Entenda como o avanço da inflação e o aumento na Selic impactam a renda fixa
Depois de seis anos de quedas e estabilidade, o Copom anunciou nesta quarta-feira (17) um aumento na taxa básica de juros, a Selic, em 0,75 ponto
Depois de seis anos de quedas e estabilidade, o Comitê de Política Monetária do Banco Central anunciou nesta quarta-feira (17) um aumento de 0,75 ponto na taxa básica de juros (Selic).
Agora, o indicador chega aos 2,75% e começa o que analistas esperam que seja um movimento de altas sequenciais. No Boletim Focus de segunda-feira (15), inclusive, a projeção do mercado para a Selic subiu de 4% para 4,5% no final de 2021 e se manteve em 5,5% para dezembro de 2022.
Mas por que agora? A mudança na política monetária é tida como emergencial e fruto da pressão inflacionária que vem se desenvolvendo no Brasil nos últimos meses, sobretudo pela alta dos preços das commodities. Assim como a atual desvalorização do real, que deve ser atacada pela medida.
Ainda no Focus, o mercado financeiro elevou novamente as projeções para o IPCA de 2021, que mede a inflação oficial do país. A estimativa é de que a inflação deste ano fique em 4,60%, ante 3,98% esperados na semana passada. Essa foi a décima alta consecutiva na previsão para o índice, que há um mês estava em 3,62%.
“Se o câmbio estivesse mais controlado, talvez nem fosse preciso mexer na política monetária”, diz Marilia Fontes, analista de Renda Fixa e sócia-fundadora da Nord Research. “Mas com a prorrogação da pandemia e o temor com a situação fiscal do país, o BC sobe o juro para tentar esfriar a inflação e sossegar o avanço do dólar.”
Para além dos problemas internos, há também pontos de interrogação em relação aos próximos passos do mercado internacional, principalmente os EUA. Isso porque a potência norte-americana já dá fortes sinais de recuperação econômica e ainda tem US$ 1,9 trilhão em estímulos para distribuir à população.
Para Marília, o excesso de dinheiro disponível pode acarretar um sobreaquecimento da economia americana e, consequentemente, pressionar as metas de inflação e a curva longa de juros do país. Em comunicado após manter sua taxa básica entre 0% e 0,25%, o Fed, BC norte-americano, endereçou o tema.
O ritmo de altas de preços no país, segundo o Fed, deve agora superar a meta de 2% para 2021, atingindo 2,4%, antes de cair de novo em 2022. Além disso, parte dos membros do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) já admite a possibilidade de se aumentar a taxa de juros em 2022, e não em 2023.
Esse movimento impacta o Brasil? Primeiro que, com expectativa de alta na taxa de juros nos EUA, os títulos públicos de lá, os Treasuries, voltam a subir. Isso é preocupante para o mercado como um todo porque, se há rentabilidade nos ativos mais seguros do mundo, investidores tomarão menos riscos em outros papéis. Ou seja: menos gente investindo no Brasil.
Como consequência, segundo a analista da Nord, nós também precisaremos elevar a Selic ainda mais que o previsto. “Nossa taxa de juros tem sempre que pagar um prêmio em relação às economias mais fortes, que é o risco Brasil. Se a taxa dos EUA continuar subindo, não tem como a nossa não subir também”, afirma.
Como isso afeta os investimentos
A partir das variáveis expostas, o cenário atual pode trazer mudanças para a rentabilidade dos títulos de renda fixa, conhecidos por dar segurança e previsibilidade às carteiras de investimento globais.
“Não se espera que a Selic retome o patamar de 14,25%, mas o avanço dos juros pode fazer a modalidade ganhar atratividade novamente”, diz Hugo Ferraz, planejador financeiro CFP pela Planejar.
Segundo os analistas, títulos pós-fixados podem ganhar espaço na carteira dos investidores neste momento, já que remuneram o investidor de acordo com a variação da taxa Selic. Entre os papéis do Tesouro Nacional, trata-se do Tesouro Selic.
Já entre os títulos privados emitidos por bancos, como as letras financeiras (LCIs, LCAs, CDBs) é preciso procurar aqueles que sejam pós-fixados e remunerados pelo CDI, indexador que acompanha a taxa básica de juros nacional.
Ainda entre os ativos privados, Ferraz afirma que as debêntures, que são títulos de dívida emitidos por empresas para financiar investimentos, podem começar a ter níveis de rentabilidade maiores.
“Com o crédito mais caro, as empresas precisarão buscar outras formas de financiamento. É possível que, no momento atual, vejamos empresas disponibilizando títulos com taxas mais vantajosas para o investidor”, diz.
Nos títulos públicos, há ainda o Tesouro IPCA+, que paga uma taxa fixa mais a variação da inflação, e o Tesouro Prefixado, que remunera um valor pré-estabelecido. A segunda modalidade deve perder espaço, enquanto a primeira pode ser importante.
“É sempre bom ter títulos indexados à inflação, porque garante a manutenção do poder de compra no prazo da aplicação. O BC está agindo justamente para limitar o avanço do IPCA, o que tira retorno no curto prazo, mas serve de proteção”, explica Ferraz.