COVID-19 fez ações da Vaxart dispararem do dia para a noite: é normal?
Laboratório americano disparou 35% em um dia após anúncio de uma possível vacina; relembre casos de empresas brasileiras que já tiveram valorizações abruptas
Na semana passada, um laboratório pouco conhecido ganhou os holofotes dos mercados depois de suas ações subirem mais de 30% em único dia: a norte-americana Vaxart anunciou que teve os primeiros sinais de sucesso em sua pesquisa no desenvolvimento de uma vacina para o COVID-19. De acordo com a empresa, todos os animais testados com a vacina desenvolveram algum tipo de imunidade ao novo vírus.
Altas dessa magnitude, em um único dia, não são comuns no mercado financeiro. Elas acontecem com maior frequência entre empresas muito pequenas ou muito suscetíveis a especulações, que podem sofrer muitas altas e baixas bruscas ao longo da vida sem nenhuma razão aparente. É o caso de ações em crise que valem centavos ou de companhias obscuras com poucos compradores.
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Nas maiores, valorizações astronômicas do dia para a noite são bem mais raras. Quando acontecem, costumam vir no rastro de grandes anúncios com potencial para mudar o negócio de patamar. Pode ser um novo produto, como no caso da possível vacina da Vaxart, de uma descoberta do tamanho das reservas do pré-sal, da Petrobras, ou de algo completamente inovador como o iPhone (no dia em que Steve Jobs o apresentou ao mundo pela primeira vez, em janeiro de 2007, as ações da Apple subiram 8%).
Movimentos de fusões ou aquisições entre as empresas, bem como novas leis ou mudanças regulatórias, que têm o poder de mudar a dinâmica de um setor inteiro, também podem causar grandes movimentos de uma vez só no preço de uma ação.
“Em uma situação normal, o que fazemos é analisar a capacidade de geração de caixa de uma empresa nos próximos anos e trazer tudo isso a valor presente”, diz Maurício Battaglia, analista da Terra Investimentos. É essa perspectiva de quanto a empresa pode valer no futuro, explica, que define o preço que os investidores estão dispostos a pagar por ela no presente.
“As variações absurdas acontecem quando ocorre um evento que causa uma alteração abrupta e reorganiza todo o valor da empresa”, diz ele. “Se o cenário para o futuro muda, o preço também muda, e ninguém vai ficar esperando para comprar aos poucos.”
Alberto Amparo, analista da Suno Research, lembra que um outro lado desse mesmo fenômeno está recheado de especulação. Isso faz com que boa parte das altas acentuadas aconteça sem fundamentos e possa se reverter em perdas na mesma velocidade. “Muita gente compra ações com base em expectativas de curto prazo”, diz. “Mas se aquilo não se transformar em gerador de dinheiro para a empresa e para o acionista, o mercado percebe e reage.”
Veja algumas ações brasileiras que já passaram por disparadas rápidas em seus preços:
Petrobras e o pré-sal: +14%
No dia 8 de novembro de 2007, a Petrobras emitia ao mercado um comunicado informando que “concluiu a análise dos testes de formação do segundo poço na área denominada Tupi, na bacia de Santos, e estima o volume recuperável de óleo leve (…) em 5 a 8 bilhões de barris de petróleo e gás natural”.
Era o primeiro anúncio da reserva gigante e inteiramente nova do pré-sal, que viria anos depois mais do que dobrar a produção da companhia. As ações dispararam 14,2% em um único pregão, saindo de R$ 25 para R$ 28,55, e não voltariam mais os R$ 25 até agosto de 2008.
De 2008 para frente, porém, um eclipse de crise financeira global, derrocada nos preços do petróleo e escândalos de corrupção interromperiam por anos o ciclo de alta da petroleira. No fechamento da última segunda-feira (27), as ações da Petrobras valiam R$ 16,45. No início de 2020, eram comercializadas a R$ 30.
Embraer e Boeing: +22%
Foi o jornal norte-americano “The Wall Street Journal” o primeiro a noticiar, em 21 de dezembro de 2017, que a americana Boeing e a brasileira Embraer estavam em diálogo para uma possível união.
A informação chegava em um momento em que a indústria de aeronaves passava por uma consolidação global. Duas das maiores concorrentes – Airbus e Bombardier – haviam juntado uma parte de seus negócios poucos meses antes.
Foi o suficiente para um dia de euforia na bolsa brasileira: as ações da Embraer disparam 22,5% de uma vez. Saíram de R$ 16,32 para R$ 20 no mesmo pregão, e não voltariam mais para os R$ 16 até o início da crise do coronavírus, em fevereiro deste ano. O preço vinha gravitando estável em torno dos R$ 20 (entre R$ 17 e R$ 23) desde aquele fim de 2017.
Ao final de março, um dos piores meses da bolsa de valores brasileira dos últimos 20 anos, as ações da Embraer eram negociadas a R$ 9.
Nos últimos dois pregões, a novela com a Boeing chegou a um fim e ainda impôs perdas extras à brasileira na bolsa: a Boeing confirmou no sábado (25) que estava desistindo do negócio com a Embraer. Na sexta, a ação da Embraer já tinha caído 10,7% e, na segunda-feira, perdeu outros 7,5%, fechando a R$ 7,66.
Taurus e o porte de armas: +48%
A fabricante de armas gaúcha é um caso típico de ação de pequeno porte sujeita a oscilações muito bruscas, tanto para cima quanto para baixo. Com valor baixo (R$ 3,75 atualmente), qualquer ganho de centavos vira bastante coisa em porcentagem.
O fato é que seus papéis entraram para os holofotes e viram bons picos no rastro da eleição e das políticas de afrouxamento de porte de armas do presidente Jair Bolsonaro.
Nas eleições de 2018, o papel começou 1º de outubro, mês do pleito, valendo R$ 4,83. Em 22 de outubro, chegou à máxima de R$ 11, tendo subindo mais mais de 10% ou de 20% em vários dias seguidos. Caiu, entretanto, na mesma velocidade com que subiu: em 28 de outubro tombou 26%, no dia 29 perdeu mais 39% e, em 31 de outubro, já valia R$ 4,11 de novo – menos do que a cotação do início do mês.
A maior alta em único pregão aconteceu em 2 de janeiro de 2019, logo após à posse de Bolsonaro, em 1º de janeiro – o ganho foi de 48% de uma vez só, de R$ 4 para R$ 5,98 no mesmo pregão. O preço ainda avançaria ao pico de R$ 8,30 no mês. Em fevereiro, já estaria de volta à casa dos R$ 4 novamente.
Em janeiro de 2020, os papéis da Taurus eram negociados na faixa de R$ 6. No último fechamento, estavam cotados a R$ 3,75.