros à sua frente, e o sistema de emergência para evitar a saída da faixa poderá ser desativado, segundo a Tesla.

    A montadora, que geralmente não se envolve com a imprensa profissional, não respondeu a um pedido de comentários.

    Elon Musk postou no Twitter que a visão tem mais precisão do que o radar, então é melhor dobrá-la do que combinar os sensores. Ele também disse que os radares precisam ser melhores para que a complexidade de integrá-los valha a pena.

     

    Os desafios de uma câmera

    Alguns especialistas em condução autônoma, como Glen de Vos, diretor de tecnologia da Aptiv, que fornece sistemas de assistência de direção para montadoras, dizem que as câmeras nunca serão tão boas quanto um radar para medir a velocidade, além de serem mais bem utilizadas em combinação com radares.

    Isso pode ter implicações significativas para a qualidade de recursos como frenagem de emergência automática e controle de cruzeiro adaptativo. Especialistas afirmam ainda que o radar mede a velocidade de um veículo à frente mais diretamente do que as câmeras, permitindo um reconhecimento mais rápido e preciso da necessidade de pisar no freio em uma situação insegura.

    “Você usa a visão e o radar pelo que fazem bem, e mistura os dois para ter o melhor desempenho“, explicou de Vos ao CNN Business.

    Mas a Subaru resistiu à tendência convencional por anos, utilizando um sistema de duas câmeras, chamado EyeSight, para recursos como controle de cruzeiro adaptativo, frenagem pré-colisão e assistência para manutenção na faixa. A Subaru vendeu mais de um milhão de carros com EyeSight desde 2013, enquanto a maioria das montadoras conta com câmeras e radares para esses recursos.

    O porta-voz da Subaru, Todd Hill, disse que as câmeras do Eyesight podem medir distâncias, portanto um radar não é necessário. Na verdade, a Subaru usava o radar em um sistema de assistência de direção no Japão para complementar as câmeras em 2003, mas descontinuou o recurso depois de um baixo resultado nas vendas e alto custo, de acordo com Hill. A versão inicial de seu sistema EyeSight baseado em câmeras apareceu pela primeira vez em 2008 no Japão, e em 2012 nos Estados Unidos.

    A montadora recebeu 57 prêmios Top Safety Pick do Instituto de Seguros de Segurança Rodoviária (IIHS, na sigla em inglês) desde 2013, mais do que qualquer outra marca, de acordo com o instituto. Os prêmios são concedidos a veículos que têm o melhor desempenho em suas avaliações.

    Após a remoção do radar dos novos modelos da Tesla, o IIHS retirou os novos Model 3s sem radar do prêmio Top Safety Pick. O porta-voz Joseph Young contou que encomendou um novo Model 3 e restabelecerá o prêmio se ele tiver um bom desempenho. (O grupo ainda não testou o Model Y, portanto ele ainda não ganhou um prêmio, acrescentou Young.)

    A Administração Nacional de Segurança no Trânsito dos Estados Unidos declarou na semana passada que precisará testar os novos Model 3 e Y para verificar a eficácia de seu aviso de colisão dianteira, frenagem de colisão iminente e suporte dinâmico de freio. 

    Esses prêmios e qualificações podem ser recuperados, e a Subaru não parece ter ficado para trás por conta de seu sistema EyeSight somente com câmeras.

    Duas abordagens para câmeras

    Acidente com Tesla
    Acidente ocorrido com um modelo da Tesla
    Foto: Kai Eckhardt/picture alliance via Getty Images

     

    No entanto, existem algumas diferenças nas abordagens da Tesla e da Subaru a respeito das câmeras, o que pode ser problemático para a Tesla, segundo especialistas.

    As câmeras da Subaru estão localizadas próximas ao topo do para-brisa, como as da Tesla, mas são montadas cerca de duas vezes mais distantes umas da outras. Isso permite que as câmeras trabalhem juntas para perceber a profundidade dos objetos, uma capacidade crítica para sistemas de assistência de direção, afirmam os especialistas. A detecção de profundidade permite que um carro saiba que o veículo à sua frente está freando bruscamente, o que pode desencadear um recurso de assistência de direção como a frenagem de emergência automática. As câmeras estreitamente agrupadas da Tesla restringem a capacidade do carro de visualizar a profundidade a uma longa distância, de acordo com os especialistas em condução autônoma. 

