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    Comissão de Ética vê conflito de interesse e barra indicação de presidente do Cade para conselho de SAF do Vasco

    Lei que estrutura sistema brasileiro de defesa da concorrência proíbe que presidente e conselheiros do Cade participem da sociedade civil, comercial ou empresas de qualquer espécie como controladores

    Teo CuryDaniel Rittnerda CNN , Brasília

    A Comissão de Ética Pública da Presidência da República concluiu que há conflito de interesse em o presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Alexandre Cordeiro Macedo, assumir uma cadeira do Conselho de Administração da SAF do Vasco.

    A decisão frustra os planos de Cordeiro assumir o posto.

    O órgão presidido por Alexandre Cordeiro é responsável por zelar pela livre concorrência no mercado e decidir sobre fusões e aquisições, inclusive aquelas envolvendo clubes de futebol.

    A decisão foi tomada por seis votos a um. Os integrantes da Comissão de Ética Pública levaram em conta a lei que dispõe sobre conflitos de interesse da administração pública federal.

    O artigo que embasa a decisão da comissão é o que diz que configura conflito de interesses “exercer, direta ou indiretamente, atividade que em razão da sua natureza seja incompatível com as atribuições do cargo ou emprego, considerando-se como tal, inclusive, a atividade desenvolvida em áreas ou matérias correlatas”.

    A lei que estrutura o sistema brasileiro de defesa da concorrência proíbe que o presidente e os conselheiros do Cade participem de sociedade civil, comercial ou empresas de qualquer espécie na forma de controladores, diretores, administradores, gerentes, prepostos ou mandatários. Este dispositivo também foi levado em consideração pelo colegiado.

    Alexandre Cordeiro foi indicado para a cadeira pelo presidente e ex-jogador do Vasco Pedrinho. A Sociedade Anônima de Futebol do Vasco é formada por sete membros: cinco da empresa 777 Partners, proprietária majoritária do clube, e outros dois do time. O Conselho Deliberativo do Vasco vai se reunir na quinta-feira (21) à noite para ratificar a indicação.

    Em nota, o Cade informou que Alexandre Cordeiro foi convidado para assumir a cadeira de conselheiro e, imediatamente, antes de assumir qualquer compromisso, consultou a Comissão de Ética da Presidência da República, vinculando a aceitação do convite à autorização do órgão.

    “Com a interpretação da Comissão de que há impedimento, o presidente do Cade agradeceu ao presidente do Vasco e declinou do convite”, informou o Cade, por meio de nota.

    A possibilidade de Cordeiro assumir a cadeira no conselho da Sociedade Anônima de Futebol do Vasco causou desconforto na Presidência e no governo. A avaliação de auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é a de que há conflito de interesse no caso e que um eventual aval da Comissão de Ética abriria um precedente perigoso.

    Cordeiro é apadrinhado político do senador Ciro Nogueira (PP-PI), ex-ministro-chefe da Casa Civil de Jair Bolsonaro (PL). Um relatório produzido pela Polícia Federal em abril de 2022 revelou que Ciro Nogueira se referiu a Cordeiro como “meu menino” em uma conversa gravada por Joesley Batista.

    “Um cara de bom senso. Meu menino, ele era meu chefe de gabinete, eu botei ele lá [no Cade]”, disse o senador ao empresário.

    A Comissão de Ética Pública se reuniu nesta quarta-feira. A pauta da reunião indica apenas o número do processo que será analisado e iniciais do servidor que apresentou o pedido que será analisado pelo colegiado. O item 13 da pauta mostrava as iniciais “ACM”, as mesmas de Alexandre Cordeiro Macedo.

    O Cade destaca em seu site que a lei das SAFs permitiu aos clubes a constituição de um novo regime jurídico, a partir de sua transformação em uma sociedade empresarial com CNPJ próprio.

    “Ao se tornarem empresas (no modelo das SAFs), os clubes de futebol passam a apresentar dinâmicas societárias semelhantes a outros negócios empresariais. Nesse sentido, as operações envolvendo essas empresas tornam-se passíveis de configurar atos de concentração e também devem-se sujeitar a regulações tipicamente empresariais, tal como o controle de estruturas realizado pelo Cade”, diz o órgão.

    Em agosto de 2022, o Cade promoveu um debate sobre a lei das SAFs no direito concorrencial, com relação às fusões e aquisições de clubes de futebol. O evento contou com a participação de Alexandre Cordeiro e de representantes do Vasco.

    “Neste sentido, a transformação de clubes de futebol em empresas despertou uma nova discussão sobre a obrigação formal de notificar o órgão antitruste, a partir da criação de uma SAF e a consequente aquisição por um grupo econômico”, dizia nota do Cade após o evento.

    Cordeiro fez parte da mesa de abertura do evento. O presidente do Cade ressaltou, de acordo com o órgão, que a intenção do evento era antecipar respostas para possíveis problemas, dar transparência sem burocratizar e viabilizar a segurança jurídica para este mercado que está no início.

    Os painéis principais do debate foram compostos por representantes do Cade, de especialistas em direito comercial, concorrencial e esportivo, além de advogados e representantes do Botafogo e do Vasco da Gama, que almeja ter Cordeiro entre os conselheiros de sua SAF.

    Em outubro de 2022, a Superintendência-Geral do Cade arquivou procedimentos referentes a investigações sobre as aquisições das SAF do Botafogo e do Cruzeiro. Em outubro do ano passado, aprovou a aquisição de controle da Atlético Mineiro SAF por uma holding de investimentos controlada pela Conedi Participações.

    Mais recentemente, em um artigo publicado no portal JOTA no final de janeiro, Cordeiro defendeu que o Cade seja notificado sobre aquisições de SAFs. Na avaliação do presidente do Cade, a partir da criação do instituto jurídico da SAF e dependendo das circunstâncias fáticas de cada ato de concentração, o órgão deverá ser notificado.

    Caberia então ao Cade, de acordo com Cordeiro, avaliar “se a operação ensejará em preocupações concorrenciais capazes de propiciar a eliminação da concorrência, a criação ou reforço de posição dominante e/ou na dominação do mercado relevante”.

    “Desse modo, é de se esperar que o Cade venha a analisar futuramente operações envolvendo a comercialização de participações acionárias de SAF. Este é o tema do momento no mundo esportivo que tangencia o direito concorrencial e que com certeza tem muito que evoluir e amadurecer”, escreveu Cordeiro, em parceria com advogado especialista em direito empresarial.

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