Duração da guerra definirá integração de refugiados da Ucrânia na Europa, dizem especialistas
Segundo especialistas ouvidos pela CNN, o motivo da indefinição é apenas um: a duração do conflito
A Organização das Nações Unidas (ONU) estimou que a guerra na Ucrânia pode levar até cinco milhões de pessoas a deixarem de suas casas em direção as fronteiras com Polônia, Romênia e Eslováquia. O Alto-comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) classificou o cenário como a maior crise de refugiados do século.
Esse total representa cerca pouco mais de 10% da população ucraniana e quase duas vezes a da capital, Kiev. Para o professor de Direito do Ibmec e integrante da Comissão de Direito Internacional da seccional fluminense da Ordem de Advogados do Brasil (OAB-RJ), Lier Pires, o tempo para o desfecho dos conflitos é crucial para que seja feita uma reformulação nos protocolos de acolhimento aos fugitivos da guerra.
“Ainda não há nenhum plano ou política para esses refugiados. Se tiver um cessar-fogo, eles obviamente irão voltar para seu país. Mas quanto mais extenso e mais bárbaro vai se tornando o conflito, mais suporte a União Europeia e até a Otan terão que prestar, tem um custo do refugiado”, afirmou Pires.
No primeiro semestre de 2021, o número de pessoas sob o mandato de proteção do Alto-comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) ultrapassou 20,8 milhões. O maior contingente, cerca de 6,7 milhões, é de sírios. Se a estimativa se concretizar, os ucranianos passariam a ocupar a segunda posição, à frente dos venezuelanos (4,1 milhões).
Além do aumento dos números, o tempo de permanência dos refugiados nos países europeus de destino pode desencadear reações negativas, como violações aos direitos humanos. Principalmente, xenofobia, segundo o especialista em refugiados, o advogado internacional Manuel Nabais da Furriela.
“Nesse momento temos um atendimento emergencial, de suporte com comida e abrigo. Com o prolongamento da crise, vai diminuindo a possibilidade de retorno dessas pessoas para a Ucrânia. O volume e a longa permanência desses refugiados na Europa podem trazer à tona questões como perseguição e xenofobia. Na Polônia, por exemplo, já havia um grande fluxo de imigrantes ucranianos. Agora, eles chegam em caráter humanitário. A Europa em si já tem um histórico de aversão aos refugiados, foi até uma das razões para a saída da Grã-Bretanha da União Europeia”, explicou o especialista.
Contudo, Furriela admite que a reação à permanência dos ucranianos em países europeus seria tratada de maneira diferente. “Tem os sírios, um grupo grande e culturalmente diverso. A diferença com os ucranianos é a proximidade, há uma comoção maior”, avalia.
Se a semelhança cultural pode aproximar os povos, o fato de o perfil de refugiados ser atípico cria novas necessidades. Com a impossibilidade de homens ucranianos de 18 a 60 anos de deixar o país, por causa da lei marcial, quem atravessa as fronteiras são, predominantemente, mulheres e crianças.
“Nesse grupo temos uma necessidade de acolhimento diferenciado, são pessoas mais vulneráveis, com idosos entre eles. E temos outro elemento grave, que é a precarização do atendimento aos refugiados de etnias africana e indiana, que tem sofrido racismo”, ressaltou Pires.
Embora as atenções estejam voltadas para as milhares de pessoas que cruzam as fronteiras todos os dias, os ucranianos que optaram por não sair do país também preocupam: são sete milhões de deslocados, de acordo com a ONU.
São pessoas que saem das áreas ocupadas por tropas ou em zonas de conflito. Conforme o combustível, o dinheiro, a comida e os suprimentos médicos vão se esgotando, mais difícil fica a permanência e a existência dessas pessoas na Ucrânia.
“Um ponto que acredito ser importante é que a ONU ainda não formou um corredor humanitário com a Cruz Vermelha na Ucrânia. Ainda não começaram a apoiar esses países que estão recebendo esses refugiados por conta própria”, concluiu Furiella.