O que fazer quando sua ação despenca na bolsa e não se recupera mais
Apesar de ser um dos grandes mantras da renda variável, a regra “nunca vender na baixa” tem exceções
A pandemia foi cruel com as ações de praticamente todas as empresas listadas nas bolsas de valores. No Brasil, alguns setores ainda sofrem para se recuperar, caso do varejo, dos shoppings e das companhias aéreas e de viagens.
Ainda assim, o que derrubou a ação que mais caiu em 2020 em nada tem a ver com os efeitos da pandemia ou de uma das piores recessões da história: é o caso do IRB Brasil RE (IRBR3).
Após denúncias de que a companhia de seguros teria fraudes em seus balanços, o papel, que chegou a valer mais de R$ 40 no início de 2020, despencou em poucas semanas para a faixa dos R$ 6 e nunca mais saiu dela. Entre a máxima e o valor atual, a queda é da ordem de 85%, sem sinais de recuperação em um horizonte que já se arrasta há mais de um ano.
É um caso parecido com outros grandes nomes do passado, como a ex-petroleira de Eike Batista OGX (atual Dommo, DMMO3), a operadora Oi (OIBR3) ou a construtora PDG (PDGR3). Entre denúncias ou falências, suas ações chegaram a cair, literalmente, 99%, e estariam até hoje custanto poucos centavos não fossem por agrupamentos de vários papéis em um, feitos ao longo do tempo.
São casos que são exceção na bolsa –no geral, as cotações das principais companhias tendem a seguir mais ou menos as ondas do mercado no longo prazo. Mas as reviravoltas podem acontecer com qualquer empresa e, portanto, com qualquer investidor.
Para os que acabam com um desses “micos” no portfólio, fica o impasse: o que fazer quando uma ação que você comprou vira pó? É uma encruzilhada que se abre em vários caminhos sem ter como saber qual deles, ao fim, terá sido o melhor –vender tudo, deixar como está ou dobrar a aposta e comprar mais.
Vender na baixa?
Um dos grandes mantras do mundo da bolsa de valores é jamais se desesperar e vender os papéis nos momentos de queda. As oscilações são parte inerente da renda variável e vender tudo na hora do prejuízo é apenas o caminho mais rápido para transformar as perdas em realidade.
Mas, como todas as regras, esta também tem a sua exceção –na pior das hipóteses, vale sempre lembrar que as perdas podem ajudar no abatimento de Imposto de Renda na hora de declarar os ganhos com ações.
“Depende muito de quanto você espera ganhar e quanto está disposto a esperar”, disse o chefe de renda variável da Eleven Financial, Carlos Daltozo.
Se você acha que há outras opções que podem dar um retorno maior no mesmo prazo, realiza o prejuízo e parte para outra. Não tem que se apegar a empresa que está dando prejuízo.
Carlos Daltozo, chefe de renda variável da Eleven Financial
É aí que entra outra regra de ouro do investimento em bolsa: ter uma carteira bem diversificada, com ações de várias empresas e setores. Se esse trabalho estiver bem feito, as empresas em alta ajudam a compensar as perdas das apostas que não deram certo e, com sorte, o resultado total se mantem no positivo.
Análise caso a caso
Para Pedro Galdi, analista da gestora Mirae Asset, a decisão de ficar ou sair da ação que deu errado depende de se debruçar sobre cada uma delas, entender as razões que as derrubaram e calcular as perspectivas que têm (ou não) de se reerguer.
O IRB, por exemplo, é um que, em sua visão, ainda tem salvação, mesmo que não tão cedo. Isso, se não justifica a compra de mais enquanto o papel está em liquidação, serve para mantê-lo na carteira em banho maria à espera de uma melhora.
“É uma resseguradora muito forte, que teve erros de gestão no passado e que agora deve arrumar a casa”, disse Galdi. “Ela precisa agora mostrar melhora nos resultados, e pode retomar a confiança e se recuperar. Mas demora.”
É o mesmo caso de quem não podia imaginar que uma pandemia surgiria no mundo e perdeu dinheiro com as empresas de varejo e de turismo, que ainda estão longe de recuperar tudo o que caíram desde o ano passado. “Se a pessoa comprou lá atrás, agora segura. Vender significa assumir um prejuízo muito grande e, mesmo que demore, a economia e o valor delas devem voltar.”
São situações bem menos definitivas do que aconteceu com a Oi, por exemplo, que há anos negocia o maior processo de recuperação judicial do Brasil, ou da OGX, que viu seu valor desaparecer depois de a empresa informar que não tinha petróleo em seus poços e seguir também para a recuperação judicial.
Luz no fundo do poço
Daltozo, da Eleven, lembra também de ex-micos que conseguiram sair com vida do fundo do poço, caso da Embraer (EMBR3), que viu suas ações caírem 70% no ano passado depois de a Boeing desistir de comprar uma parte da fabricante brasileira. Desde o pior momento, em outubro, elas já subiram 167%.
Vale lembrar, porém, que a volta é sempre mais difícil: um preço que caia 90% precisa ser multiplicado por dez, ou seja, subir 1.000%, para voltar para o mesmo valor.
Outras que deram uma bela volta por cima foram as varejistas Magazine Luiza (MGLU3) e Via (VVAR3), antiga Via Varejo, que amargaram anos de perdas e estacionaram com o preço da ação a alguns trocados na recessão de 2015 e 2016, para depois reaparecerem repaginadas e se tornarem duas das empresas que mais se valorizaram nos últimos anos.
Desde 2017, a Via já subiu 262% e o Magazinel Luiza, 5.182%.
Prejuízo reduz IR a ser pago
Na pior das hipóteses –o da perda irremediável–, os analistas lembram que vender ações com prejuízo dá direito a reduzir o Imposto de Renda (IR) total a ser pago pelos investimentos.
Isso vale para quem tem lucros com a venda de ações superiores a R$ 20 mil em um mês, que é o valor mínimo para estar sujeito ao IR, que é de 15% sobre o ganho. Abaixo desse valor, o imposto é isento e o “benefício” do prejuízo é mínimo.
A redução do IR acontece porque o valor do prejuízo, quando o investidor vende uma ação por um preço menor do que comprou, pode ser subtraído dos lucros realizados no mês, reduzindo a base total em que o imposto vai incidir.
Uma pessoa que, por exemplo, teve lucro total de R$ 30 mil nas operações de venda de ações de um determinado mês, terá que pagar 15% sobre estes R$ 30 mil, ou R$ 4.500 de imposto. Mas se ela decide se desfazer das ações deficitárias, vendendo-as, por exemplo, por R$ 8.000 menos do que o total que pagou, esse prejuízo realizado é abatido dos R$ 30 mil, de maneira que o IR será cobrado do saldo de R$ 22 mil restante. O IR final cai para R$ 3.300.