Entenda como as criptomoedas estão sendo usadas na guerra entre Ucrânia e Rússia
Governos e cidadãos veem no ativo digital uma opção de transação e investimento;
Desde que foram criadas, em 2008, esta é a primeira vez que as criptomoedas estão inseridas em um contexto de guerra.
A forma como as moedas digitais operam, fora do domínio do banco global padrão, com transações registradas em um livro público conhecido como blockchain, ajuda a projetá-las neste cenário.
Samir Kerbage, diretor de tecnologia da Hashdex, lembra que as moedas digitais também são uma opção para os cidadãos em contexto de guerra. “As criptomoedas permitem que uma pessoa consiga sair de seu país sem perder seu patrimonio, sem depender da moeda local, por exemplo”.
Além disso, a economia dos países em conflito sofre fortes impactos por conta do fechamento de bancos, bolsas e desvalorização da moeda local. Logo, “as criptomoedas conseguem fazer com que algum patrimônio seja preservado da inflação nos países”.
Kerbage avalia que essa é a primeira vez na história que esse tipo de movimentação pode acontecer em larga escala. “As pessoas possuem hoje uma reserva que é soberana e pode ser utilizada em qualquer lugar do mundo sem interferências estatais”.
Desde o início da guerra na Ucrânia, o país do Leste Europeu já recebeu mais de US$ 54,7 milhões em criptomoedas (R$ 275 milhões), segundo levantamento divulgado pela empresa britânica Elliptic, maior especialista em análise de moedas digitais do mundo.
Do outro lado, a Rússia vem utilizando os criptoativos para realizar transações como uma forma de driblar as sanções impostas pelos países Ocidentais ao seu sistema econômico. O resultado foi uma valorização do Bitcoin, a criptomoeda mais famosa mundialmente, que chegou a ser negociada acima de U$ 44 mil (R$ 221 mil) na terça-feira (1º), quando atingiu a maior alta em um ano.
Por que as criptomoedas se tornaram atrativas?
Alternativa para a Rússia
A Rússia enxerga nas criptomoedas uma alternativa para realizar transações financeiras, sem a necessidade de integração com sistemas globais e o uso de moedas como o dólar, por exemplo. Por meio das moedas digitas, o país consegue efetuar a compra e venda de produtos.
No entanto, Kerbage lembra que ainda é possível limitar a abrangência do uso das criptomoedas. “Os Estados Unidos podem, por exemplo, emitir um decreto proibindo as exchanges [corretoras] norte-americanas de inserir cidadãos russos. Dessa forma, as empresas serão obrigadas a cumprir e os russos estarão fora do maior mercado de criptoativos”, afirmou.
Mesmo com as sanções cada vez mais robustas e investigações realizadas pela União Europeia (UE) sobre o uso das criptomoedas para driblar as restrições, as maiores bolsas de criptomoedas do mundo, Coinbase e Binance, rejeitaram na sexta-feira (4) pedidos para uma proibição geral de todos os usuários russos.
A escolha vai contra as demais instituições do setor financeiro tradicional que optaram por suspender as operações no país, como foi o caso da Visa e da MasterCard.
Para o especialista da Valor Investimentos, Piter Carvalho, uma moeda digital seria uma opção para o governo russo realizar transações. Entretanto, o economista alerta para a alta volatilidade que o país teria de enfrentar se resolvesse adotar uma criptomoeda, justamente por ser um fator inerente ao ativo digital ainda emergente.
Outro ponto que os economistas ressaltam é o volume de transações que poderiam ser realizadas através de criptomoedas pelo governo russo é limitada. Os especialistas não enxergam uma “dimensão suficiente em criptoativos” para que o país consiga driblar as sanções em escalas significativas.
Na avaliação dos especialistas, as criptomoedas são uma ferramenta para a Rússia em um momento de crise e isolamento comercial, mas não acreditam que o país deva adotar, de maneira oficial, o uso da moeda.
Oportunidade para a Ucrânia
Para os ucranianos, os ativos digitais têm sido usados para receber doações para investimentos em equipamentos militares, ajuda humanitária, comida e kits médicos.
Justamente por estar atrelado ao ambiente digital, as criptomoedas permitem uma maior facilidade de transferência e uso, em um país cuja estrutura bancária e financeira está paralisada e inviabilizada pelo conflito.
O economista Nicolas Farto menciona que, para o governo ucraniano, as criptomoedas trazem a vantagem de sigilo, já que têm grande dificuldade de rastreabilidade.
“As doações recebidas pela Ucrânia através dos criptoativos é também uma forma de trazer um maior sigilo para as operações que chegam ao governo do país. Aparentemente, o presidente Zelensky entendeu isso e adotou esse canal de doação, conseguindo bons resultados. Nesses contextos, as moedas digitais demonstram um aspecto interessante”.
Farto lembra também que além de receber doações, o governo a Ucrânia tem feito doação para a população através de programas para auxiliar as vítimas do conflito.
É um momento para investir em criptomoedas?
Observando a valorização dos criptoativos, os especialistas avaliam que o momento ainda não é propício para realizar a compra de moedas, mas que é importante, pensando na diversificação da carteira, o investidor optar pela compra, mas com prudência.
“É interessante que qualquer investidor considere ter algum grau de disposição no universo de criptos. Trata-se de um universo que vem crescendo e mostrando importante e útil nestes momentos de crise”, avalia o economista Nicolas Farto.
Para os especialistas, no curto prazo, a guerra na Ucrânia pode reforçar a credibilidade do bitcoin, a criptomoeda mais famosa. Dessa forma, esse ativo pode ser visto como uma solução para amenizar situações de guerra e crise, como uma alternativa de segurança, principalmente, para o cidadão.