Entenda o que muda com o projeto que regulamenta setor de criptomoedas no Brasil
Projeto de Lei foi aprovado na terça-feira (29) pela Câmara dos Deputados e estabelece as diretrizes para a regulamentação da prestação de serviços de ativos virtuais no país
A Câmara dos Deputados aprovou, na terça-feira (29), o texto-base do projeto que regulamenta o comércio de criptomoedas no Brasil. A proposta, que estabelece as diretrizes para a regulamentação da prestação de serviços de ativos virtuais, irá agora à sanção presidencial.
Para especialistas, a aprovação da proposta ajuda a trazer mais transparência para o setor de criptomoedas, uma vez que dificulta episódios de lavagem de dinheiro, ocultação de patrimônio e evasão de divisas.
“O projeto de lei, basicamente, regula melhor as exchanges. Essas companhias passam a ter que ter escritório no Brasil, bem como uma série de responsabilidades e precisam prestar contas referentes a esses investimentos”, resume Arthur Igreja, especialista em Tecnologia e Inovação.
O texto aprovado seguiu o parecer do relator, deputado Expedito Netto (PSD-RO), que acatou a maior parte das mudanças feitas pelo Senado no Projeto de Lei 4401/21 (antigo PL 2303/15).
Principais pontos
O projeto estabelece como diretrizes do mercado princípios como boas práticas de governança e abordagem baseada em riscos; segurança da informação e proteção de dados pessoais; e proteção e defesa de consumidores e usuários. Entenda:
Ativos virtuais
O projeto considera ativo virtual a representação digital de valor que pode ser negociada ou transferida por meios eletrônicos e utilizada para realização de pagamentos ou com propósito de investimento.
De acordo com o projeto aprovado, serão consideradas prestadoras de serviços de ativos virtuais as pessoas jurídicas que executam serviços como:
- Troca, em nome de terceiros, de moedas virtuais por moeda nacional ou estrangeira;
- Troca entre um ou mais ativos virtuais;
- Transferências deles;
- Custódia ou administração, mesmo que de instrumentos de controle;
- Participação em serviços financeiros e prestação de serviços relacionados à oferta por um emissor ou venda de ativos virtuais.
Outro ponto é com relação aos órgãos e entidades da administração pública, que agora terão a permissão para manterem contas nessas empresas e realizarem operações com ativos virtuais e derivados conforme regulamento do poder Executivo.
“Agora ocorre uma mudança na caracterização dos criptoativos, primeiramente, do bitcoin e dos demais criptoativos como ativos financeiros. Antes o bitcoin era visto como uma commodity aqui no Brasil. E todas as criptos agora devem passar a ser enquadradas como moedas. É um ponto importante para o Brasil no que tange à evolução do mercado nacional”, diz Luiz Pedro Andrade, analista de criptoativos da Nord Research.
O texto determina ainda que, no que couber, serão aplicadas as regras do Código de Defesa do Consumidor para as operações do mercado de ativos virtuais.
Órgão regulador
Mesmo com a aprovação do projeto, ainda não se tem a definição de qual será o órgão regulador do setor no Brasil, uma vez que a indicação cabe ao Executivo. No entanto, é quase consenso entre os especialistas de que o Banco Central (BC) exerça esse papel.
De acordo com o texto, a entidade escolhida deverá estabelecer condições e prazos, não inferiores a seis meses, para a adequação às regras do projeto por parte das prestadoras de serviços de ativos virtuais que estiverem em atividade.
Entre as atribuições do órgão regulador estão:
- Autorizar o funcionamento, a transferência de controle e outras movimentações acionárias da prestadora de serviços de ativos virtuais;
- Estabelecer condições para o exercício de cargos em órgãos estatutários e contratuais em prestadora de serviços de ativos virtuais;
- Supervisionar as prestadoras;
- Cancelar, de ofício ou a pedido, as autorizações;
- Fixar as hipóteses em que as atividades serão incluídas no mercado de câmbio ou deverão se submeter à regulamentação de capitais brasileiros no exterior e capitais estrangeiros no país.
Luiz Pedro Andrade avalia que o projeto aumenta a segurança para os investidores, principalmente, os novatos no mercado. Com um órgão regulador e diretrizes, casos como o da FTX, que declarou falência, podem ser evitados e, caso ocorram, os investidores não sofrerão grandes perdas.
“Para operar como uma corretora de criptoativos no Brasil será preciso ter CNPJ e aprovação do Conar. Isso traz uma segurança maior para os investidores, principalmente, para os mais iniciantes”, disse.
“É um excelente começo para a regulamentação de criptos no Brasil. Tende a trazer mais segurança tanto para o investidor como para quem está empreendendo. Além disso, trazer essa segurança e credibilidade dá espaço para criar novos meios de investimentos e atrair investidores institucionais e do mercado tradicional para o mercado de criptoativos no Brasil”, afirmou.
Renato Opice Blum, advogado e professor de direito digital, diz que é importante que o órgão escolhido fique atento a mecanismos que protejam os investidores de colapsos de corretoras.
“É importante que haja algum tipo de seguro ou fundo garantidor de crédito e condições mínimas de capital social, dentre outras regras para trazer segurança e capacidade de ressarcimento”.
Blum também lembra da separação de patrimônio, prática onde o patrimônio do investidor é diferenciado do patrimônio da consultoria, evitando com que uma falência atinja os clientes daquela determinada empresa.
Para Andrade, a regulamentação organiza o mercado brasileiro, pois corretoras estrangeiras que atuavam no país acabavam ocupando espaço e o mercado dos agentes nacionais.
“Será possível checar se a corretora é regulada, isso é importante. E também corretoras estrangeiras que ‘usurpavam’, de certa forma, o mercado brasileiro tomando espaço de outras corretoras nacionais. Agora elas terão de se regulamentar ou sair do país”.
Penalidades
Sobre os mecanismos para punir e evitar crimes no âmbito dos criptoativos, o projeto acrescenta no Código Penal um novo tipo penal de estelionato, atribuindo reclusão de 4 a 8 anos e multa para quem organizar, gerir, ofertar ou distribuir carteiras ou intermediar operações envolvendo ativos virtuais, valores mobiliários ou quaisquer ativos financeiros com o fim de obter vantagem ilícita em prejuízo alheio.
“O projeto de lei já está rodando no mercado há sete anos. E os criptoativos sempre estavam envolvidos com lavagem de dinheiro, ocultação de patrimônio, evasão de divisas. É uma zona cinzenta, muito complicada. E agora vemos um amadurecimento do mercado financeiro”, disse Arthur Igreja.
*Com informações da Agência Câmara.