Violência entre Hamas e Israel já é um conflito global e solução política ainda está longe de ser alcançada
Pelo menos 112 palestinos foram mortos e mais de 750 feridos na última quinta-feira, dia 28 de fevereiro, depois que tropas israelenses abriram fogo contra centenas de pessoas que esperavam por ajuda alimentar na faixa de Gaza. O governo israelense alegou que as vítimas teriam sido pisoteadas em meio ao caos da distribuição de comida, já que seus soldados teriam atirado apenas para cima. Por sua vez, grupos palestinos, a Noruega e a França acusam soldados de Tel Aviv de terem disparado diretamente contra os civis.
A recente tragédia se soma a uma situação humanitária crítica na Faixa de Gaza: organizações internacionais apontam que todos os palestinos na região estão em risco alimentar, crianças estariam morrendo por falta de medicamentos e não há, atualmente, nenhum hospital na região funcionando integralmente. Caso a guerra continue, as Nações Unidas acreditam que, em junho, o número total de vítimas civis entre palestinos pode chegar a 100.000 pessoas. A situação pode piorar ainda mais caso Israel realize uma incursão terrestre contra Rafah nas próximas semanas. A cidade palestina abriga hoje mais de 1 milhão de deslocados internos – contrastando com os 170 mil há seis meses atrás – e já possui infraestrutura insuficiente para lidar com tantas pessoas.
A morte de palestinos na distribuição de alimentos, além disso, reforça que o conflito entre o Hamas e Israel, energizado desde os ataques do grupo islâmico a civis israelenses em 7 de outubro de 2023, ainda está longe de uma possível solução. Os Estados Unidos, aliados de primeira hora de Tel Aviv, declararam que passarão a distribuir mantimentos em Gaza por lançamento aéreo.
Enviar suprimentos humanitários por aviões é sempre a última opção em um conflito: é sete vezes mais caro que por via terrestre, além de bastante limitado em quantidade disponível. A distribuição de mantimentos por essa via também é extremamente limitada: especialistas indicam que seriam necessárias 500 entregas diárias para que a quantidade fosse suficiente, enquanto os EUA indicam que farão menos de 50.
A estratégia também explicita um elemento importante: Washington e Tel Aviv não estariam mais de acordo sobre quais ações poderiam ser realizadas contra o Hamas, o que obrigaria o presidente Joe Biden a usar estratégias que não dependem de autorização do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. Biden, além de tudo, estaria pressionado em fazer mais pela Palestina em meio a críticas do seu próprio Partido Democrata. Há uma preocupação crescente de que, na corrida pela reeleição presidencial de outubro, o presidente possa sofrer uma perda significativa de apoio entre os eleitores mais jovens. Esta faixa etária, historicamente mais inclinada a apoiar a causa palestina, pode se mostrar decisiva no resultado das urnas.
Uma das razões pela qual uma solução política para a recente escalada de violência parece distante está no fato de que o confronto não se limita mais apenas aos palestinos e israelenses. De fato, ele se expandiu, tornando-se um conflito com transbordamentos globais. Uma delegação palestina passou a última semana na Rússia, debatendo a formação de uma possível aliança. Ao sul, no Iêmen, rebeldes houthis, apoiados pelo Irã, atacam há mais de 3 meses embarcações ocidentais e israelenses que passam pelo Mar Vermelho, bloqueando o comércio marítimo na região e alegando que as agressões são em solidariedade aos palestinos. No norte, o cenário se intensifica com o grupo libanês Hezbollah declarando que um confronto com Israel se aproxima rapidamente, especialmente diante dos bombardeios realizados por Tel Aviv contra o Líbano. Especialistas estão cada vez mais convencidos de que um embate direto entre o Hezbollah e Israel não só é inevitável, mas também provável de ocorrer em menos de seis meses.
Ao mesmo tempo, a China vem reforçando que quer fazer parte de debates sobre um cessar-fogo na região, enquanto que, na América Latina, países como Colômbia e Bolívia vem reduzindo as relações diplomáticas com Israel. No Brasil, a questão extrapolou para a esfera política interna. As declarações do presidente Lula, estabelecendo um paralelo entre o Holocausto e os ataques em Gaza, geraram intensas críticas por parte da oposição. Essa situação acirrada culminou até mesmo em uma tentativa de iniciar um processo de impeachment contra ele. Durante uma manifestação na Avenida Paulista, em apoio a Jair Bolsonaro, foram observadas bandeiras de Israel, indicando a complexidade da situação política no Brasil. Paralelamente, o Itamaraty demonstra uma postura de continuidade no apoio aos processos liderados pela África do Sul, acusando Tel Aviv de cometer genocídio. Esta dualidade de ações e reações reflete a diversidade de opiniões e alianças políticas no cenário brasileiro atual.
A expansão do conflito entre Israel e Palestina para uma escala global é crucial para compreender a persistência da violência, à medida que introduz variáveis adicionais no esforço de encontrar soluções de longo prazo. Neste contexto, uma ampla gama de interesses entra em jogo, abrangendo negociações que envolvem nações tão diversas quanto o Catar, França, Líbano e Estados Unidos. Este panorama internacional complexo destaca a interconexão das questões regionais com a política global. À medida que o conflito Israel-Palestina se imbrica na polarização característica da nossa era, torna-se progressivamente mais desafiador encontrar um ponto de equilíbrio que satisfaça todas as partes envolvidas. Em conclusão, a globalização do conflito reflete a complexidade das relações internacionais contemporâneas e a dificuldade de se alcançar um consenso em questões profundamente enraizadas e polarizadas. Este cenário desafia continuamente a diplomacia e a compreensão global.
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