Entenda o que é uma oligarquia e como ela surgiu na Rússia
“Elite de poder” nasceu na União Soviética e evoluiu até chegar aos “amigos de Putin”, que talvez nem sejam assim tão amigos
Oligarcas e ditadores se entendem. A “elite do poder” nasceu na União Soviética e evoluiu até chegar aos “amigos de Putin”, que talvez nem sejam assim tão amigos
Platão e Aristóteles, na Grécia antiga, definiram o que entendiam por oligarquia. Para o primeiro, tratava-se de um regime que tem como base a qualificação da propriedade, isto é, o “rico detém o poder” que está vedado aos pobres.
Aristóteles não divergiu muito desta ideia. O filósofo acreditava que se trata de um sistema cujo poder tem como base a riqueza. Mas ele ia além dizendo que os detentores do poder devem ser poucos “em número” para que consigam manter o controle do Estado.
Tratando-se de um grupo, ele pressupõe a existência de uma coligação, ou mais, para defender os seus próprios interesses e fazer avançar as suas propostas.
A oligarquia russa mergulha as suas raízes na época soviética, quando, após a morte de Stalin, surge uma liderança coletiva, estruturada numa hierarquia rígida ao redor dos órgãos dirigentes do Partido Comunista da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).
Cada setor chave da economia, então dominada pela política, foi organizado como uma estrutura de pressão cujos conflitos eram solucionados, em última análise, pelo Politburo, a mais alta autoridade no partido e no país.
No entanto, para conseguir uma posição favorável do Politburo era necessário pertencer à “nomenklatura” – a casta dirigente da União Soviética. Temos, assim, um pequeno grupo a tomar as decisões para toda a sociedade e o país.
Este sistema, pesadamente burocrático, vai cansando e exaurindo a sociedade, situação que perto do final do Século XX é óbvia para Mikhail Gorbachev e para os políticos da sua geração.
Então, quando sobe ao poder, o político russo procura avançar com reformas que libertassem a sociedade e a tornassem competitiva. Gorbachev desejava ainda que essa competição também se faça a nível político, mas o resultado não seria o que o líder soviético desejava.
Ao minar a autoridade legítima do partido, o estadista lesou a sua capacidade para gerir os conflitos entre as formações rivais da elite.
Mas não foi Gorbachev quem anulou a oligarquia soviética. Esse golpe de misericórdia foi dado por Boris Yeltsin, ao dissolver o Partido Comunista da URSS após o golpe de agosto de 1991.
Ao fazê-lo, eliminou o âmago da estrutura oligárquica e reordenou a hierarquia econômica, retirando importância e peso ao setor militar-industrial.
Yeltsin decidiu transformar a economia socialista russa em economia de mercado e assim o fez com programas de privatização e liberalização da economia, numa autêntica terapia de choque.
O seu opositor Alexander Rutskoi insuflou uma insurreição contra a forma como Yeltsin estava conduzindo o processo de reformas, até mesmo o chamando de “genocídio econômico”.
É com as reformas de Yeltsin que surge a nova oligarquia. Agora já não é o partido, nem o Politburo, quem irá deter o poder, mas sim um grupo restrito de pessoas que vão aproveitar da situação para se apoderar de grande parcela da riqueza nacional.
Essas pessoas constituem a nova oligarquia russa. Tornam-se milionárias através de situações pouco claras. Aliás, a época de Yeltsin é marcada por uma corrupção generalizada, inflação, colapso econômico e profundos problemas sociopolíticos.
Vladimir Putin, que sucede a Yeltsin, ao ser inquirido sobre como lidaria com os oligarcas russos, respondeu que não existiam oligarcas na Rússia.
O ex-homem forte da KGB sabia que não estava falando a verdade, porque os oligarcas existiam e existem.
O que Putin pretendia era passar a mensagem de que era ele quem detinha o poder – e quem quer que ofuscasse seu brilho ou fizesse oposição teria a sorte de Mikhail Khodorkovski.
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Oligarca do tempo de Yeltsin, Khodorkovski tirou vantagem das reformas de Yeltsin e tornou-se um dos mais poderosos dos oligarcas russos – uma situação desagradável para Putin, que procurava frear a sede por poder do novo grupo.
Proprietário da empresa petrolífera Yukos e das suas subsidárias, Khodorkovski tornou-se uma pedra no sapato de Putin, que não aceitou a ideia de poder ser desafiado por ele nas urnas, como muitos afirmavam.
Em 2003, o jovem oligarca foi confrontado com a cobrança pela Justiça de todos os impostos atrasados e sonegados da Yukos, que foi nacionalizada por Putin.
Ao mesmo tempo em que Khodorkovski é julgado e condenado a nove anos de prisão por roubo, fraude e sonegação fiscal, a mensagem estava dada. E os oligarcas entenderam.
Putin tinha vencido o grupo dos milionários, muitos dos quais surgem no seu círculo de amigos.
São esses que agora estão sob pressão das sanções do Ocidente.
Foi isso que prometeu o presidente dos Estados Unidos na semana passada: “Aos oligarcas russos e líderes corruptos que ganharam bilhões de dólares com este regime violento: basta! […] Em conjunto com os aliados europeus, vamos encontrar e apreender seus iates, apartamentos de luxo e jatos privados. Vamos atrás das suas fortunas de origem duvidosa.”
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