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    Brasil vai precisar de segundo pacote de estímulos, diz Mendonça de Barros 

    Ex-ministro também defende que BNDES está subutilizado e que juros baixos aumentam interesse de investidores e criam momento único para privatizações

    Juliana Elias, , do CNN Brasil Business, em São Paulo

    Só juros baixos e o que já foi dado até aqui pelo governo em pacotes de ajuda não serão suficiente para devolver à economia brasileira tudo o que ela terá perdido pelos impactos do coronavírus.  

    “Vai ter que vir um segundo pacote de estímulos”, defende o economista Luiz Carlos Mendonça de Barros, que foi presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e ministro das Comunicações durante o governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).  

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    “Quando a economia voltar a crescer voltamos a olhar para o controle de gastos, mas não agora. Como fazer arrocho com a economia estrebuchando?”, disse o ex-ministro em entrevista ao CNN Brasil Business.  

    Mesmo o polêmico debate acerca da possibilidade de os governos voltarem a imprimir dinheiro para financiar a recuperação não é um tabu para ele. “Não tem inflação”, afirma, para em seguida emendar “mudou a maneira de a economia trabalhar”.  

    Para o ex-chefe do BNDES, o banco público de fomento poderia estar sendo um ator bem mais ativo na recuperação econômica. “É evidente que o BNDES está subutilizado”, afirma.  

    O ex-ministro – que, à frente da pasta, coordenou as monumentais privatizações das telecomunicações em 1998 – julga também que os juros baixos criam um ambiente único para novas privatizações. “Não é só o governo querendo vender, é a iniciativa privada querendo comprar”, diz. 

    Isso acontece por um fenômeno que ele chama de “a morte do rentier”, ou “a morte do rentista”, causada pela queda vertiginosa dos juros a novas fronteiras no entorno do zero. “Quem vivia de juros agora não vai mais viver. Todo o mundo está saindo da renda fixa e procurando investimentos em ativos de empresas.”  

    A exceção às privatizações, em sua opinião, são os bancos públicos, como Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal. “Já há uma concentração bancária muito grande do setor privado”, afirma. 

    Veja a seguir os principais trechos da conversa:  

    CNN Brasil Business: Qual é a importância dos juros baixos para a recuperação econômica? 

    Mendonça de Barros: É algo extremamente importante. É esse movimento que está levando a poupança para as ações, para as empresas, para os negócios; no Brasil e no mundo. Antes era tudo renda fixa. É a morte do “rentier”. A morte do investidor que vive de juros. Está todo mundo saindo da renda fixa e procurando investimentos em ativos de empresas. Essa migração, no meio desta crise que estamos vivendo, vai permitir um estímulo muito grande para novos negócios. 

    Qual o tamanho do impacto desse fenômeno da redução dos juros e como esse dinheiro que sai do mercado financeiro chega à economia real? 

    Quem tem capital vai comprar empresa. Trata-se de uma queda contínua que já vem acontecendo há 30 anos, mas que, agora, chegou ao limite, que é zero. Os juros reais, no mundo, eram da ordem de 4% nos anos de 1990. Nos anos 2000 tinham caído para 1,7% e, agora, são zero. Nos últimos anos, chegam a ficar negativos. Tem muita gente nova, muito capital novo para entrar nas empresas, para buscar rentabilidade. 

    Em quanto tempo o Brasil retoma o nível de renda perdido com o choque da pandemia, na sua visão? 

    Meu número é o de uma queda de 5% neste ano e de uma alta de 3% no ano que vem. Só em 2022 é que o país recupera o PIB que tinha antes. E serão de quatro a cinco anos para voltar a ter crescimento, não só para recuperar o que perdeu. A recuperação cíclica da crise vai ser relativamente frágil. Mas, em um ambiente em que há muito dinheiro saindo da renda fixa para ativos de risco, ganha-se um novo ciclo de crescimento. O que vai fazer a economia crescer mais é o investimento, e o que estimula o investimento é a taxa de juros.  

    Os juros baixos por si só são suficientes para o país ter o impulso de que precisa, ou o governo deveria também entrar com mais gastos? 

    Vai ter que entrar, como está acontecendo em todo o mundo. A Europa já fez dois pacotes de ajuda. Os Estados Unidos também vão ter que fazer mais estímulos. Estão todos no mesmo barco. O quadro fiscal vai piorar antes de melhorar. No Brasil, quando a economia voltar a crescer, voltamos a olhar para o controle de gastos, para as reformas, mas não agora. Como fazer arrocho com a economia estrebuchando? 

