Análise: Candidatos em SP baixam o tom e Marçal muda postura em debate sem baixaria
Boa parte do encontro foi marcada por dobradinhas e “levantadas de bola” entre os candidatos — e por uma disposição maior em apresentar propostas


Depois de tomarem traulitadas da opinião pública pelo nível dos debates travados durante a campanha eleitoral, os candidatos à prefeitura de São Paulo mudaram o tom e procuraram fazer um confronto de ideias, diga-se, mais comum no debate promovido pelo SBT em parceria com o portal Terra e a rádio Nova Brasil.
Participaram Ricardo Nunes (MDB), Guilherme Boulos (PSOL), Pablo Marçal (PRTB), Tabata Amaral (PSB), José Luiz Datena (PSDB) e Marina Helena (Novo).
Boa parte do debate foi marcada por dobradinhas e “levantadas de bola” entre os candidatos — e por uma disposição maior dos seis em apresentar propostas. Os candidatos escolheram a estratégia de focar em São Paulo — com alfinetadas e acusações, claro, mas em nível claramente de menor agressividade nas interações. Os seis procuraram fugir de cascas de banana e provocações, evitando aumentar a temperatura do debate.
Já no início do debate, antes mesmo de apresentar os candidatos, o jornalista César Filho pediu uma “discussão civilizada em torno de propostas” aos políticos.
“O desrespeito às regras do debate não será tolerado”, afirmou, em longa exposição. E alertou: “Escolham o candidato pelo nome de campanha, não por apelidos.”
Entre as interações, a vocação pela manutenção de um debate mais civilizado foi inclusive externada por candidatos, como Nunes e Marçal.
Ricardo Nunes focalizou sua munição contra Guilherme Boulos, antecipando um eventual confronto de segundo turno entre os dois, como desenham as mais recentes pesquisas. Ele criticou Marçal pelo “nível do debate” e elevou sua parceria com o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) por mais de uma vez.
De olho nos votos à direita, Nunes disse ter sido recebido pelo Papa Francisco e agradeceu a Deus no início do debate. Voltou à carga com sua estratégia de apresentar números de sua gestão e disse ter errado ao implementar o chamado “passaporte da vacina”, mas disse que transformou São Paulo na “capital mundial da vacina” contra a Covid-19.
Segundo o Índice CNN, que agrega os resultados de pesquisas eleitorais, Nunes tem 25% das intenções de voto ante 24% de Boulos — Marçal aparece com 21%.
Boulos, por sua vez, repetiu a estratégia de outros debates e também preferiu atacar o atual prefeito e poupar Pablo Marçal — mas por motivos diferentes.
Segundo o último Datafolha, Boulos perderia para Nunes em um eventual cenário de segundo turno, mas venceria Marçal e ampliou a liderança contra o empresário.
Segundo a pesquisa, o atual prefeito venceria o psolista por 52% a 37%. Boulos, por sua vez, venceria Marçal por 50% a 36% em um cenário de segundo turno entre os dois. Boulos disse que “São Paulo nunca esteve tão insegura”, falou de políticas de aprimoramento da iluminação pública e disse que planeja dobrar o efetivo da Guarda Civil Metropolitana. Ele disse estar claro a diferenciação entre candidatos que querem tumultuar e “quem quer apresentar propostas”.
Depois de ver sua rejeição disparar, Marçal adotou tom mais ameno e se mostrou disposto a falar sobre suas propostas. Ele voltou, sim, a levantar supostas acusações contra Nunes, mas por reiteradas vezes disse que queria “manter o nível do debate”. Levantou suas propostas sobre implementar educação financeira nas escolas, ensinar empresarização e fazer “um cinturão empresarial” nas periferias.
“Já mostrei meu pior lado durante os debates. A partir de agora você vai ver alguém com uma postura de governante”, afirmou Marçal numa interação com Tabata Amaral. Com exceção da deputada, os candidatos preferiram ignorar Marçal.
A candidata do PSB foi incisiva durante o debate e procurou reforçar as acusações contra Marçal e o atual prefeito. Tabata disse “estranhar” a postura de “amiguinhos” entre seus adversários. Ela reforçou sua estratégia de focalizar suas críticas em Pablo Marçal; chamou o ex-coach de “jogo do Tigrinho” e trouxe acusações passadas envolvendo Marçal. O empresário não caiu nas provocações e evitou criticar Tabata.
Ela fez questão de tentar atrair o eleitor “que está quase votando” nela, se apresentando como preparada e apostando na baixa rejeição.
Com a campanha revigorada pós-cadeirada e depois de um perceptível banho de treinamento para os debates, Datena estava mais propositivo do que nos primeiros encontros. Fez dobradinhas com Tabata para tratar sobre problemas da atual gestão e trouxe propostas mais concretas do que nos últimos debates — a maioria, sim, voltada à segurança pública, sua principal bandeira desde o início da campanha.
Datena reiterou que queria manter “o nível do debate até o fim” e sua intenção de combater o crime organizado.
Marina Helena reforçou sua estratégia de se aproximar de pautas caras ao bolsonarismo. Disse que sua primeira proposta para o transporte público era “não votar na esquerda”, trouxe ao debate financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, o BNDES, em países como Cuba e Venezuela — e voltou a atacar o Judiciário, que, segundo ela, serve para “soltar bandido”.
Moroso e entediante, o debate do SBT esteve mais próximo de um encontro civilizado entre os seis candidatos mais bem posicionados de acordo com as pesquisas. Os seis preferiram seguir uma cartilha ordinária e tratar sobre corriqueiras questões da maior e mais rica capital do país. Com números apresentados e um certo nível de civilidade nas interações, o debate foi chato. E ainda bem.