“A Flor do Buriti” foi “revolução” no Festival de Cannes, diz diretora
Longa chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (4) após ter estreado no importante festival de cinema francês
O filme “A Flor do Buriti” chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (4). Idealizado por João Salaviza e Renée Nader Messora, o longa foca no povo indígena Krahô e levou a língua indígena para o Festival de Cannes.
“A grande maravilha é você estar num cinema no centro de poder [do cinema no mundo] e você ter um cinema lotado escutando uma língua indígena do Norte do Brasil, que é falada por 4 mil pessoas”, ressalta Renée à CNN. “O mundo mudou quando o auditório tem que escutar uma língua indígena. É uma pequena revolução.”
No entanto, a diretora reforça: “Uma grande revolução seria que filmes feitos por realizadores indígenas conseguissem conquistar não só o Festival de Cannes, mas o circuito de cinema hoje”.
“A Flor do Buriti” estreou durante o Festival de Cannes, que ocorreu entre 14 e 25 de maio deste ano. O longa foi exibido na Mostra Un Certain Regard (paralela ao festival), onde recebeu o Prêmio de Elenco.
O longa retrata a comunidade indígena da etnia Krahô, que está na terra indígena demarcada Kraolândia. A região fica entre nos municípios de Goiatins e Itacajá, no Tocantins, dentro da Amazônia Legal.
A população Krahô é estimada em 122 pessoas, segundo a Secretaria de Saúde Indígena (Sesai), do Ministério da Saúde. O filme aborda um momento que criou marcas na comunidade até hoje: o massacre de 1940.
Em 1940, segundo o Instituto Socioambiental que reproduz uma notícia de 2003 do Jornal do Tocantins, o massacre foi orquestrado por fazendeiros que tinham interesse na região demarcada. Durante a ação, 26 indígenas foram mortos.
“O massacre ele tá muito presente ainda na memória da comunidade”, explica Renée. “Quando a gente começou a imaginar ‘Flor do Buriti’ e pensar a entender que o que a espinha dorsal do filme Era relação com a terra o massacre passou a ser um pouco o ponto de partida.”
“O filme tem uma narrativa conturbada, que foge da linearidade, exatamente para corresponder uma história conturbada”, diz João Salaviza à CNN.
“Nós todos entendemos que a espinha dorsal era a relação com a terra as violências perpetuadas, por conta dessa dessa dessa vontade de acabar com esse povo que tá ocupando essa terra e a resistência que vai também se reconfigurando e se repensando pela comunidade através dos tempos”, continua Renée. Com o massacre como ponto de partida, o filme então aborda como os acontecimentos marcaram o passado e o presente da comunidade. “A gente filma o buriti como uma testemunha desse passar do tempo, porque o buriti tá ali vendo tudo que aquele povo atravessou.”
“Nesse a gente filmou os Krahô, mas não existe uma terra indígena demarcada no Brasil que não seja uma história de muito sangue”, comenta Renée. “As violências são essencialmente as mesmas”.
Segundo o relatório “Conflitos no Campo do Brasil”, feito pela Comissão Pastoral da Terra, o Brasil registrou 59 massacres por disputa de terras contra os povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos entre 1985 e 2021. Nesse período, 302 pessoas foram mortas.
Já de acordo com o relatório “Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil” da Conselho Indigenista Missionário (Cimi), foram registrados 309 casos de invasões de terras indígenas em 218 áreas demarcadas apenas em 2022. No mesmo ano, ainda segundo o relatório, foram contabilizados 180 assassinatos de indígenas no Brasil.
“A Flor do Buriti” traz, portanto, um retrato que é uma realidade enfrentada pelas comunidades indígenas do país. O filme é íntimo, tanto pela participação dos indígenas Krahô na construção do longa, como pela proximidade dos dois diretores com a comunidade: são 10 anos de relação com os Krahô no caso de João e quase 15 no caso de Renée.
“A nossa relação não é comunidade não é um projeto artístico, a gente participa em muitas coisas e tem um mapa afetivo que se estende muito na comunidade”, diz Renée.
“A gente não faz cinema ativista”, ressalta João. “Tem coisas muito importantes também sendo feitas que precisam reagir ao imediatismo dos tempo. A gente faz o cinema com outro tempo, de poder estar 15 meses a filmar e inevitavelmente construir o filme.”
“Acho que estamos só começando”, finaliza Renée, sobre os registros do povo Krahô. “Temos o primeiro filme, esse e vai ter um terceiro.”
A distribuição de “A Flor do Buriti” é da Embaúba Filmes e, além de ter sido premiado na Un Certain Regard, também recebeu honrarias nos festivais como Cinevision Award em Munique, Prêmio Apima Melhor filme Latino-Americano em Mar del Plata, Festival Internacional de Documentários de Montreal e no Festival Ibero-Americano de Cinema de Huelva.
Assista ao trailer de “A Flor do Buriti”:
https://www.youtube.com/watch?v=t5DA-iuR3hk
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