França vê “relançamento” de relações com Lula após “eclipse” com Bolsonaro
Governo francês cita "congelamento" das relações na gestão do ex-presidente e e fala em "momento brasileiro" às vésperas da viagem de Macron ao Brasil
Fontes do Palácio do Eliseu afirmam que a relação entre França e Brasil está passando por um “relançamento” na gestão do presidente Lula, depois de um “eclipse de quatro anos” e um “quase congelamento” durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro.
A uma semana da viagem de Emmanuel Macron ao Brasil, interlocutores do governo francês afirmam que a França está vivendo “verdadeiramente um momento brasileiro” porque o presidente francês visitará o Brasil “diversas vezes nos próximos anos”. “E esse momento brasileiro chega depois de um eclipse de quatro anos e quase congelamento das relações políticas entre os nossos países durante a presidência de Bolsonaro”, afirmam as fontes do Eliseu.
As relações na gestão anterior estremeceram depois que o ex-presidente ofendeu a esposa de Macron, Brigitte, dizendo que ela era feia em um post nas redes sociais.
Além da viagem entre os dias 26 e 28 de março – que inclui passagens por Belém, Itaguaí, São Paulo e Brasília – Macron retornará ao Brasil em novembro deste ano para participar da cúpula do G20 e em novembro de 2025 para a COP 30, em Belém. “A isso se somam os contatos entre os dois presidentes durante as cimeiras internacionais”, dizem os interlocutores.
Há uma expectativa de que os líderes se encontrem também em Paris, em julho, durante a Olimpíada. Fontes do governo brasileiro afirmam que Lula pode participar de uma cúpula de chefes de governo e de Estado organizada à margem dos jogos olímpicos, que deve acontecer no dia 27 de julho, um dia após a abertura do evento. O convite oficial para a cimeira, porém, ainda não foi enviado.
“Nós estamos verdadeiramente em um relançamento da relação bilateral e da parceria estratégica com o Brasil, que o próprio presidente Lula lançou durante seus dois primeiros mandatos”, afirma o Eliseu.
Esta é a primeira viagem oficial de um presidente francês ao Brasil depois de dez anos, desde quando François Hollande visitou o país em 2013, na gestão de Dilma Rousseff.
Amazônia em foco
O governo francês também destaca que houve avanços com Lula no combate ao desmatamento na Amazônia, ainda que no Cerrado a situação desperte preocupações. A floresta deve ser um dos focos da viagem, sobretudo com a visita de Macron à bacia amazônica em Belém, que será o ponto de partida da viagem.
“Nós observamos progressos substanciais no tema do desmatamento, que se traduzem em uma redução enorme dos alertas de desmatamento na Amazônia, ainda que a situação no Cerrado seja mais complexa”, afirmam as fontes do Eliseu.
“A questão é como o presidente Lula pode limitar o desmatamento em seu país e, ao mesmo tempo, evitar alimentar o populismo que poderia levar à eleição de um novo Bolsonaro depois dele”, prosseguem.
Os franceses afirmam ainda que concordam com a visão de Lula de que a proteção ao meio ambiente deve caminhar junto à redução da desigualdade.
Dez acordos previstos, mas sem Mercosul e União Europeia
Fontes do governo brasileiro já haviam antecipado à CNN que pelo menos dez acordos bilaterais devem ser firmados durante a viagem, em áreas como: gestão pública; meio ambiente; cooperação transfronteiriça, para tratar da segurança na fronteira com a Guiana Francesa; direitos humanos; saúde; e reformas de governança global – a França apoia o pleito do Brasil por um assento no Conselho de Segurança da ONU.
O governo francês confirma que há intenção de fechar parcerias e cita como pontos focais a bioeconomia, as questões da biodiversidade e as grandes questões da transição ecológica.
Porém, o principal acordo de interesse dos brasileiros, entre Mercosul e União Europeia, deve ser o grande tabu da viagem, conforme a CNN também havia antecipado.
Interlocutores franceses afirmam que o tema é de competência do bloco europeu e não deve ser tratado em visitas bilaterais. Esse será o discurso diplomático usado por Macron para não falar sobre o assunto, que é uma das principais discordâncias entre os dois líderes – além da guerra na Ucrânia.
Fontes do Eliseu ressaltam que Macron já deixou clara sua posição, inclusive na Feira Agrícola de Paris. Na ocasião, o presidente francês foi vaiado por agricultores que demandam mais proteção do governo ao setor e rejeitam acordos comerciais, citando especificamente o acordo entre Mercosul e União Europeia. “Nós emitimos solicitações complementares no que diz respeito ao acordo, especialmente nas questões de reciprocidade de normas”, acrescentam.
Em entrevista exclusiva à CNN, Macron já havia informado que não apoia o acordo entre Mercosul e UE da maneira como ele está colocado e condicionou o avanço das negociações à inclusão de cláusulas-espelho, mecanismo que prevê que produtos entrem na União Europeia apenas se seguirem as condições impostas internamente no bloco.