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    Lourival Sant'Anna
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    Lourival Sant'Anna

    Analista de Internacional. Fez reportagens em 80 países, incluindo 15 coberturas de conflitos armados, ao longo de mais de 30 anos de carreira. É mestre em jornalismo pela USP e autor de 4 livros

    Resposta de Netanyahu ao ataque do Irã depende de a quais pressões ele prefere ceder

    Se quiser manter o apoio de sua “coalizão”, premiê israelense precisa atender a pedidos dos países aliados

    O ataque do Irã contra Israel no sábado deu ao primeiro-ministro Benjamin Netanyahu um leque de opções de resposta. Com ao menos 320 projéteis, foi uma ação robusta do ponto de vista quantitativo, porém desenhada para causar o menor dano.

    A resposta de Netanyahu agora depende de a quais pressões ele prefere ceder.

    O gabinete do primeiro-ministro e a coalizão que o sustenta no poder incluem elementos radicais em posições-chave, como os ministros das Finanças, Bezalel Smotrich, e da Segurança Nacional, Itamar Ben Gvir.

    Líderes dos colonos judeus na Cisjordânia, eles defendem a expulsão de todos os palestinos dos territórios ocupados e, agora, um ataque tão contundente a ponto de derrubar a teocracia iraniana.

    De outro lado, Israel recuperou a solidariedade de seus parceiros internacionais com o bombardeio iraniano. A barragem de drones e mísseis levou a uma declaração unânime de solidariedade do G-7 e mobilizou Estados Unidos, Reino Unido, França, Arábia Saudita e Jordânia na intercepção dos projéteis.

    Figuras importantes como o ministro da Defesa, Yoav Gallant, e o presidente Isaac Herzog ressaltaram, em entrevistas à CNN, o surgimento de uma “coalizão internacional” em favor de Israel.

    O governo Netanyahu estava isolado antes, distanciado até mesmo de seu mais importante aliado, os Estados Unidos, por causa da campanha de violência indiscriminada na Faixa de Gaza.

    Na psiquê israelense, o sentimento de isolamento, de que ninguém se importa com o sofrimento dos judeus, é muito forte, pelo trauma do Holocausto, quando o mundo assistiu, quase indiferente, ao extermínio desse povo. A sensação inversa, de apoio internacional, é proporcionalmente valiosa.

    Sistema antimíssil em Israel após ataque iraniano / Amir Cohen/Reuters (14.abr.24)

    Na conversa com Netanyahu na noite de sábado, o presidente americano, Joe Biden, transmitiu quatro recados: os EUA apoiam de forma inabalável a defesa de Israel, mas não participarão de ações ofensivas, querem a desescalada do conflito e que a população civil na Faixa de Gaza seja poupada.

    Ou seja, continuam se opondo a uma ofensiva terrestre em Rafah, onde se concentram 1,4 milhão de pessoas, e pressionando Israel para que permita a entrada de ajuda humanitária em todo o enclave.

    Essa é a posição dos outros parceiros que vieram no socorro de Israel. Se quiser manter essa “coalizão”, Netanyahu precisa atender a esses pedidos.

    Segundo Israel, o Irã disparou 170 drones, 120 mísseis balísticos e 30 mísseis de cruzeiro contra o país. Desses, 99% foram interceptados. Israel tem a melhor defesa antiaérea do mundo. Mas, se o Irã quisesse, poderia ter sobrecarregado o sistema, fazendo todos os projéteis chegar ao mesmo tempo.

    Eles superariam o tempo necessário para os interceptadores recarregarem, e uma parte atingiria os alvos.

    Para isso, as forças iranianas teriam que temporizar os disparos com base no seguinte cálculo: os drones levam 9 horas para percorrer os cerca de 1.500 km entre os dois países; os mísseis de cruzeiro, que têm propulsão própria, demoram 2 horas; e os mísseis balísticos, os mais potentes, levam 12 minutos.

    Em vez disso, os disparos dos drones foram antecipados, para colocar a defesa antiaérea israelense, saudita e jordaniana, em máximo alerta, mas não um intervalo suficiente para chegarem ao mesmo tempo que os mísseis.

