Análise: crítica do Brasil à Venezuela é tardia e insuficiente
Governo brasileiro terá que pressionar mais a ditadura de Nicolás Maduro para tentar garantir eleições livres e justas
A nota emitida pelo Itamaraty demonstrando preocupação com os sucessivos problemas no processo eleitoral da Venezuela foi acertada, mas também tardia e insuficiente para pressionar o ditador Nicolás Maduro a garantir eleições livres e justas.
O texto do Ministério das Relações Exteriores diz, correta e equilibradamente, que a candidata Corina Yoris, do grupo de oposição Plataforma Unitária, “foi impedida de registrar-se, o que não é compatível com os acordos de Barbados” – que garantiriam mais liberdade política e a realização das eleições presidenciais.
A nota é acertada porque marca uma inflexão do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que pela primeira vez expressou críticas à autocracia do país vizinho.
A ausência dessas críticas e eventual namoro diplomático com ditaduras são o ponto de maior vulnerabilidade da política externa brasileira.
Ao se mostrar próximo demais das autocracias de Cuba, Venezuela, Nicarágua e Rússia, por exemplo, o Brasil abre o flanco para acertadas críticas internacionais e perde espaço em sua tentativa de ser um ator de mais peso no tabuleiro da diplomacia global.
Por isso, a primeira crítica a Caracas, ainda que tímida, é um passo na direção certa.
Mas a inflexão também é tardia, porque o governo de Maduro já vinha dando sinais há muito tempo de que não tem a menor intenção de permitir eleições livres e justas.
Pelo simples e evidente motivo de que o atual presidente perderia qualquer disputa verdadeiramente democrática.
Como o Brasil sabe muito bem o que se desenrola na política do território venezuelano, poderia ter se manifestado muito antes.
Por fim, a posição brasileira também não será suficiente para fazer Maduro sequer pensar em mudar de posição.
Pelo contrário. A nota do Itamaraty já foi recebida com uma saraivada de críticas vindas de Caracas – que não surpreenderam em nada os diplomatas brasileiros.
Um experiente embaixador do Itamaraty disse à CNN que a reação de Maduro era mais do que esperada.
Mas acrescentou: “A nota era necessária, ao final do prazo do registro de candidaturas e pelas dificuldades da principal plataforma de oposição em fazer seu registro. Além da absoluta falta de explicação oficial para essas dificuldades.”
O problema é que a falta de transparência vai certamente continuar. E as autoridades eleitorais, controladas por Maduro, também farão de tudo para continuar complicando a vida da oposição.
Por isso, manifestações muito mais duras serão necessárias por parte do governo brasileiro.
Muito em breve, o próprio presidente Lula vai ter que criticar abertamente o ditador Maduro se quiser continuar mantendo sua influência e respeitabilidade na região.