    Abuelsamid, o diretor do Guidehouse Insights, está entre aqueles que acreditam que as câmeras da Tesla não estão configuradas adequadamente, e poderiam ser boas o suficiente em frenagem de emergência automática e controle de cruzeiro adaptativo se estivessem mais espaçadas como as da Subaru. As três câmeras voltadas para a frente da Tesla também são estilos diferentes, o que não é ideal para detectar profundidade, mas é importante para a tecnologia de assistência de direção, de acordo com Dave Grannan, CEO da Light, uma startup de câmeras de auxílio ao motorista.

    Grannan acredita na capacidade das câmeras, se usadas estrategicamente. Sua startup conta com câmeras – como a Subaru – para perceber a profundidade, que são montadas mais espaçadas do que as da Tesla, e usa câmeras com campos de visão sobrepostos, o que simplifica o sensor de profundidade, anunciou Grannan.

    “É confuso, com certeza”, alegou. “É difícil achar uma razão lógica para tirar um sensor tão essencial e relativamente barato do veículo”.

    A Tesla incluiu radares aos veículos pela primeira vez em outubro de 2014, de acordo com uma versão em cache de 2016 de um blog que já foi deletado, que falava bem das capacidades do radar, observando que ele navegava facilmente por de neblina, poeira, chuva e neve. 

    “O carro quase sempre vai frear corretamente, mesmo que um OVNI aterrisse na rodovia em condições de visibilidade zero”, disse o post.

    Especialistas em condução autônoma como Ram Machness, diretor de negócios da startup de radares Arbe Robotics, e Eben Frankenberg, CEO da startup de radares Echodyne, dizem que sensores como câmeras e radares têm pontos fortes e fracos. Carros equipados com sensores diferentes podem se complementar, comentaram. 

    “Mais sensores resultam em melhores resultados”, afirmou Frankenberg. “Vamos ver se eles retomam isso a tempo, com radares melhores”.

    Machness disse ao CNN Business que estava preocupado que a frenagem de emergência automática da Tesla em modelos sem radar diminuísse em qualidade, especialmente com baixa visibilidade, quando é mais necessário. 

    “Espero estar errado. Essa é minha maior preocupação”, acrescentou. 

    Outros especialistas afirmam que é muito cedo para dizer se o Autopilot está pior agora, e dizem que os testes são necessários.

    “Não há nada fora da experiência do mundo real que realmente nos ajude a avaliar se isso é melhor, pior ou igual”, comentou Jeremy Carlson, analista do IHS Market.

    Um futuro de condução totalmente autônoma?

    Carro Tesla
    Foto: Reuters/Kim Hong-Ji

     

    No longo prazo, o foco em câmeras da Tesla também pode ser problemático, dizem especialistas, por causa de suas grandes ambições para o Autopilot. A empresa vem prometendo a tecnologia de “condução autônoma total” há anos, ao contrário da Subaru, que tem expectativas mais humildes em relação a suas câmeras. Musk até falou do uso de carros Tesla como “táxis-robôs”.

    Abuelsamid acredita que a retirada do radar tornará mais difícil para a Tesla alcançar a autonomia total, na qual nenhum motorista humano é necessário e todos os passageiros poderiam estar dormindo. 

    Os maiores players em autonomia total, como a Waymo da Alphabet, a Argo AI da Ford e Volkswagen, e a Aurora, com investimento da Amazon, descrevem o radar como crítico. A Waymo disse até que desenvolveu seu próprio radar, com mais resolução, dado seu valor em condições rigorosas de tempo. 

    Nós últimos anos, startups como Echodyne, Oculii e Arbe Robotics surgiram focadas em desenvolver radares mais poderosos. Elas prometem radares com maior resolução do que o disponível hoje em dia. 

    “Se você não consegue fazer um sistema de auto-condução completa com radares e câmeras, como vai torná-lo totalmente autônomo tirando o radar? É um pouco contraditório”, argumentou Steven Hong, CEO da Oculii, acrescentando que não ficaria surpreso se a Tesla um dia voltasse com os radares.

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