Qual é o peso dos apoios de presidente e governador na disputa pela Prefeitura de São Paulo?
Nunca houve dois líderes políticos capazes de mobilizar candidaturas e apoiadores de forma simultânea como Lula e Bolsonaro


Não é exagero dizer que as eleições municipais deste ano são cercadas de uma expectativa sem precedentes desde a redemocratização.
Nunca houve dois líderes políticos capazes de mobilizar candidaturas e apoiadores de forma simultânea como Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), ainda que outros fatores sejam capazes de influenciar o resultado das urnas em outubro, como o valor recorde de recursos enviados às bases eleitorais de deputados e senadores por meio das emendas parlamentares.
Quando se olha especificamente para São Paulo, porém, a história traz novos aspectos a serem considerados.
Quem sugere o exercício é uma das maiores autoridades em análise de eleições municipais, o cientista político Antonio Lavareda, com quem divido a apresentação do Índice CNN, um agregador de pesquisas desenvolvido pelo Ipespe Analítica que permitirá um olhar detalhado da corrida pelas 100 maiores cidades do país.
Lavareda aponta que metade dos 10 prefeitos eleitos na Nova República (de 1985 para cá) venceu sem apoio nem do presidente, nem do governador da época.
Foi o caso de Jânio Quadros (1985) e Luiza Erundina (1988), quando a decisão era em turno único, e depois de Paulo Maluf (1992), Celso Pitta (1996) e Marta Suplicy (2000) – esta última, no segundo turno, teve apoio do então governador Mario Covas, numa época em que tucanos e petistas se permitiam caminhar juntos em oposição ao malufismo na cidade.

De lá para cá, porém, prevaleceram os candidatos que contaram com o apoio do Palácio dos Bandeirantes, sempre sob gestões do PSDB: José Serra (2004), Gilberto Kassab (2008), João Doria (2016) e Bruno Covas (2020).
A exceção que quebrou a sequência dessa lista foi Fernando Haddad (2012), aliado de Dilma Rousseff (PT), mas não (na época) de Geraldo Alckmin (hoje no PSB).
Vale esmiuçar o comportamento do eleitorado ao longo de quase quatro décadas de disputas paulistanas e reforçar uma máxima da análise e da estatística: correlação não é causalidade.
O pêndulo do humor paulistano
Quando Marta se elegeu em 2000, havia um forte sentimento antimalufista na cidade, consequência de investigações como a máfia dos fiscais, um esquema de cobrança de propina por servidores municipais de empresários e comerciantes em benefício de vereadores da base do então prefeito Celso Pitta.
Em 2004 e 2008, com a rejeição em alta do governo Lula e da própria ex-prefeita, o Palácio dos Bandeirantes se torna preponderante – basta lembrar que o então governador Serra (PSDB), em 2008, apoia Kassab (então no DEM) e sai bem-sucedido na empreitada.
Quatro anos depois, o desgaste de ambos ajuda Haddad, impulsionado tanto por Dilma quanto por Lula, a chegar ao Edifício Matarazzo, sede do Executivo paulistano.
O discurso à direita, em que o conservadorismo assume protagonismo no debate eleitoral, só volta a prevalecer na cidade a partir de 2016, quando Doria vence Haddad com bandeiras que mesclam o histórico tucano a pautas conservadoras e a um forte discurso antipetista – a votação ocorre menos de dois meses após a conclusão do impeachment de Dilma.
Dois anos depois, a prevalência de Bolsonaro entre os paulistanos chega ao ápice desse comportamento eleitoral.
Na eleição da pandemia, em 2020, Bruno Covas (PSDB) é reeleito ao vencer Guilherme Boulos (PSOL), numa disputa em que ambos eram críticos ao comportamento do então presidente frente à Covid-19.

As vitórias desses prefeitos – e derrotas dos demais candidatos – não ocorreram obrigatoriamente por causa dos apoios, e sim dentro de um conjunto de fatores entre os quais se incluem essas alianças políticas, assim como as rejeições aos líderes desses grupos.
Tamanha rejeição não se restringiu àquele ano e avançou em 2022, quando Lula voltou a ser o mais votado entre os paulistanos após 20 anos.
À exceção de 2016, quando o resultado se decidiu em turno único, sempre houve uma disputa final entre o nome apoiado pelo presidente e o aliado do governador.
Esse cenário tende a se repetir em 2024, com Boulos aliado de Lula e o atual prefeito, Ricardo Nunes (MDB), respaldado por Tarcísio de Freitas (Republicanos) – a não ser que Tabata Amaral (PSB) e o apoio do vice-presidente Alckmin superem um deles e demonstrem uma força que, por ora, nenhuma pesquisa consegue antecipar.
Além de uma disputa polarizada entre Lula e Bolsonaro, ou entre o presidente e o governador, a eleição em São Paulo servirá como um termômetro do humor do paulistano com as lideranças políticas: apoios têm peso relevante e são bem-vindos, desde que não sejam superados pela rejeição que, como a história demonstra, costuma balançar o pêndulo do maior eleitorado do país.