História mostra que protestos em universidades americanas podem prejudicar Biden
Manifestações contra a guerra em Gaza são muito similares a atos contra o conflito do Vietnã, que ajudaram a levar os democratas à derrota nas eleições de 1968
A repressão aos protestos nas universidades americanas contra a guerra em Gaza pode prejudicar muito a campanha do presidente Joe Biden pela reeleição.
E há um precedente histórico que mostra claramente os riscos.
Milhares de estudantes, que estão mobilizados nos campi de algumas das maiores instituições de ensino do país, pedem o fim imediato da guerra, querem que suas universidades deixem de ter relacionamentos com empresas que fabricam armas e, acima de tudo, culpam diretamente o presidente pelo elevadíssimo número de civis mortos na Faixa de Gaza.
Eles acreditam que Biden deu sinal verde para as ações do governo israelense no território palestino, que já deixaram mais de 34 mil pessoas mortas –em sua maioria mulheres e crianças, segundo o Ministério da Saúde de Gaza que é controlado pelo Hamas.
Tanto que só chamam o presidente de “Genocide Joe” (“Joe, o genocida”, numa tradução livre).
O líder americano, por seu lado, diz que está determinado a promover a paz e tem pressionado o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu a adotar um cessar fogo.
Nos últimos dias, no entanto, os protestos voltaram a ganhar força depois que a reitora da Universidade de Columbia, em Nova York, Minouche Shafik, pediu a intervenção da polícia para retirar os manifestantes do campus.
Shafik alegou que precisava manter a segurança da instituição e se disse preocupada com atos antissemitas que teriam sido praticados durante os protestos.
Obviamente, qualquer ato antissemita é um crime e não pode ser menosprezado de nenhum maneira. É preciso que esses crimes sejam investigados e punidos rigorosamente. Assim como casos de islamofobia, racismo e qualquer tipo de preconceito.
Mas uma boa parte dos estudantes não praticou qualquer ato de racismo ou discriminação. A grande maioria está apenas protestando pacificamente pelo fim de um conflito sangrento –e num país que se orgulha, corretamente, de ser uma das grandes democracias do mundo.
Os policiais invadiram a universidade e centenas de estudantes foram presos, num ato que lembrou muito os protestos contra a Guerra do Vietnã ocorridos no mesmo campus da Universidade de Columbia em 1968.
Lições dos protestos de 1968
Há 56 anos, a polícia agiu de uma forma muito violenta, deixando muitos feridos –e provocando indignação entre boa parte da sociedade americana.
Muitos americanos, na época, já estavam cansados da guerra no sudeste asiático –e eram muito críticos da forma como o então presidente, o democrata Lyndon Johnson, lidava com o conflito.
O risco, para Biden, é que o mesmo tipo de indignação ganhe força.
Com um agravante: a eleição deste ano será decidida por margens muito pequenas, e em um punhado de estados pêndulo. Ou seja: qualquer voto perdido nesses estados pode definir o resultado das eleições.
A indignação ainda não tem as proporções de 1968, é evidente. E nem tudo é similar. A polícia, desta vez, por exemplo, foi muito mais comedida.
Mas os estudantes retornaram no dia seguinte ao campus e prometeram continuar protestando até o fim da guerra. A disputa nas universidades, em outras palavras, vai continuar.
E os estudantes começam a receber apoio de vários grupos de eleitores ligados aos democratas. Tanto que o presidente tem enfrentado manifestações pró-Palestina em praticamente todos os eventos públicos que participa.
Assim como em 1968, a Casa Branca parece esperar que a situação nas universidades se resolva com a chegada das férias de verão no hemisfério norte, que esvaziarão os campi.
Mas isso pode ser um grave erro, e mais um repeteco do que aconteceu em 1968.
Em férias, os estudantes de 56 anos atrás resolveram marcar um grande protesto para o mês de agosto, durante a Convenção Nacional do Partido Democrata, que aconteceu em Chicago.
Por uma armadilha do destino, a convenção do partido este ano também vai acontecer em agosto. E também em Chicago.
Como há 56 anos, os líderes estudantis americanos dizem que vão organizar um grande protesto, mesmo que não tenham permissão da polícia para tanto.
Em 1968, o protesto foi muito grande e a polícia bateu em centenas de estudantes.
A indignação que se seguiu ajudou muito o então candidato republicano Richard Nixon a derrotar o democrata Hubert Humphrey, então vice de Johnson.
Biden faria bem em prestar atenção aos ensinamentos da história.