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    Do pioneirismo ao esquecimento: a história do Beija-Flor, 1º helicóptero do país

    Projeto iniciado pelo engenheiro alemão Henrich Focke, ex-colaborador do regime nazista, resultou no primeiro helicóptero projetado e construído no Brasil

    Thiago Vinholes, colaboração para o CNN Brasil Business

     

    Derrotada na Segunda Guerra Mundial, a Alemanha sofreu duras penas nos anos seguintes ao fim do regime nazista. O país, que havia se tornando um dos maiores construtores de aviões, foi proibido de projetar e fabricar qualquer tipo de aeronave. Com essa imposição, projetistas alemães, que naquela época eram algumas das mentes mais brilhantes do mundo, ficaram sem trabalho em sua terra natal. Mas nem todos eles permaneceram desempregados.

    Terminada a guerra, o governo dos Estados Unidos deu início à Operação Paperclip, que concedeu asilo e cidadania para mais de 1.600 técnicos alemães que eram alinhados às políticas de Adolf Hitler. Foi nessa leva que os americanos recrutaram o engenheiro Wernher von Braun, um dos maiores especialistas em foguetes (se não o mais gabaritado) nos anos 1940 e que, mais adiante, teria um papel decisivo no desenvolvimento do programa Apollo, da Nasa, que levou o homem à Lua.

    Outras nações que combateram os nazistas durante a Segunda Guerra Mundial também se aproveitaram dessa “fuga de cérebros” da Alemanha para adquirir conhecimentos tecnológicos. Até o Brasil, de forma mais modesta, recrutou engenheiros alemães que haviam colaborado com a administração autoritária de Hitler.

    O projetista alemão mais famoso recrutado pelo governo brasileiro foi Henrich Focke, um dos fundadores da fabricante Focke-Wulf, que produziu alguns dos aviões mais icônicos da Segunda Guerra Mundial. Focke também foi um dos pioneiros no desenvolvimento de helicópteros, tipo de aeronave surgida nos últimos anos da guerra e que começava a encantar o setor aéreo com sua alta versatilidade.

    Focke no Brasil

    Em 1952, convencido de que poderia executar seus projetos com apoio do Brasil, Focke fixou residência em São José dos Campos (SP), onde funcionava o recém-criado Centro Técnico de Aeronáutica (CTA), instituição hoje conhecida como Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA). Na bagagem, o engenheiro alemão trouxe uma série de projetos de aeronaves, incluindo rascunhos de helicópteros.

    Num Brasil ainda bastante arcaico, com pouquíssimos aeroportos espalhados pelo território, um helicóptero poderia assumir uma função de destaque no transporte aéreo de passageiros e cargas, podendo operar com segurança a partir de qualquer clareira ou mesmo em espaços improvisados.

    A princípio, Focke e sua equipe de técnicos alemães e brasileiros focaram os esforços no desenvolvimento de um convertiplano, um misto de avião com helicóptero. No entanto, por ser muito complexo, o projeto acabou abandonado, em 1955. Decidiu-se, então, por simplificar a fórmula do avião-helicóptero, construindo apenas o helicóptero. E assim nasceu o “Projeto Beija-Flor”, numa alusão ao pássaro que pode pairar no ar.

    Embora fosse uma obra original de Henrich Focke, ele colaborou pouco na construção do Beija-Flor, que também era chamado pela sigla “BF-1”. Focke deixou o país no mesmo ano em que o projeto do primeiro helicóptero brasileiro foi iniciado, entregando a liderança das pranchetas do CTA aos cuidados de Hans Swobada, outro engenheiro alemão recrutado pelo Brasil em 1952 –e que, mais adiante, foi um dos primeiros funcionários da Embraer, fundada em 1969.

    Sob a liderança de Swobada, os desenhos originais do Beija-Flor passaram por dezenas de modificações importantes. Porém, o CTA dispunha de mais conhecimento do que verbas para levar adiante o projeto. Sem ambições comerciais, foi determinado que o BF-1 seria construído com o objetivo de servir apenas como protótipo experimental e banco de provas voador, destinado a angariar experiência para a construção de outros helicópteros mais avançados no futuro.

    Do pioneirismo ao esquecimento

    Comparado aos helicópteros que vemos hoje em dia, o Beija-Flor tinha um design um tanto desajeitado. O motor (a pistão) foi instalado no nariz, exigindo um complexo sistema de transmissão para os rotores. Isso fez o helicóptero ficar “narigudo”. Por outro lado, ele contava com diversos recursos inovadores, que atualmente são itens triviais nesse tipo de aeronave.

    As principais inovações do Beija-Flor eram a transmissão tipo parafuso sem-fim, ausência de massa de equilíbrio dinâmico nos rotores e uso parcial do rotor traseiro para propulsão, alterando o ângulo de rotação. O primeiro protótipo do BF-1 com essas características ficou pronto em 1958 e seu voo inaugural aconteceu em fevereiro de 1960, sem a presença de Focke –que, nessa época, estava de volta à Alemanha trabalhando em outro helicóptero, o “Kolibri” (Beija-Flor, em alemão).

    Nos quatro anos seguintes ao primeiro voo do Beija-Flor, o programa de testes com o aparelho caminhou lentamente. O CTA ainda construiu mais dois protótipos do BF-1, que podia voar a velocidade máxima de 150 km/h e alcançar até 3.750 metros de altitude.

    Nesse período, houve diversos acidentes menores e modificações no desenho do Beija-Flor, que, a despeito dos percalços nos testes, se tornava cada vez mais dócil e fácil de controlar. Esses avanços estimularam as equipes do CTA a estudar mais versões do helicóptero, como o “BF-2”, um modelo para dois ocupantes para produção seriada, e o “Abelha”, com design mais sofisticado e capacidade para quatro pessoas.

    Contudo, os planos de projetar mais helicópteros em São José dos Campos foram suspensos de forma abrupta. Um grave acidente com o Beija-Flor, ocorrido em 1965, destruiu completamente o protótipo, o que forçou o CTA a encerrar o desenvolvimento de aeronaves de asas rotativas, uma tecnologia que até hoje o Brasil não domina inteiramente.

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