Discursos de Zelensky geram reações contrárias em parlamentos pelo mundo
Presidente ucraniano tem feito pronunciamentos a políticos de diversos países pedindo ajuda e punições à Rússia
Volodymyr Zelensky discursou por videoconferência no Parlamento português na quinta-feira (21), quase dois meses após o início da guerra na Ucrânia. Mas nem todos gostaram do convite ao presidente ucraniano, uma posição que não é caso único no mundo.
Espanha: quatro deputados recusaram aplaudir
Na Espanha, nem todos os parlamentares viram com bons olhos o convite feito a Volodymyr Zelensky. No dia 5 de abril, o presidente da Ucrânia discursou no Parlamento espanhol.
Quando se esperava que todos aplaudissem Zelensky, o momento acabou por ser boicotado por quatro deputados: Enrique Santiago, da coligação Unidas Podemos, Mireia Vehí e Albert Botran, da Candidatura de Unidade Popular, e Néstor Rego, do Bloco Nacionalista Galego.
Ao jornal espanhol El Confidencial, estes parlamentares explicaram que participaram do evento apenas por “respeito institucional” e que não aplaudiram o presidente ucraniano por discordarem de algumas das posições tomadas por Zelensky desde o início da guerra, como a ilegalização de partidos opositores e a sua “tolerância para com grupos nazistas” nas tropas ucranianas.
Assim como Enrique Santiago, líder da Esquerda Unida e membro da coligação Unidas Podemos, Álvaro Aguilera, secretário-geral do Partido Comunista de Madrid, se manifestou no mesmo sentido através do Twitter.
“Desculpem, mas não. Isto não. Zelensky é um perigo para a paz e para o seu povo. Herdeiro de um golpe de estado que ilegalizou o Partido Comunista e outros 11 partidos. Deve existir um debate nos órgãos. Não em meu nome”, escreveu.
França: a indecisão de Marine Le Pen
A presença de Marine Le Pen no Parlamento, adversária de Emmanuel Macron nas eleições presidenciais francesas, para assistir ao discurso de Zelensky também chegou a ser negada.
Quando soube que o presidente ucraniano estaria, por videoconferência, no Parlamento francês em 23 de março, a candidata de extrema-direita disse que já tinha “compromissos prévios”. Le Pen – cujo partido tem ligações com a Rússia – disse, inicialmente, que não sentia que fosse necessário demonstrar o seu apoio a Zelensky.
“Não admiro particularmente o senhor Zelensky”, afirmou a candidata presidencial à France Info, justificando que “achava que ele estava apenas se comportando como um chefe de Estado e que não deveria despertar qualquer admiração, mas comportamento normal”.
No entanto, após repercussão polêmica, Le Pen optou por cancelar os “compromissos prévios” e estar presente durante o discurso, mas garantindo que não o fez por pressão mediática.
Itália: extrema-direita contra o discurso
Na Itália, um pequeno grupo de deputados fez críticas à permissão dada a Volodymyr Zelensky para discursar no Parlamento, em 22 de março, argumentando que a aparição do presidente ucraniano em nada ajudaria a restaurar a paz.
Pelo menos 20 parlamentares garantiram que iriam “desprezar” a videoconferência de Zelensky e criticaram a decisão de permitir que discursasse em ambas as Câmaras parlamentares, uma honra que até então só havia sido dada ao rei de Espanha Juan Carlos e ao Papa João Paulo II.
À agência Reuters, Gianluigi Paragone, ex-membro do Movimento 5 Estrelas e fundador do grupo contra a permanência italiana na União Europeia intitulado Italexit, disse que não prestaria atenção às palavras do presidente ucraniano.
“Já ouvimos o sermão de Zelensky e, se fizéssemos o que ele quer, isso nos levaria imediatamente a uma guerra na Europa”, disse.
