Ford alertou que questão tributária teria ‘impacto adverso substancial’ no país
Em fevereiro do ano passado, a sede da Ford em Michigan, nos EUA, alertou sobre o problema no Brasil e não escondeu surpresa com a situação tributária do país
Processos que questionavam incentivos tributários recebidos pela Ford no Brasil estavam entre os grandes problemas da filial brasileira nos últimos anos.
Documentos entregues à Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos (SEC, na sigla em inglês) alertaram que, após a concessão de benefícios fiscais em várias instâncias, o governo brasileiro impôs à companhia diversas autuações contrárias aos mesmos benefícios e o fim desses incentivos poderia ter “impacto adverso substancial” financeiro ou operacional na filial.
Em fevereiro do ano passado, a sede da Ford em Michigan, nos EUA, alertou sobre o problema no Brasil e não escondeu certa surpresa com a situação tributária do país. Em um dos documentos, a direção da montadora explica que a companhia recebe benefícios em diversas regiões e cita o Brasil como exemplo. “Governos estaduais e federais têm oferecido, e continuam a oferecer, incentivos significativos para estimular o investimento, aumentar a produção e criar empregos”.
Apesar dessa estratégia comum a vários países, o documento alerta que a situação da filial brasileira era diferente. “No Brasil, entretanto, o governo federal impôs autuações contra nós com relação ao nosso cálculo dos incentivos federais que recebemos, e alguns Estados contestaram a concessão de incentivos fiscais pelo Estado da Bahia”, diz o documento.
“Uma redução, expiração sem renovação ou outra cessação ou recuperação de incentivos governamentais para qualquer uma de nossas unidades de negócios, como resultado de decisão administrativa ou de outra forma, poderia ter um impacto adverso substancial em nossa condição financeira ou resultados operacionais”, diz a Ford, ao explicar possíveis desdobramentos no Brasil.
Em outro trecho, a montadora detalha que a filial brasileira recebeu “autuações fiscais substanciais relacionadas a incentivos fiscais estaduais e federais que a companhia recebe por suas operações no estado brasileiro da Bahia”.
Além do questionamento federal, há dois grandes processos: um em São Paulo e outro em Minas Gerais. O processo federal e de São Paulo ainda estavam – no início do ano passado – na esfera administrativa.
Em Minas Gerais, porém, três processos estavam pendentes – um administrativo e dois já na esfera judicial. “Para prosseguir com um recurso dentro do processo judicial, um apelante pode ser obrigado a apresentar uma garantia, o que provavelmente seria significativo. Até o momento, não fomos obrigados a apresentar qualquer garantia”, diz o documento.
O diretor de comunicação da Ford nos Estados Unidos, T.R. Reid, disse à coluna que o problema tributário não foi determinante na decisão da empresa de deixar o Brasil. “Foi uma decisão empresarial baseada no que é necessário para criar valor sustentável para os clientes e para a Ford. Essa decisão reconhece realidades econômicas persistentes que foram exacerbadas pela pandemia”, explicou.
Procurada, a Receita Federal informou que “em razão do sigilo fiscal, não irá comentar”. Mencionadas pela Ford no documento enviado à SEC, as secretarias de Fazenda de Minas Gerais, de São Paulo e da Bahia foram contatadas, mas não responderam até a publicação dessa reportagem.