Seis em cada 10 pessoas LGBTQIA+ perderam renda ou emprego na pandemia
De acordo com pesquisa da plataforma #VoteLGBT com a Box1824, 41,53% da população LGBTQIA+ está em situação de insegurança alimentar
Seis em cada 10 pessoas LGBTQIA+ tiveram diminuição de renda ou perderam o emprego por causa da pandemia da Covid-19, de acordo com estudo feito pela plataforma #VoteLGBT com a Box1824. A taxa de desemprego entre as pessoas que integram a comunidade é de 17,15%, mas, quando analisadas apenas as pessoas trans, o percentual sobe para 20,47%.
Com a perda de renda causada pela pandemia, 41,53% da população LGBTQIA+ está em situação de insegurança alimentar. Em relação às pessoas trans, o percentual sobe para 56,82%.
Mas não foi apenas a pandemia que impactou na entrada de pessoas trans no mercado de trabalho. Segundo mapeamento da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania da Prefeitura de São Paulo, por exemplo, apenas 13% das travestis e 24% das mulheres transexuais moradoras da cidade declararam possuir trabalho formal.
Por conta do preconceito, a situação se torna mais precária. Dados de mortalidade refletem a intolerância no país: segundo a plataforma Trans Murder Monitoring (TMM, Monitor de Assassinatos de Pessoas Trans, em tradução livre), uma iniciativa da ONG Transgender Europe, o Brasil é o país que mais mata mulheres trans e travestis no mundo.
De acordo com o Observatório de Mortes Violentas de LGBTI+ no Brasil, feito por Acontece LGBTI+ e Grupo Gay da Bahia, 161 mulheres trans e travestis foram assassinadas no país em 2020. O número é o maior entre as pessoas LGBTQIA+ e representa 67,9% do total de mortes de pessoas integrantes da comunidade assassinadas em 2020.
Em uma enquete sobre empregabilidade trans realizada pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) em dezembro de 2020, 94% dos entrevistados informaram que acreditavam que o mercado de trabalho não está realmente aberto e comprometido com a contratação de pessoas trans.
Por isso, ações sociais foram criadas para garantir a entrada de pessoas trans no mercado de trabalho, como o programa TransEmpregos. Fundado em 2013, o programa foi idealizado e criado por Maite Schneider, pela cartunista Laerte Coutinho, além das advogadas Márcia Rocha e Ana Carolina Borges.
O TransEmpregos atua como uma plataforma de cadastramento de currículos e como meio de divulgação de vagas específicas para pessoas trans em empresas. No final de junho, o programa atingiu a marca de mais de 1 mil empresas parcerias e mais de 24 mil currículos cadastrados.
Márcia é coordenadora do projeto, além de participar da Comissão Especial da Diversidade Sexual da OAB/SP e integrar o Comitê de Direitos Sexuais da World Association for Sexual Health. À CNN Brasil, ela falou sobre o programa e como o preconceito incapacita pessoas trans: “O preconceito atua impedindo pessoas trans de se desenvolverem plenamente, de serem quem são. Porque se a pessoa se assume, ela não tem mais oportunidade alguma. Se ela não se assume, ela fica sofrendo o resto da vida com vontade de ser quem é”.
Segundo a advogada, o TransEmpregos foi criado pois ela percebeu o quanto o trabalho é essencial para a dignidade da pessoa. “Como a pessoa pode sair de casa ou construir uma vida sem trabalho, sem conseguir se sustentar, sem ter autonomia?”
“Muitas pessoas trans acabam na prostituição por não terem outra opção de ganho de vida estando transicionada”, continua Márcia.
De acordo com os resultados sobre a pesquisa feita sobre a empregabilidade trans, conduzida por Bruna Benevides e Sayonara Naider Bonfim Nogueira, da Antra, 90% dos entrevistados afirmaram que ainda é atual a projeção de que 90% das mulheres trans e travestis trabalhem na prostituição.
Segundo o mapeamento da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania da Prefeitura de São Paulo, 53% das entrevistadas declararam ter a prostituição como fonte principal de renda. O trabalho na prostituição acaba expondo as mulheres trans e travestis à violência. Segundo o relatório da Antra, 72% das mulheres assassinadas em 2020 atuavam na prostituição.
Outro fator que acaba dificultando a entrada de mulheres trans e travestis no mercado de trabalho é a evasão escolar. Segundo o relatório da Antra, estima-se que “13 anos de idade seja a média em que travestis e mulheres transexuais sejam expulsas de casa pelos pais”. Já o projeto Além do Arco-Íris/Afro Reggae estima que apenas 0,02% das mulheres trans e travestis estejam na universidade, sendo que 72% não possuem o ensino médio e 56% o ensino fundamental.
“Essa situação se deve muito ao processo de exclusão escolar, gerando uma maior dificuldade de inserção no mercado formal de trabalho e deficiência na qualificação profissional causada pela exclusão social”, informa o relatório feito pela Antra.
De acordo com a Márcia Rocha, apenas de 40% dos candidatos que enviam currículos para o TransEmpregos possuem ensino superior.
Mesmo com os índices de desemprego da pandemia, o TransEmpregos registrou um número positivo em 2020. Segundo a Márcia Rocha, 707 pessoas trans foram contratadas durante o período.
Diante desse cenário, projetos de inclusão permanecem importantes para levar diversidade ao mercado de trabalho e permitir que mulheres trans e travestis possam e tenham o poder de escolha com a oportunidade de entrarem no mercado formal.