    Os balísticos chegaram primeiro, depois os de cruzeiro, e finalmente os drones. Essa sequência possibilitou aos aliados e ao próprio Israel interceptar praticamente todos os projéteis.

    Foi, portanto, uma ação desenhada para elevar a deterrência, ou seja, para mostrar aos inimigos o poder de fogo do Irã, e não para causar o máximo dano ao inimigo. A necessidade de mostrar o preço que os inimigos podem pagar por continuar atacando o Irã vem sendo sentida pelo regime pelo menos desde 2020.

    Gabinete de guerra de Israel
    Gabinete de guerra de Israel reunido após ataque do Irã / Ariel Hermoni/Ministério da Defesa de Israel

    Em janeiro daquele ano, um ataque por drone americano em Bagdá matou Qassem Soleimani, o popular general que comandava o Corpo da Guarda Revolucionária Iraniana.

    O país respondeu com um ataque telegrafado, de 15 mísseis balísticos, contra a base aérea americana de Ayn al-Asad e o aeroporto de Irbil, no Curdistão iraquiano, norte do país. Ninguém morreu, embora tenha havido diagnósticos de concussões e outros traumas cerebrais em militares americanos resultantes do impacto dos mísseis.

    Em novembro do mesmo ano, o chefe do programa militar nuclear iraniano, Mohsen Fakhrizadeh, foi assassinado em Teerã, numa operação com as digitais do Mossad, o serviço secreto israelense.

    No dia 1º de abril, Israel bombardeou o complexo diplomático iraniano em Damasco, matando sete integrantes da Guarda Revolucionária, incluindo o general Mohammad Reza Zahedi, que fazia a ligação na Síria entre a força armada e a milícia xiita libanesa Hezbollah, patrocinada pelo Irã.

    Equipes de emergência e segurança inspecionam o local de um ataque que atingiu um prédio anexo à embaixada iraniana na capital da Síria, Damasco, em 1º de abril / Ammar Ghali/Anadolu/Getty Images

    A resposta demorou duas semanas. O arsenal iraniano inclui 3 mil mísseis balísticos. O ataque envolveu 120, ou 8 vezes mais mísseis do que a retaliação de 2020. Mas o Irã poderia tranquilamente disparar o dobro de mísseis balísticos sem degradar seu arsenal.

    A mídia oficial conta para a população iraniana que o ataque foi um sucesso, atingindo objetivos militares em Israel. Algo pode ter sido realmente atingido.

    A menina beduína de sete anos gravemente ferida mora em um vilarejo perto da base aérea de Nevatim, no Deserto do Negev, de onde partiu o caça F-35 que bombardeou a instalação iraniana em Damasco.

    Mas os danos poderiam ter sido muito maiores, se o Irã quisesse. Agora, Netanyahu tem opções semelhantes. Pode autorizar um ataque quantitativamente robusto ou qualitativamente cirúrgico, que demonstre a capacidade de resposta israelense, mas não avassalador a ponto de provocar uma escalada.

    Tudo depende de seu cálculo político. A coalizão de governo tem maioria de apenas 4 cadeiras, em um Parlamento de 120. O Partido Sionista Religioso, de Smotrich, conta com 7 deputados; o Poder Judaico, de Ben Gvir, tem 6. Mais que suficiente para derrubar o governo.

    Mas, se eles provocarem a convocação de eleições, todo o bloco sofrerá, e acabará na oposição, segundo as pesquisas. Esse pode ser o trunfo de Netanyahu.

    Neste momento inicial, os sinais são de moderação. As Forças de Defesa de Israel (FDI) têm prontos, há anos, planos de ataque ao Irã. Não é por falta deles que o governo não decidiu ainda o que fazer, mas porque as vozes da razão podem estar sendo ouvidas.

    Além disso, Israel abriu uma entrada para ajuda humanitária no norte da Faixa de Gaza, e nessa segunda-feira as FDI anunciaram que não está pronto o plano tático de ofensiva de Rafah. São sinais de que não agirão com a cabeça quente.