Análise: Em debate, Nunes e Marçal disputam evangélicos; atacado por Tabata, Boulos mira 2º turno
Bíblia pauta boa parte do encontro da Folha/Uol, além de trocas de acusações entre os candidatos
O cantor Roberto Carlos já cantava em 1971, em Todos Estão Surdos: “Tanta gente se esqueceu que a verdade não mudou. Quando a paz foi ensinada pouca gente escutou”, tratando sobre os ensinamentos de Jesus Cristo. Em mais um debate agressivo entre candidatos à prefeitura de São Paulo realizado pelo jornal Folha de São Paulo e pelo portal Uol, nesta segunda-feira (30), falas e posicionamentos pretéritos dos candidatos foram escrutinadas pelos políticos — principalmente envolvendo religião.
A Bíblia e o cristianismo viraram tópicos centrais dos embates entre os quatro candidatos. Foram aspecto de confronto entre os candidatos Ricardo Nunes (MDB) e Pablo Marçal (PRTB), disputando voto a voto o eleitorado evangélico e matéria de manifestação longa de Tabata Amaral (PSB).
Guilherme Boulos (PSOL), por sua vez, virou alvo dos três outros candidatos — dois de olho em uma vaga no segundo turno; outro, tentando antecipar as discussões.
O critério escolhido pelo grupo Folha foi a posição no último levantamento realizado pelo Datafolha — os quatro melhor-posicionados foram convidados. Por isso, candidatos como José Luiz Datena (PSDB) e Marina Helena (Novo) não foram ao debate.
O formato diferente proposto pelo grupo envolveu a oferta de 20 minutos de falas para que os candidatos manejassem durante os quatro blocos de debate de forma livre. Os candidatos gastaram mais da metade do tempo antes do segundo bloco.
De olho nos votos evangélicos, Marçal desafiou Nunes a mostrar que conhece a Bíblia. “A Bíblia tem mais de 30 mil versículos, ele não consegue citar nem dois aqui”. Ele afirmou que o atual prefeito apenas consegue citar versículos que “seu marqueteiro escreveu”. Marçal atacou reiteradamente Nunes durante as duas horas de debate.
Nunes trouxe um salmo bíblico como resposta e acusou o candidato do PRTB. “Eu tenho minha vida dentro da Igreja”, disse. “O cara é condenado, vem falar de Polícia Federal”, disse. “Quem é o cara para se dizer cristão que tira dinheiro dos mais pobres”, atacou o prefeito.
Tabata foi acusada por Marçal de querer fugir do debate religioso por não conhecer o assunto. “Eu não fico esbravejando sobre fé porque não preciso. Minha relação com Deus é com Deus, com minha comunidade e minha igreja”, disse a deputada. “O bom cristão demonstra seus valores por seus atos, e não por suas palavras bonitas. Onde está na bíblia que cristão rouba, que cristão dá golpe?”, indagou Tabata.
Marçal afirmou que “Tabata fez o discurso cristão mais longo que já teve em debate político na última fala dela”, provocou. Ele disse que Tabata “não conhece o assunto” e chamou a Tabata de “tia do colégio”.
Tabata relembrou o episódio de Marçal tentar fazer uma mulher cadeirante a se levantar e indagou o candidato do PRTB sobre suas propostas envolvendo pessoas com deficiência. “Sou cristão e nunca vou negar uma oração a uma pessoa”, respondeu gastando poucos segundos, para economizar tempo.
Além dos aspectos religiosos, falas pretéritas dos candidatos pautaram o encontro.
Depois de ter participações discretas e ser ignorado nos últimos debates, Pablo Marçal voltou a ser agressivo contra os concorrentes e pautar o encontro por meio de reiteradas acusações e ilações contra Boulos e Nunes.
Marçal foi indagado pela jornalista Júlia Barbom sobre as acusações a Boulos envolvendo o uso de cocaina. A jornalista disse que a defesa de Marçal afirmou que o termo “aspirador de pó” se referiria a “algo que atrai lixo”, e não a uma acusação de uso de drogas. Marçal tergiversou e reiterou as acusações contra Boulos.
O candidato do PSOL se defendeu. “Ele inventou a mentira trabalhando com um homônimo”, afirmou. “Marçal trabalha com lama, com esgoto, com mentiras. Uma pessoa como essa não teria condição de ser candidato a prefeito de São Paulo”, disse, afirmando que nunca usou cocaína.
Enquanto isso, Boulos e Nunes se procuraram para os embates trazendo à tona posicionamentos pretéritos dos dois para os confrontos — tentando antecipar uma discussão de eventual segundo turno.
O prefeito mirou críticas de Boulos à classe média e posicionamentos do candidato do PSOL sobre a política de drogas. Boulos disse que existem setores que elegeram “o pior presidente da nossa história” e que têm “racismo e intolerância”. Boulos chamou Nunes e Marçal de “laranjas do Bolsonaro”, dizendo que o ex-presidente quer “botar as mãos em São Paulo”.
Em mais um embate entre Nunes e Marçal, o prefeito acusou os posicionamentos do presidente do PRTB, Leonardo Avalanche, e supostas relações com o crime organizado.
Em outra interação, Marçal voltou a trazer à tona a suposta acusação de violência doméstica contra Nunes e, por reiteradas vezes, indagou a presença de Marta Suplicy (PT), candidata à vice de Boulos, como secretária na gestão do emedebista.
“Você deu golpe em velhinhos, ainda adolescente”, disse Nunes. “Você é baixo, cara”, disse sobre as acusações de Marçal.
Tabata mirou os votos de Boulos e Marçal, os mais rejeitados, e montou em cima de uma fala machista de Marçal, acusando mulheres “inteligentes” de não votarem em Tabata Amaral. Ela trouxe um voto contrário de Boulos no Congresso Nacional em relação ao novo arcabouço fiscal, proposto pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Ele respondeu que “é possível ter responsabilidade fiscal e responsabilidade social” e evitou o embate com a deputada, dizendo que sua disputa seria com o campo bolsonarista.
Antes do início do debate, o marqueteiro de Ricardo Nunes (MDB) agredido durante o debate do canal Flow, Duda Lima, acusou o assessor Nahuel Medina, de Marçal, de ter tido sua camisa rasgada por um advogado da campanha para simular uma agressão por parte do publicitário. Ele afirmou ter imagens, além de que vai tomar as medidas legais.
Em mais um debate agressivo, os aspectos envolvendo os principais problemas de São Paulo ficaram de lado. Os candidatos preferiram o confronto. Na mesma música de Roberto Carlos, o Rei afirma: “Pouca gente se lembrou da mensagem que há na cruz” e clama por “que a covardia é surda e só ouve o que convém”. Talvez ele tenha razão e que seja necessário dizer tudo de novo. Todos estão surdos.
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