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Na votação, a larga maioria dos partidos foi a favor do discurso, mas dezenas de deputados não compareceram, incluindo vários da Liga Norte, partido de extrema-direita liderado por Matteo Salvini, que chegou a elogiar Putin no passado.
Pelo menos um político da Liga Norte, Vito Comencini, confirmou à Reuters que não iria estar presente no discurso de Zelensky. Ele se recusou a explicar a opção, mas uma semana antes visitou São Petersburgo e entregado ajuda humanitária à população da região do Donbass, a quem demonstrou apoio.
“São pessoas que vivem numa zona de guerra desde 2014, culpadas por exigirem que as suas demandas sejam reconhecidas”, Comencini publicou nas redes sociais durante a visita.
Israel: boicote da terceira maior força política
Em Israel, foi a Lista Conjunta, coligação política composta por quatro partidos maioritariamente árabes liderados pelo partido Hadash, que boicotou o discurso do presidente Zelensky.
Em 20 de março, momentos antes de o líder ucraniano começar a falar por videoconferência, o partido, a terceira maior força política do país, anunciou que os seus membros não estariam presentes no “Knesset”.
Ofer Cassif, do Hadash, explicou a posição tomada: “Ouvimos na imprensa ocidental, e também aqui, dia e noite de que esta é uma guerra entre os filhos da luz e os filhos das trevas, mas não é. Durante anos, existiram crimes contra as minorias russas na Ucrânia. Na Ucrânia, o regime trabalha de braço dado e sem qualquer vergonha com milícias neonazis como o Batalhão Azov. Não há filhos da luz e filhos das trevas aqui”, acusou.
Japão: as referências a Pearl Harbor que causaram indignação
Quando discursou no congresso dos Estados Unidos, Zelensky utilizou o ataque a Pearl Harbor como comparação à invasão da Ucrânia. Na perspetiva do presidente ucraniano, ambos foram ataques não provocados contra países com quem os agressores não estavam em guerra.
As declarações caíram mal nas alas mais conservadoras da política japonesa. Houve até um conjunto de deputados de direita que afirmaram que Zelensky só deveria discursar no parlamento japonês após ter aulas sobre o que “realmente” antecedeu o ataque a Pearl Harbor.
Porém, em 23 de março, o discurso do presidente da Ucrânia ocorreu sem qualquer dificuldade.
Grécia: testemunho de grego do Batalhão Azov
No discurso feito no Parlamento grego, em 7 de abril, Zelensky exibiu o testemunho de um soldado do Batalhão Azov. No vídeo, o combatente, de nacionalidade grega, apelou à solidariedade da Grécia à Ucrânia durante a invasão russa.
“Dirijo-me a vocês, sou grego de origem. Chamo-me Mikhail, o meu avô combateu os nazistas e agora estou na defesa da Ucrânia através do Batalhão Azov”, disse o paramilitar.
A Frente Militante de Todos os Trabalhadores (PAME), um movimento sindical, a Juventude Comunista da Grécia e outros grupos de esquerda criticaram o ocorrido. Eles afirmaram que a solidariedade grega ao povo ucraniano não deve se tornar um apoio a um “regime fantoche da Otan” liderado por Zelensky e pelos “grupos neonazistas” que apoia.
Em resposta ao discurso, o antigo ministro das Finanças e fundador da Frente da Desobediência Realista Europeia (MeRA25), Yanis Varoufakis, pontuou que a Grécia “não convidou um nazista, convidou o presidente da Ucrânia”.
“Foi o presidente da Ucrânia que trouxe um nazista. E, sim, foi o presidente do nosso Parlamento que, ao não intervir, não defendeu o nosso Parlamento”, finalizou.
Chipre: acontecimentos na Grécia geram contestação
No Chipre, após a intervenção de Mikhail, membro do Batalhão Azov, no Parlamento da Grécia, o Partido Progressista do Povo Trabalhador decidiu faltar ao discurso de Zelensky, que decorreu no mesmo dia, 7 de abril.