    O governo já ampliou bastante os gastos, com programas como o auxílio emergencial de R$ 600. Esses gastos podem chegar a 10% do PIB e elevar a dívida para quase 100% do PIB. Não é o suficiente? 

    Não. Vai ter que vir um segundo pacote de estímulos. Quando a economia tem uma depressão muito forte ela fica muito fraquinha para se reerguer. Vai ter que ter um segundo estímulo, para fazer a economia voltar a crescer. Daí sim poderemos tratar da questão fiscal.   

    Se precisamos de uma segunda leva de estímulos, significa, então, ter uma dívida e um déficit ainda maiores do que já ficarão neste ano? As contas do país têm espaço para expandir ainda mais esses gastos? 

    Vai haver diminuição [do déficit]. O déficit maior neste ano vem por conta do aumento de gastos com esse primeiro pacote. Um segundo pacote já teria a contrapartida de a economia estar voltando a crescer. Daí a importância dos juros baixos: se, além desses estímulos do governo, temos o rentier buscando novos rendimentos, a coisa fica muito mais fácil.  

    Os investimentos públicos encolheram nos últimos anos, enquanto o investimento privado custa a engrenar. A queda dos juros pode ajudar a trazer esses investimentos privados de volta? 

    Sim, por essa fuga do rentista. Quem vivia de juros agora não vai mais viver. E por isso é a hora ideal também de fazer privatizações. A briga a tapa que aconteceu entre diferentes empresas para comprar o resto de ações que o BNDES tinha na AES Tietê é um exemplo disso. A disputa pela compra da Oi também; há quatro interessadas. É um sinal dessa mudança. Todos estão buscando rapidamente fazer seus investimentos agora. Nesse contexto, as privatizações também ganham uma dimensão maior. Os ativos se valorizam. Não é só o governo querendo vender, é também a iniciativa privada querendo comprar.  

    Eletrobras, Banco do Brasil e Caixa são alguns nomes que vão e vêm na lista das intenções de privatizações. O que o senhor acha da venda delas ou de partes delas? Quais estatais o senhor vê como as primeiras que deveriam ser privatizadas? 

    O saneamento é um que tem muito a melhorar e pode ganhar muito com esse movimento de fuga do rentista, é um setor que tem muitas empresas e projetos a serem negociados. Os bancos, não. Já há uma concentração bancária muito grande do setor privado. O BB e a Caixa são pelo menos um porto diferente. Mas a Petrobras, por exemplo, por que não privatizar? 

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    Como fica o papel do BNDES na recuperação e nesta reconfiguração que se busca para o Brasil, em que o tamanho do Estado é menor? 

    O papel dele é o que sempre teve, e o que não está tendo agora. É evidente que o BNDES está subutilizado, enquanto toda a direção está comprometida em reduzir o tamanho do banco. O BNDES é um dos grandes que poderia estar operacionalizando essa chegada de novos investimentos do rentier. Poderia estar fazendo isso entrando em novas aberturas de capital, vendendo a parte que tem em ações antigas e criando investimentos em parceria com o setor privado. É o que sempre fez.  

    Esse quadro de juros baixos veio para ficar?  

    Por que eles voltariam a subir se faz 30 anos que estão caindo? Eu estou convencido de que os juros baixos devem perdurar por pelo menos um horizonte de dez anos. Não tem inflação. Mesmo com esse dinheirão todo dos bancos centrais que está aí. É um dinheiro que está se acomodando. A inflação está muito baixa porque está sobrando capital, no mundo todo. Muita moeda foi emitida.  

    Mas a emissão de moeda não deve justamente gerar mais inflação? 

    Não. Isso já passou, isso é a resposta de 30 anos atrás. Mudou a maneira de a economia trabalhar, há hoje mecanismos de ajustes diferentes.  

    O senhor acha então que imprimir dinheiro, ou criar moeda de alguma maneira, poderia ser uma solução inclusive para o Brasil? 

    Tem economista por aí que vai precisar fazer uma psicoterapia para lidar com essas questões. Mas há um boom de poupança no mundo todo, na Europa, na China, e é essa abundância de dinheiro que está mantendo os juros baixos. São eles que vão gerar novos negócios e investimentos, para absorver esse fluxo enorme de poupança. 

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