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    Américo Martins
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    Américo Martins

    Especialista em jornalismo internacional e fascinado pelo mundo desde sempre, foi diretor da BBC de Londres e VP de Conteúdo da CNN; já visitou 68 países

    Análise: o que muda na União Europeia com o avanço da extrema direita

    Políticas relacionadas à imigração, combate às mudanças climáticas, apoio à Ucrânia e a própria integração do continente poderão ser revistas

    O avanço da extrema direita nas eleições para o Parlamento Europeu vai quase certamente levar à revisão de algumas políticas centrais da União Europeia.

    Partidos ultranacionalistas e conservadores tiveram grande desempenho nos três mais importantes e poderosos países do bloco: Alemanha, França e Itália.

    Na Alemanha, o país de maior população e maior economia do continente, o Alternativa para a Alemanha (AfD), partido de origem neonazista, conseguiu ficar em segundo lugar na disputa, à frente do Partido Social Democrata, do chanceler Olaf Scholz.

    Na França, o União Nacional, de Marine Le Pen, teve mais que o dobro de votos do partido Renascimento, do presidente Emmanuel Macron. A vitória foi tão importante que forçou Macron a dissolver a Assembleia Nacional e convocar eleições parlamentares –o que poderá levar Le Pen a outro grande triunfo, ampliando sua bancada no Parlamento francês.

    Na Itália, o partido Fratelli D’Italia (Irmãos da Itália), da premiê ultraconservadora Giorgia Meloni, também venceu as eleições, deixando os oposicionistas para trás.

    Mesmo associadas, essas legendas não terão maioria no Parlamento.

    Mas os eleitores das três potências deram uma clara mensagem que não pode ser simplesmente ignorada. Isso vai forçar os líderes europeus, em Bruxelas, a repensar várias de suas posições.

    Políticas de imigração

    A imigração será certamente uma das áreas afetadas pela guinada direitista no continente.

    Uma posição comum de todos esses partidos ultraconservadores é culpar os imigrantes por grandes males da Europa. Em alguns casos, declarações de políticos dessas legendas são claramente xenofóbicas.

    A Europa, de fato, enfrenta um grande e desordenado influxo de imigrantes –o que ajuda o discurso ultranacionalista, contrário, em especial, a imigrantes da África e muçulmanos.

    Bruxelas terá que rever suas políticas e adotar medidas mais duras para tentar organizar melhor o problema, o que ajudaria a reduzir o apelo da mensagem ultraconservadora na área.

    Entre outras coisas, os países europeus precisam coordenar melhor suas ações para conter o fluxo ilegal de imigrantes e combater traficantes que são responsáveis pela perigosa travessia do Mediterrâneo em barcos superlotados, que muitas vezes levam a tragédias.

    Mudanças climáticas

    O combate ao aquecimento global será outro setor quase certamente afetado.

    A União Europeia, até aqui confortavelmente governada por uma coalizão de políticos de centro-direita e centro-esquerda, adotou algumas das políticas mais modernas e ambiciosas de combate às mudanças climáticas.

    Mas a defesa de uma matriz energética mais limpa, sanções contra importações de países que desmatam suas florestas e as duras regras para o uso da terra e dos recursos naturais pelos agricultores têm um alto custo –político e econômico.

    A extrema direita também se posiciona frequentemente contra essas políticas, afirmando que os europeus pagam um custo muito alto, inclusive com aumento da inflação, por estarem na dianteira desse debate –enquanto outros países e blocos concorrentes adiam medidas parecidas.

    Isso sem falar que parte dos políticos ultraconservadores europeus são negacionistas climáticos.

    A União Europeia provavelmente terá que considerar mais medidas compensatórias para agricultores, por exemplo. Mais uma vez, isso ajudaria a diminuir o impacto das mensagens ultraconservadoras.

    Ucrânia e integração

    Por fim, outras duas áreas também poderão ser impactadas: o apoio à Ucrânia na guerra contra a Rússia e a proposta de uma integração ainda maior dos países do bloco.

    O apoio aos ucranianos foi, até aqui, quase unânime entre os europeus. A falta de avanços na linha de frente e o alto custo da ajuda militar e econômica a Kiev, no entanto, começam a fragilizar essa posição.

    E os políticos ultranacionalistas não têm a mesma preocupação com os avanços de Vladimir Putin sobre o território ucraniano. Pelo contrário, alguns deles preferem diminuir os custos para os seus eleitores a continuar financiando um esforço de guerra de longo prazo.

    A ascensão da extrema direita também vai aumentar as dificuldades para uma integração maior entre os países do bloco –e tornará ainda mais difícil a entrada de novas nações na união.

    Por definição, esses partidos são defensores de um nacionalismo extremado e muitos defendem que a União Europeia fique muito mais fraca e se limite a ser um bloco comercial, não uma unidade política como é hoje.

    Neste caso, a União Europeia não deve reverter seu curso. Mas deve manter o status quo, evitando qualquer medida de maior integração política entre seus membros.

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