Jogo do Tigrinho: algoritmo pode ser manipulado para alterar resultados, diz especialista
Professor aponta falta de transparência em relação aos algoritmos utilizados pelas plataformas
Ao longo das últimas semanas, as polícias de diversos estados brasileiros realizaram operações contra o chamado Jogo do Tigrinho – um tipo de cassino online que promete ganhos fáceis para os apostadores, gerando risco de viciar os participantes.
No fim de junho, uma enfermeira de Piracicaba, no interior de São Paulo, foi localizada depois de ter ficado desaparecida por uma semana. A família acredita que ela tenha sumido após contrair dívidas por causa do Jogo do Tigrinho.
Na semana passada, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo informou que, do ano passado até a última quinta-feira (27), cerca de 500 ocorrências relacionadas ao Jogo do Tigrinho haviam sido registradas em delegacias do estado.
O professor André Lima, que atua nos cursos da área de Tecnologia da Informação na Universidade Católica de Brasília, explica que o Jogo do Tigrinho tem semelhanças com os caça-níqueis tradicionais, que funcionam em máquinas.
“Porém, a diferença que ele tem em relação a máquinas mais antigas é que ele é um software, e não uma máquina que tem ali a sua programação pronta. O software te dá um poder de programação muito maior. E essa é uma das questões que vêm aparecendo nas investigações: o que tem nesse algoritmo?”, questiona.
O especialista adverte que é possível manipular os algoritmos para que os resultados sejam alterados. Ou seja, controlar quando os apostadores irão ganhar ou perder.
“Pode ter na programação do software alguns caminhos no algoritmo que levam, sim, a pessoa a perder ou a ter um determinado grau de ganhos e depois isso não acontecer”, explica.
Lima acrescenta, porém, que, para se ter certeza se há ou não manipulação, é necessário que haja uma auditoria externa no algoritmo. E, segundo o professor, falta transparência em relação aos códigos utilizados.
“Podemos garantir que tem ou que não tem [manipulação]? A gente não consegue afirmar assim. Mas há possibilidade, sim. Todo código pode ser atualizado a qualquer momento. Então, podem ter também novidades, como pode ter também algum tipo de alteração.”
O professor acrescenta ainda que, independentemente de haver ou não manipulação, esse tipo de jogo de azar é, matematicamente, mais favorável ao cassino do que ao jogador. “Isso deixa o jogador viciado, porque ele ganha uma vez, ganha outra, e acha que sempre pode ganhar.”
Versões para demonstração
As investigações feitas em diversos estados brasileiros mostram que os desenvolvedores desse tipo de aplicativo criam versões de demonstração dos jogos.
Essas contas demo, como são chamadas, são usadas por influenciadores, que publicam nas redes sociais vídeos nos quais, supostamente, ganham uma grande quantidade de dinheiro em apenas um jogo.
“Essas versões demo podem ser programadas para dar essa falsa sensação de que a pessoa vai ganhar mais naquele tipo de jogo”, diz o professor.
Risco à privacidade do usuário
Além da possibilidade de vícios e de perdas financeiras, o especialista acrescenta que esse tipo de plataforma poder representar um risco à segurança dos dados dos usuários.
Os jogos de cassino são proibidos no Brasil. Por esse motivo, são hospedados em servidores de outros países. Dessa maneira, não estão sujeitos às regulamentações previstas na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
Entre as informações que podem ser coletadas pelas plataformas, alerta o professor, estão os dados bancários do apostador.