Galípolo se afasta da polarização, se apresenta como técnico e exalta liberdade
Próximo presidente do Banco Central admite incômodo com inflação desancorada e relata frustração pública com ausência de embates com Roberto Campos Neto
Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como próximo presidente do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo fez um discurso lotado de recados sobre sua futura gestão à frente da autoridade monetária do país durante a sabatina na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) no Senado, nesta terça-feira (8).
Nos últimos meses, mesmo antes de ser indicado formalmente por Lula, Galípolo realizou um périplo pelos gabinetes do Senado — e foi bem-sucedido na busca por votos. Ele buscou afastar as discussões políticas sobre a política monetária do país e reafirmou compromisso de buscar a meta de inflação — atribuição básica do presidente da autarquia.
Ele fez questão de elevar a autonomia garantida pelo Poder Executivo em relação à gestão da taxa básica de juros, a Selic.
“Toda vez que me foi concedida a oportunidade de encontrar o presidente Lula, eu escutei de forma enfática e clara a garantia da liberdade de tomada de decisões”, afirmou.
“Eu sinto que eu gerei uma grande frustração que, ao entrar no Banco Central, ia começar um grande reality show, com grandes disputas e brigas ali dentro”, disse.
“Minha relação com os presidentes, Lula e Roberto Campos, é a melhor possível. Não consigo fazer qualquer queixa sobre qualquer um deles”, afirmou Galípolo.
Ele afirmou que gostaria de ter colaborado para que as relações entre Banco Central e o executivo fossem aplainadas.
Enquanto diretor de Política Monetária do Banco Central, nas últimas reuniões, ele seguiu a mesma linha de Roberto Campos Neto e votou pelo aumento da Selic.
A taxa básica de juros está em 10,75%, patamar considerado elevado pelo presidente Lula.
Os senadores fizeram perguntas incisivas.
Ele foi indagado pelo senador Izalci Lucas (PL-MG) sobre pressões do Poder Executivo, as críticas de Lula a Roberto Campos Neto a e seu posicionamento sobre a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que prevê a autonomia financeira do Banco Central.
Posteriormente, ele foi indagado sobre sua futura atuação junto ao Conselho Monetário Nacional (CMN), sobre como manter sua autonomia em meio às pressões, e sobre as políticas engendradas em conjunto com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad — a quem anteriormente se referiu como “amigo”.
Ele também foi indagado sobre a correlação entre a política fiscal do governo e a pressão inflacionária.
Galípolo afirmou que as projeções de crescimento econômico deste ano surpreendem para cima. “Existe uma correlação entre a política fiscal e a atividade econômica”, disse ele. Ele elencou também políticas de distribuição de renda para o impacto inflacionário, classificou as alterações no câmbio por questões “internas e externas”.
Ele admitiu que a desancoragem da inflação “incomoda” e que os indicadores “recomendam maior prudência” envolvendo a política monetária. Segundo ele, o papel do Banco Central não envolve fazer uma análise sobre a questão fiscal e seus impactos, mas reafirmar a busca pela inflação na meta.
A senadora Tereza Cristina (PP-MS) perguntou sobre a posição de Galípolo sobre a posição do futuro presidente da autarquia sobre a autonomia do Banco Central, aprovada durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro — de quem Tereza Cristina foi ministra. “Espero que o senhor possa ser hoje aprovado por essa Casa”, disse ela.
Galípolo afirmou que o conceito de autonomia precisa ser revisto e foi tomado pela polarização. “As metas estabelecidas para o Banco Central são feitas pela gestão democraticamente eleita”, afirmou. “Se trata de respeitar a meta estabelecida, colocando a taxa de juros em patamar restritivo o suficiente para atingi-la.”
Ele elencou a preocupação com “avanços em ritmo mais lento e trajetória menos linear do que o esperado”.
“Prefiro sempre dores do processo democrático do que as falsas promessas de atalho”, disse Galípolo. “Já foi dito que o banqueiro central deve ser o último dos otimistas e o primeiro dos pessimistas. O Brasil tem a oportunidade de se apresentar como destino sólido para investimentos”, afirmou o futuro presidente do Banco Central.