À CNN, prefeito diz que pastor pediu R$ 40 mil de propina em evento do MEC
Prefeito de Boa Esperança do Sul (SP), José Manoel de Souza (PP-SP), afirma que recebeu proposta do pastor Arilton Moura em encontro em Brasília no ano passado
Em entrevista à CNN nesta quinta-feira (24), o prefeito de Boa Esperança do Sul (SP), José Manoel de Souza (PP-SP), afirmou que recebeu uma oferta de propina no valor de R$ 40 mil para a liberação de recursos para a construção de uma escola em sua cidade. Ele disse que a oferta ocorreu em um evento do Ministério da Educação (MEC) em Brasília, no ano passado, e que a proposta partiu do pastor Arilton Moura.
De acordo com o prefeito, ele foi convidado para um almoço no restaurante de um hotel após encontro no Ministério da Saúde, e lá foi apresentado aos pastores Arilton Moura e Gilmar Santos, que estavam na reunião da pasta à “vontade com outros prefeitos” no ministério.
“Ele falou: prefeito você sabe como funciona né, são mais de 5.600 municípios, não conseguimos atender a todos, mas eu consigo te atender, consigo uma escola profissionalizante para o seu município”, contou o prefeito sobre a conversa com o pastor.
José Manoel de Souza disse ainda que o Arilton reiterou que conseguiria ajudá-lo, desde que houvesse uma contrapartida.
“Eu consigo fazer um ofício agora, encaminho, coloco no sistema e libero para você uma escola profissionalizante, mas, em contrapartida, você tem que fazer um depósito na conta da igreja evangélica”, disse o pastor, conforme relato do prefeito de Boa Esperança do Sul.
“Me assustei, falei para ele que para mim dessa forma não serve”, disse o prefeito na ocasião.
Questionado pela âncora da CNN Brasil Monalisa Perrone sobre o valor da propina pedida ao prefeito pelo pastor, ele confirmou que foi de R$ 40 mil.
“A palavra é de decepção, você está dentro do Ministério da Educação, onde você acha que as coisas vão acontecer certas, estou decepcionado. Falei a meus companheiros e disse que nesse ministério eu não fico mais. No Ministério da Educação em Brasília eu não coloco mais os meus pés”, disse o prefeito do interior de SP.
O pastor Gilmar Santos, citado pelo prefeito como um dos participantes do evento do MEC em Brasília, divulgou uma nota em sua rede social, nesta quarta-feira (23), declarando que as afirmações veiculadas sobre sua participação em um “gabinete paralelo de pastores” são “inverdades”.
“Nego, peremptoriamente, a falácia de que pedi, recebi, mandei pedir, ou de algum forma, contribuí, para o recebimento de propina, ou qualquer ato de corrupção junto ao Ministério da Educação, bem como ao atual ministro titular da pasta. Também ab-rogo a falácia de que faço parte de um gabinete paralelo de pastores com quaisquer das finalidades elencadas anteriormente”, disse o pastor.
Entenda o caso
Em áudios obtidos pelo jornal “Folha de S.Paulo”, o ministro da Educação, Milton Ribeiro afirma que recebeu um pedido do presidente Jair Bolsonaro (PL) para que a liberação de verbas da pasta seja direcionada para prefeituras específicas a partir da negociação feita por dois pastores evangélicos que não possuem cargos no governo federal.
Na gravação, Ribeiro diz que se trata de “um pedido especial do presidente da República”.
“Foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim sobre a questão do [pastor] Gilmar”, diz o ministro na conversa com prefeitos e outros dois pastores, segundo o jornal.
Ribeiro continua: “Porque a minha prioridade é atender primeiro os municípios que mais precisam e, em segundo, atender a todos os que são amigos do pastor Gilmar.”
Os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura são os citados nos áudios. Segundo o jornal, os dois religiosos têm negociado com prefeituras a liberação de recursos federais para obras em creches, escolas e compra de equipamentos de tecnologia.
Na conversa vazada, o ministro de Bolsonaro indica que, com a liberação de recursos, pode haver uma contrapartida. “O apoio que a gente pede não é segredo, isso pode ser [inaudível] é apoio sobre construção de igrejas”. Nos áudios, não fica claro a forma como esse apoio se daria.
Em nota enviada à CNN, Ribeiro negou ter favorecido pastores na distribuição de verbas da pasta.
“Diferentemente do que foi veiculado, a alocação de recursos federais ocorre seguindo a legislação orçamentária, bem como os critérios técnicos do Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (FNDE). Não há nenhuma possibilidade de o ministro determinar alocação de recursos para favorecer ou desfavorecer qualquer município ou estado”, diz trecho da nota.
Na nota, o ministro diz ainda que o presidente “não pediu atendimento preferencial a ninguém, solicitou apenas que pudesse receber todos que nos procurassem”.
O procurador-geral da República, Augusto Aras, enviou na noite desta quarta-feira (23) ao Supremo Tribunal Federal (STF) um pedido de abertura de inquérito para investigar o caso.
A ministra do STF (Supremo Tribunal Federal), Cármen Lúcia determinou abertura de inquérito contra o ministro da Educação, Milton Ribeiro, após denúncia de suposto favorecimento a pastores no MEC. A decisão atende ao pedido feito pela PGR.
A ministra aceitou o pedido para que sejam ouvidos Ribeiro, os dois pastores suspeitos, Gilmar Santos e Arilton Moura, além de prefeitos que relataram supostos pedidos de propina e irregularidades envolvendo o MEC. O inquérito terá prazo de 30 dias improrrogáveis, segundo a decisão da ministra.
Nesta quinta-feira (24), a Comissão de Educação do Senado aprovou um convite para que o ministro da Educação preste esclarecimentos aos senadores sobre a suspeita de beneficiamento indevido na destinação de verbas públicas do Ministério da Educação (MEC). O ministro será ouvido na quinta-feira (31) da próxima semana.
No ano passado, para poupar as emendas parlamentares de um corte maior, o governo promoveu um bloqueio de R$ 9,2 bilhões de despesas de ministérios e estatais que atinge principalmente a Educação.
A pasta da Educação teve o congelamento de R$ 2,7 bilhões, segundo informações da analista de política da CNN Basília Rodrigues.
O que diz o ministro
À CNN, Milton Ribeiro negou que Bolsonaro tenha pedido para favorecer pastores e diz que não deixará o cargo. Em entrevista exclusiva à analista da CNN Renata Agostini, na noite de ontem (23), o ministro admitiu que o presidente chegou a pedir para que a pasta da Educação recebesse líderes evangélicos, mas garantiu que liberação de verbas segue “critérios técnicos”.