Análise: em busca de votos, Biden arrisca abrir guerra comercial com a China
Estados Unidos elevam tarifas de importação de produtos chineses; provável retaliação de Pequim vai aumentar protecionismo econômico
O presidente Joe Biden aprovou, nesta terça-feira (14), um aumento significativo nas tarifas de importação sobre muitos produtos chineses, incluindo semicondutores, carros elétricos, aço e alumínio.
A seis meses da eleição presidencial, o movimento tem, entre outros, o claro objetivo de atrair votos de americanos que não aprovam a política econômica do presidente –apesar dos baixos índices de desemprego e do relativo crescimento econômico.
Mas as medidas podem, no limite, abrir uma guerra comercial entre as duas maiores economias do mundo.
Ao eleger a China como alvo das tarifas às vésperas da eleição, Biden copia parcialmente as ações e retórica agressivas usadas pelo seu rival nas eleições, o ex-presidente Donald Trump – que, na Casa Branca, aplicou enormes aumentos de impostos de importação a praticamente todo produto chinês.
Trump acusava Pequim de destruir empregos nos Estados Unidos e criar uma ameaça à segurança nacional do país.
Agora, Biden também tenta mostrar aos eleitores que é duro com os chineses, mas refinou um pouco a retórica.
A Casa Branca diz que as medidas desta vez foram “cuidadosamente direcionadas”, combinadas com investimentos internos e alinhadas com países aliados.
Os americanos, assim como a União Europeia e outros países ocidentais, há tempos acusam a China de praticar dumping, inundando os mercados globais com exportações subsidiadas e subvalorizadas.
Segundo eles, os chineses continuam no mesmo ritmo de produção e investimentos, apesar de uma grande queda no consumo interno. A consequência é a exportação desses produtos, por baixos preços.
Estima-se que pelo menos US$ 18 bilhões em produtos chineses sejam impactados com as novas tarifas americanas.
Mas essas medidas terão ainda outras consequências maléficas.
Guerra comercial e aumento do protecionismo
A principal delas é o altíssimo risco de uma forte retaliação de Pequim, o que poderia levar à uma intensa disputa comercial entre os dois países, algo que reverberaria em boa parte do mundo.
Os chineses já deram indicações de que muito provavelmente vão agir e anunciar medidas similares contra produtos americanos.
O Ministério das Relações Exteriores, por exemplo, reagiu quase imediatamente e afirmou que o país vai tomar todas as medidas possíveis contra as ações unilaterais da Casa Branca.
As tarifas americanas também poderão atingir as metas ambientais de Biden, que ajudariam a cortar emissões de gases do efeito estufa, combatendo o aquecimento global – e ajudando a evitar tragédias ambientais como as atuais cheias no Rio Grande do Sul, por exemplo.
Isso porque as elevadas tarifas contra carros elétricos produzidos na China vão desencorajar muitos americanos a comprar esse tipo de veículo, que vai ficar muito mais caro.
Os aumentos de preços dos produtos no mercado interno, aliás, serão outra consequência provável das medidas anunciadas pela Casa Branca, já que as tarifas tendem a criar inflação, pelo menos no curto prazo.
Por fim, o mundo pode estar assistindo ao início de uma era de muito maior protecionismo.
É bastante possível que muitos outros governos decidam seguir a linha de Washington e impor ainda mais tarifas contras produtos importados – da China e também de outros países.
Para piorar ainda mais a situação, o sistema global tem muito pouca proteção neste momento para uma nova era de protecionismo exacerbado.
Isso acontece porque a Organização Mundial do Comércio (OMC) está completamente paralisada há anos, especialmente pelo desinteresse dos Estados Unidos em fortalecer um sistema que dá direitos iguais a todos os países, sem poder de veto para os maiores.
E já está claro que os dois rivais na disputa pela Casa Branca não terão o menor interesse em mudar essa situação.
Pelo contrário. Tanto Trump como Biden já parecem ter desistido de uma ordem que privilegia o livre comércio.